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Como os ataques de Israel e EUA ao Irã tornaram o mundo mais perigoso

2 de julho de 2025, às 06h00

Danos em prédios residenciais de Gisha e Marzdaran, em Teerã, por ataques de Israel, em 25 de junho de 2025 [Fatemeh Bahrami/Agência Anadolu]

As recentes hostilidades entre Irã e Israel e a entrada dos Estados Unidos no confronto, em nome de seu aliado colonial, mais outra vez impõem questões contundentes sobre diplomacia, ordem global e proliferação nuclear.

A agressão israelense seguiu a mesma cartilha de numerosas intervenções recentes em toda a região. Sua estratégia compreendeu assassinatos e ataques, para além de sítios militares, de infraestrutura civil, como redações, hospitais e universidades. Centenas de civis foram mortos no Irã.

Não é preciso ser expert em política internacional para compreender que essa ofensiva foi realizada para descarrilar a delicada diplomacia entre Teerã e Washington, em curso desde que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, voltou ao poder. 

A participação americana não apenas abandonou a promessa de Trump de encerrar as custosas intervenções do país no exterior como expôs a persistente influência de Israel na tomada de decisões na Casa Branca.

Apesar do autoelogio israelense de que teria supremacia aérea e das alegações de que os ataques buscariam conter as capacidades ofensivas do Irã, este conseguiu deflagrar uma resposta devastadora contra alvos militares e coloniais de Israel. Teerã lançou mão ainda de um ataque simbólico, performativo, à base aérea americana de al-Udeid, no Catar.

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A mensagem triunfalista dos Estados Unidos após seus primeiros ataques a instalações nucleares do Irã se encobriu, pouco a pouco, por um debate frenético sobre o grau de sucesso ou fracasso das operações, assim como sobre o real paradeiro das reservas de urânio enriquecido do Estado persa.

Prever as movimentações seguintes é absurdo mesmo ao mais experiente observador, sobretudo diante da fragilidade marcante do atual cessar-fogo. A liderança iraniana, há muito tempo, reafirma qual seria sua resposta em caso de ataques diretos dos Estados Unidos a seu território, como se mostrou pela investida, meticulosamente calibrada, a al-Udeid. 

Interromper a navegação pelo estreito de Hormuz esteve sobre a mesa, à medida que uma resposta muito mais contundente poderia levar a ataques iranianos às instalações nucleares de Israel, que logram do privilégio de não passarem por quaisquer inspeções internacionais, enquanto a ocupação segue como o único Estado detentor de bombas atômicas de todo o Oriente Médio.

Insegurança global

Noções de uma “rendição incondicional” por parte do Irã jamais excederam a fantasia. Caso a tentativa de Trump de instituir um cessar-fogo dentre as partes caía por terra, o terreno está aberto para uma onerosa guerra de atrito, com duro prejuízo não somente a Washington como a Tel Aviv.

Não se pode bombardear o conhecimento nuclear, apesar das tentativas israelenses de escolasticídio, documentadas na Palestina. Um aspecto deveras mais perigoso repousa nas súbitas e regulares mudanças de direção de Trump, extremas até mesmo para seus caprichos, com um desejo aparente por negociações seguido por ataques e, outra vez, negociações.

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Paralelamente às declarações sem sentido de Washington sobre mudança de regime, a falta de direção torna difícil a Teerã ler as verdadeiras intenções do presidente. Calibrar uma resposta é, portanto, ainda mais precário.

Em último caso, ambas as potências nucleares violaram a lei internacional sob alegação de “preventivamente” impedirem uma ameaça, projetada no programa nuclear do Irã, embora informações de inteligência expressem o contrário. Esperanças concomitantes de fomentar uma insurreição doméstica na República Islâmica, sobretudo via ataques aéreos, também se confirmaram ingênuas.

A polarização política no campo doméstico e mesmo questões sobre a legitimidade do regime seguem em voga, mas esperar mudanças através de força militar externa expõe incompreensão total da história do Irã e da resistência de seu povo a toda e qualquer ingerência estrangeira.

A campanha israelo-americana, em contrapartida, engendrou um mundo ainda menos seguro. Tais desenvolvimentos devem aumentar chamados dentro do Irã para que seu programa nuclear, até então civil, seja enfim militarizado, como medida dissuasiva. Ao atacarem um Estado não-nuclear, Israel e Estados Unidos ampliaram enormemente os riscos de proliferação, ao conferir um verdadeiro incentivo para que países terceiros se recorram a tais armas como eventual meio de sobrevivência. 

Dissuasão nuclear funcionou para Israel, enquanto a diplomacia nuclear fracassou para o Irã. Outros Estados ambiciosos certamente olharão para este momento para justificar decisões.

Por fim, a resposta débil — copia-e-cola — dos Estados europeus à entrada de Trump e dos Estados Unidos no conflito somente erodem ainda mais seus supostos alicerces de uma “ordem embasada no direito”. Com a reputação em frangalhos, especialmente no que diz respeito aos dois pesos e duas medidas adotados em Gaza e na Ucrânia, e sua submissão covarde aos “interesses de segurança” de Israel e Estados Unidos, a Europa se vê novamente manchada por ineficácia e hipocrisia.

À medida que o criminoso eixo Israel—Estados Unidos busca uma estratégia de “poder é razão”, ou “lei da selva”, sua impunidade esmaga todo e qualquer senso de normas e consenso internacionais, cujo único resultado possível é o perigo para todos nós. 

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Este artigo foi publicado originalmente em inglês pela rede Middle East Eye, em 30 de junho de 2025.

 

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.