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‘Ficaremos aqui até que a Palestina seja livre’, diz camponês agredido por colonos

Hafez Hureini, agricultor palestino de 51 anos, agredido por colonos israelenses

Em outubro, um agricultor palestino de 51 anos cuidava das terras de sua família nos arredores da aldeia de At-Tuwani, onde cultiva azeitonas, figos, tomates e abobrinhas, quando foi atacado por cinco colonos israelenses. Os homens, armados com rifles de ataque, bastões de beisebol e canos de metal, surgiram subitamente do posto colonial de Havat Ma’on, instalado ilegalmente nos arredores da aldeia.

Hafez Hureini ergueu sua pá para defender-se dos golpes. Contudo, teve os braços quebrados.

“Quando os colonos começaram a atirar, usei toda a minha energia para fugir deles e sentei-me em um canto próximo para esperar uma ambulância”, relatou Hureini. Não obstante, quando o veículo médico chegou, de um hospital palestino, e começou a prestar seus primeiros-socorros, soldados israelenses chegaram ao local e detiveram Hureini.

Os colonos ilegais, explicou a vítima, chamaram os soldados para prendê-lo. Os paramédicos do Crescente Vermelho tentaram mostrar aos agentes da ocupação que Hureini estava ferido, mas foram ignorados. Os colonos alegaram que o pequeno agricultor os agrediu; os agentes também quebraram a maca sobre o qual ele estava, furaram os pneus da ambulância e investiram com brutalidade contra os profissionais de saúde.

“Eles me prenderam por tentativa de homicídio e puseram algemas em meus calcanhares antes de me levar ao centro de investigação do assentamento de Kiryat Arba, na cidade de Hebron (Al-Khalil), na Cisjordânia ocupada”, reportou Hureini. “Fui interrogado e lhes dei meu depoimento em detalhes, com toda a honestidade. Expliquei que fui eu quem foi atacado em minha terra e que os colonos haviam quebrado meus braços”.

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Hafez Hureini, agricultor palestino de 51 anos, agredido por colonos israelenses

O advogado da família pôde falar brevemente com a vítima, mas foi impedido de acompanhar o interrogatório.

Os soldados da ocupação apresentaram a seguinte versão: “Um grupo de palestinos aproximou-se do posto avançado, levando dois israelenses a confrontá-los. Um palestino iniciou o ataque e um israelense disparou contra o ar. Soldados chegaram a cena para separar as partes”.

O jornal israelense Haaretz reportou que o “suspeito” palestino foi “levemente ferido durante o confronto”. A reportagem sequer mencionou que ambos os braços de Hureini foram quebrados pelos colonos ilegais durante o atentado – o que incita a pergunta sobre o significado do termo “levemente ferido”. “Como um homem com os braços quebrados consegue agredir alguém?”, questionou Hureini.

O camponês permaneceu detido por dez dias e teve de comparecer diante de uma corte militar no penitenciária de Ofer. Hureini foi transferido à audiência em um veículo no qual prisioneiros palestinos estavam algemados com correntes de metal. Toda a experiência foi deveras dolorosa ao pequeno agricultor. Hureini foi então liberado sob fiança de dez mil shekels (US$2.890) após dez dias de tortura física e mental. Nenhum dos cinco colonos ilegais que invadiram suas terras e quebraram seus braços foram detidos ou sequer questionados.

“É isso que Israel chama de justiça”, reiterou Hureini. “Vítimas palestinas são transformadas em criminosos e postas para sofrer. Passei mais de 24 horas sem dormir e fui interrogado por horas e horas. Ao que parece, eu sou um criminoso”.

Hureini nasceu e passou toda sua vida em At-Tuwani, na região de Masafer Yatta, na Cisjordânia ocupada; além de fazendeiro, é um contumaz ativista de direitos humanos. Ao longo dos anos, sua comunidade presenciou cada vez mais ataques de colonos e soldados israelenses. Trata-se da política deliberada e ainda em curso de limpeza étnica na Palestina ocupada.

Hureini recorda quando os primeiros colonos chegaram à área na década de 1980, ao instalar o posto avançado ilegal que se tornou posteriormente o assentamento de Ma’on. “No início dos anos oitenta, as autoridades da ocupação israelenses começaram a implementar sua política de apartheid, ao avançar com os esforços de limpeza étnica. As forças ocupantes apartaram toda a área da cidade de Yatta, por meio da infame estrada 317, que separou a região em duas partes: um perímetro destinado ao assentamento e outro atribuído como zona de disparos de guerra”.

Hafez Hureini, agricultor palestino de 51 anos, agredido por colonos israelenses

 

Masafer Yatta situa-se ao sul de Hebron, na chamada Área C – equivalente a 60% da Cisjordânia ocupada, sob controle administrativo e militar de Israel. O estado sionista reserva boa parte das terras a benefício exclusivo de colonos judeus. As comunidades palestinas não são conectadas à rede de água e energia que abastece o assentamento vizinho. Israel proíbe os residentes árabes de construir novas estruturas ou conectar suas propriedades a serviços públicos. Os soldados e colonos restringem ainda o acesso dos trabalhadores rurais a suas lavouras e encorajam atos de violência colonial para tornar a vida dos palestinos tão insuportável que não tenham alternativa senão deixar suas terras.

“A ocupação começou a roubar e confiscar propriedades e construir assentamentos aos colonos extremistas”, destacou Hureini. “Desde os anos oitenta, Israel mantém sua política de apartheid e limpeza étnica por meio da administração militar que nos controla. As terras são apreendidas e expropriadas; áreas são fechadas aos palestinos; postos de controle militar são instalados nas entradas das aldeias. Somos regularmente fuzilados com insultos e assédio”.

Hureini observou que mais de 60% das terras de sua família foram roubadas e cedidas a colonos ilegais. “Trata-se de um crime de guerra”.

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Apesar de pagar a fiança, em outubro último, o pequeno fazendeiro foi banido de suas próprias terras por trinta dias.

A comunidade palestina local notou um novo surto nas invasões militares e ataques de colonos ilegais desde maio, quando a Suprema Corte de Israel deferiu a demolição das casas de mais de mil palestinos radicados em oito povoados de Masafer Yatta, para substitui-los por um suposto centro de treinamento militar. A decisão deflagrou forte repúdio local e internacional.

“Este veredito é prova de que o estado ocupante continua a executar o crime de limpeza étnica contra os palestinos”, concluiu Hafez Hureini. “Contudo, não deixaremos de protestar enquanto tentarem nos expulsar de nossas terras. Nossa vida é assim e ficaremos aqui até que a Palestina seja livre”.

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