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Morrer de medo aos 7 anos

A morte do menino Rayan Suleiman, de apenas 7 anos de vida, durante uma operação israelense em sua casa na cidade de Tuqu’, perto de Belém, na Palestina, está sendo pretensamente investigada. Ele morreu fugindo de perseguição? Fugindo de casa onde chegaram soldados? Caindo do alto ao fugir de homens armados? Os soldados o interpelaram com violência ou apenas invadiram sua casa ameaçando prender sua família? Seus pais podiam ser presos porque o menino atirou pedras em viaturas de Israel?  Ele também?

Não importa onde uma suposta investigação chegue, o fato é de que Rayan  morreu de pavor. Morreu de medo, com o coração batendo até o limite, por ser ele desta vez – ou sua família – o alvo de um bicho papão há muito temido, o alvo dos terrores dos quais de pequeno já aprendeu a ouvir sobre as invasões inesperadas de soldados nas casas palestinas, levando pais, mães, filhos ou filhas para lugares tenebrosos à imaginação de qualquer criança. Famílias palestinas, qualquer uma que esteja em uma vila ou casa cobiçada pela ocupação israelense, são uma ameaça em si aos olhos dos colonos ocupantes e alvos das operações de seus soldados.

O governo Biden, dos Estados Unidos, que tem passado pano para os crimes expostos da ocupação israelense, fez mais do mesmo. Sempre que os crimes são evidentes demais, como a execução de Shireen Abu Akleh, Biden se agarra a uma investigação que apenas serve de tempo para minimizar responsabilidades. E contempla com isso lobbies sionistas dentro de casa e uma parcela de israelenses que precisa se sentir no  direito de matar para dormir em casas e vilas  ocupadas.

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“Os EUA estão com o coração partido ao saber da morte de uma criança palestina inocente”, disse o porta-voz adjunto do Departamento de Estado dos EUA, Vedant Patel, durante uma coletiva de imprensa. “Apoiamos uma investigação completa e imediata sobre as circunstâncias da morte da criança, e acredito que a própria IDF também indicou que investigará o que aconteceu também”. A IDF (Forças de Defesa de Israel) é a mesma que realizou a operação que matou a criança.

Dói imaginar Rayan fugindo amedrontado até seu coração parar de pulsar por terror, tombo, ataque cardíaco ou o que seja que deva ser investigado. Sua morte desnuda a ocupação israelense como perigosa demais para crianças – não apenas as palestinas, mas também aquelas educadas para temer outras crianças como elas e a virar soldados incapazes de se comover com o medo de um menino diante de suas armas.

Seu caso deveria mesmo partir o coração do mundo. Mas a desgraça imposta aos palestinos não tem quebrado corações aliados de Israel há muito tempo.

Quem não se lembra do menino  Muhammad al-Durrah, que também morreu de medo e pavor, sem que o fato pelo menos barrasse o avanço da ocupação sobre as terras e vidas palestinas? Para jovens que não conhecem essa história, ela é do menino que se encolhia nos braços do pai enquanto este tentava avisar aos soldados israelenses que ali havia uma criança. O mundo todo viu pela TV o pai acenando e avisando. Não há como um soldado armado e com mira para a cena não ter visto. Mas ele  aprendeu a ter medo e ódio pelas crianças palestinas. E ele atirou e matou  al-Durrah   nos braços de seu pai. Há 22 anos.

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O soldado que matou  al Durah  atravessou o tempo. Já era um velho sniper em sua saga ocupante. Ouvimos sobre ele vez ou outra, quando a mídia não tem como ignorar suas caçadas. Ele mirou na testa de Shireen Abu Akleh porque ela tinha o papel de lhe dizer o que ele foi adestrado para não ouvir.  Tem assombrado crianças e suas famílias no meio da noite. Acusa meninos por suas pedradas como atos de terrorismo. E agora ele levou Rayan Suleiman a morrer de medo aos 7 anos.

O pavor mortal do menino  tem responsáveis em Tel Aviv, Londres, Washington, New York, Genebra. E no mundo ainda incapaz de reagir ao fato de que o apartheid violento de Israel está nú.

O mesmo soldado continua instalado pela comunidade internacional de arma na mão para proteger a ocupação de famílias e crianças palestinas que ainda resistem nas suas casas, apesar de um medo que faz o mundo verter algumas  lágrimas, enquanto nos quebra em covardia e desumanidade.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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