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A nova política externa de Lula: Itamaraty demite embaixador a Israel

General Gerson Menandro Garcia de Freitas, então embaixador brasileiro a Israel [Palácio do Itamaraty]
General Gerson Menandro Garcia de Freitas, então embaixador brasileiro a Israel [Palácio do Itamaraty]

Em medida que parece reforçar a mudança na política externa do país, em particular, referente a Israel, o novo presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva demitiu seu embaixador ao estado sionista, o general Gerson Menandro Garcia de Freitas. A exoneração foi assinada pelo Ministro de Relações Exteriores Mauro Vieira, logo nas primeiras semanas do novo governo. O chanceler explicou que o embaixador Freitas era, na verdade, um general do Exército sem absolutamente nenhuma experiência diplomática.

Freitas foi nomeado embaixador pelo ex-presidente de ultradireita Jair Bolsonaro, em setembro de 2020. Freitas foi chefe do Comando Militar do Palácio do Planalto e diretor da Secretaria de Relações Institucionais para a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), antes de chegar ao cargo de embaixador.

“O embaixador brasileiro em Israel trabalhou para aprofundar relações entre os países durante o governo Bolsonaro”, relatou a imprensa local. Neste contexto, Bolsonaro anunciou intenções de transferir a embaixada brasileira de Tel Aviv a Jerusalém ocupada.

De fato, sob Bolsonaro, o Brasil se tornou o novo melhor amigo de Israel. Bolsonaro pediu ajuda ao estado do apartheid durante a pandemia de covid-19 – que deixou quase 700 mil mortos sob sua gestão – e hasteou bandeiras israelenses em público em diversas ocasiões. Sua presidência tomou uma abordagem distinta da tradição brasileira no que se refere a Israel – muito distante das políticas adotadas, em particular, por seus antecessores de esquerda. O impacto foi sentido na Organização das Nações Unidas (ONU).

Conforme o jornal O Globo, o embaixador – agora exonerado – teve papel crucial na decisão da deleção brasileira na ONU de votar contrariamente à proposta palestina de consultar o Tribunal Internacional de Justiça sobre a ocupação israelense.

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A decisão de Lula de demitir o general de seu cargo diplomático nos leva de volta aos governos prévios do Partido dos Trabalhadores (PT), entre 2003 e 2016, quando o Brasil manifestou, por exemplo, uma postura notável sobre os bombardeios de Israel em 2014, contra a Faixa de Gaza. Na ocasião, o Itamaraty condenou a força “desproporcional” adotada pelo exército israelense e convocou seu embaixador em Tel Aviv de volta a Brasília para esclarecimentos. Quando o Brasil descreveu – corretamente – o que se passava em Gaza como massacre, a chancelaria de Israel respondeu ao insultar a maior nação sul-americana como “anão diplomático”. No ano seguinte, a então presidente Dilma Rousseff e seu chanceler rejeitaram a indicação de Dani Dayan como embaixador israelense a Brasília devido a sua posição de liderança no Conselho de Yesha, órgão israelense que representa os assentamentos ilegais na Cisjordânia ocupada.

No último domingo, 8 de janeiro, bolsonaristas invadiram e vandalizaram o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Palácio do Planalto, em cenas que logo nos lembraram da insurreição trumpista que atingiu o Capitólio, sede do legislativo dos Estados Unidos, dois anos atrás. Diversos países condenaram a violência e o terrorismo dos apoiadores do ex-presidente, que se recusa a reconhecer a derrota eleitoral, e expressaram apoio às autoridades brasileiras. Dentre os quais: Estados Unidos, França, Alemanha, China, Índia e Rússia, que descreveram os atos de destruição como ataque frontal à democracia.

Em Israel, não obstante, um jornalista preferiu o termo “maldição”, pois Lula mantém apoio aos direitos do povo palestino. “A maldição da causa palestina assombra todos que simpatizam com sua mentira”, esbravejou Edy Cohen em sua página do Twitter. “Agora é a vez do presidente do Brasil, Lula da Silva. Centenas de brasileiros invadiram seu palácio e seu parlamento. Ainda mais está por vir”. O tom coincide com ameaças do próprio Bolsonaro e seus ideólogos.

Não surpreende, portanto, que muitos dos apoiadores golpistas do ex-presidente de extrema-direita carregassem consigo as cores azul e branco da bandeira israelense, no que se converteu em símbolo do fundamentalismo evangélico no Brasil e da forte amizade entre bolsonaristas e a ocupação colonial de Israel sobre a Palestina. Nos atos golpistas pelo retorno de Bolsonaro, que constituiu um governo militar em seu mandato de quatro anos, o generalato brasileiro também está implicado.

A demissão do embaixador dá um novo tom à política externa brasileira. É razoável assumir que o apoio à Palestina e a busca por mediação de conflitos se torne pilar do novo governo.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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