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Ignorar a Palestina é aniquilar o direito internacional

Entrevista com Mohammad Makram Balawi, comandante de uma rede parlamentar global por Jerusalém

Os  planos de anexação da Cisjordânia receberam amplo repúdio internacional    e uma condenação abrangente da parte de lideranças    da América Latina.

Entre as vozes que se mobilizaram estão políticos de diversos países do continente que realizaram em julho a primeira reunião latino-americana da Associação de Parlamentares Por Jerusalém, traçando estratégias e ações comuns contra os planos israelenses e a ocupação da    Palestina.

Para conhecer melhor dessas iniciativas, o Monitor do Oriente Médio conversou com o diretor-geral da Associação Parlamentar por Jerusalém, rede que se espalha por diversos países do mundo, Mohammad Makram Balawi.

O    acadêmico palestino que participou da reunião latino-americana é doutor em estudos pós-coloniais na Malásia e residiu em diversos países asiáticos antes de estabelecer-se em Istambul, Turquia, como pesquisador, autor e contador de histórias.

Nesta entrevista, ele fala especialmente sobre o papel que a América Latina pode ter na solidariedade à Palestina    e alerta para o risco de se ignorar a ocupação por Israel : o que está em jogo, diz ele, não é apenas o povo palestino, mas o direito internacional e a paz global.

O que a rede que o sr. coordena pode fazer pelos direitos do povo palestino?

Associação de Parlamentares por Jerusalém trabalha para reunir e coordenar esforços em apoio à causa palestina a fim de melhorar e divulgar a conscientização sobre a questão e enfrentar sucessivas tentativas de distorcer os fatos por grupos da mídia tradicional e entidades políticas que apoiam a ocupação sionista.

Desejamos e nos esforçamos para    que o povo palestino obtenha seus direitos e conquiste um estado independente com Jerusalém como sua capital. Não impomos qualquer opinião ao povo palestino. A associação priorizar a liberdade do povo    decidir seu próprio destino. Contudo, devemos ajudá-lo. Para nós, como instituição parlamentar   preocupada com Jerusalém e a Palestina, é preciso que os representantes do povo apresentem legislações para tanto. Recomendamos aos parlamentos os vários países que legislem contra a ocupação e suas práticas contrárias à lei internacional e aos direitos humanos.

Como está essa articulação na América Latina?

Trabalhamos para esclarecer parlamentares sobre os riscos da anexação ilegal de territórios palestinos e orientá-los para conduzir esforços de paz em âmbito global. Os parlamentos podem aprovar boicote econômico a produtos oriundos dos assentamentos ilegais, por exemplo.    O objetivo é converter a solidariedade à causa palestina em ação legal, para pressionar a implementação de decisões internacionais cada vez mais contundentes.

Tivemos uma reunião regional com    mais de 30 parlamentares de todo o continente, a fim de debater formas de apoiar a causa palestina e coordenar esforços para enfrentar o “acordo do século” e os planos de anexação.

Após o encontro, a organização emitiu um memorando interno em   repúdio a qualquer tentativa de expropriar terras da Cisjordânia e faz um apelo à comunidade internacional para que reaja a quaisquer medidas do tipo, por meio de políticas rigorosas que responsabilizem devidamente a ocupação israelense.

O próximo passo é coletar assinaturas de parlamentares de todo o mundo, além de instar os poderes legislativos internacionais a desenvolver projetos que criminalizem a ocupação e reivindiquem seu fim, conforme resoluções das Nações Unidas.

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No início de julho, mais de 320 figuras de destaque de toda a América Latina divulgaram uma carta pedindo que seja responsabilizado por sua política de apartheid e pelo plano de anexação ilegal da Cisjordânia e Vale do Jordão.    Assinaram artistas e acadêmicos latino-americanos, como o ativista argentino e vencedor do Nobel da Paz Adolfo Pérez Esquivel, além dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff (Brasil), Pepe Mujica (Uruguai), Fernando Lugo (Paraguai), Rafael Correa (Equador) e Ernesto Samper (Colômbia). Como o sr. viu a adesão dessas lideranças?

Reflete uma posição moral e compromisso com o direito internacional. A Associação de Parlamentar por Jerusalém e o povo palestino de modo geral valorizam a postura destes políticos e esperam que os detentores de poder hoje caminhem da mesma forma.

Acredito que líderes ilustres, como os ex-presidentes brasileiros Lula e Dilma, estão na vanguarda política do mundo, ao reconhecer a seriedade do direito e das instituições internacionais e ao distinguir o agressor da vítima.

Também recentemente, 66 membros da Câmara dos Deputados do Chile, de diversos partidos políticos, emitiram uma carta ao Ministro das Relações Exteriores Teodoro Ribera Neumann. No documento, expressaram sua preocupação sobre a decisão das autoridades israelenses de anexar territórios palestinos, no âmbito da implementação do chamado “acordo do século”, anunciado em janeiro pelo Presidente dos Estados Unidos Donald Trump.

Além disso, ao menos 69 deputados do México, incluindo o Presidente do Parlamento, declararam repúdio ao plano de anexação, ao denunciar que a “intenção declarada de Israel de anexar grandes partes dos territórios palestinos representa um recuo claro ao processo de paz e ameaça os fundamentos da solução de dois estados, reconhecida internacionalmente, bem como violação flagrante da lei internacional, dos direitos humanos e de resolução da ONU.

Esse movimento  na América Latina pode influenciar mudanças no Oriente Mèdio?

 Recomendamos tais iniciativas e somos gratos por elas.   Conclamamos todos os parlamentos dos países da América Latina e do mundo a dar este mesmo passo. De fato, se a América Latina não  estiver na vanguarda, quem estará? Vemos os países latino-americanos e seus parlamentos como líderes de um movimento soberano distinto e importante    Há ação semelhante em outros lugares, como na Malásia e Maldivas. É importante que tudo isso leve à coordenação entre os povos livres do mundo, para compor uma frente unida contra a anexação, a ocupação e os assentamentos ilegais.

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E qual o envolvimento dos parlamentares palestinos?

Neste momento, representantes do Conselho Legislativo da Palestina, incluído o presidente da Câmara, Aziz Dweik, estão presos por Israel. Eles são representantes do povo palestino, eleitos democraticamente. Atacá-los é atacar o próprio    povo palestino.

Infelizmente, além de prender parlamentes, Israel    busca atacar líderes intelectuais, acadêmicos, escritores e figuras de destaque na sociedade palestina. Portanto, hoje, caso observemos a sociedade palestina como um todo, descobriremos que há uma grande parcela ingressa nas prisões [de Israel], em diferentes estágios da vida. Israel, para ser tratado como estado e não como criminoso, deve compreender que os deputados são símbolos políticos que não devem ser criminalizados desta maneira.

Nos apelamos ao parlamentares da América Latina para que promovam uma campanha abrangente em apoio aos colegas palestinos.

Qual o interesse nessas prisões?

Israel aprisiona repetidamente nossos parlamentares e isso mostra que não está preocupado em partilhar a terra, tampouco a paz! Ao contrário, preocupa-se com a dominação e a negação da existência do outro, o que pratica desde sua criação até os dias de hoje. De fato, no passado, Israel jamais falou sério sobre compartilhar as terras com os palestinos, jamais falou sério sobre alcançar a paz e jamais se preocupou com o direito internacional. Prender representantes do povo é negar sua existência e seu direito à terra. A prisão ou detenção indevida de uma figura política é a prisão de todo o povo palestino.

Porque a luta palestina preocupa tantas pessoas ao redor do mundo?

Na verdade, o povo palestino lidera uma batalha em nome de todo o mundo para conquistar justiça e preservar a paz internacional e a aplicação de direitos civis e humanos. Ignorar a ocupação de modo contínuo representa a aniquilação das normas internacionais e ameaça à estabilidade e paz em escala global, à medida que impõe como norma    a “lei da selva” e a “lei da força” em lugar do direito e da justiça.

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