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Sucesso da Copa do Mundo no Catar seria uma vitória de todos os árabes

Réplica do troféu da Copa do Mundo durante a cerimônia de abertura do torneio no Catar, no Estádio al-Bayt, em al-Khor, 20 de novembro de 2022 [Salih Zeki Fazlioglu/Agência Anadolu]

O Catar vive suas mil e uma noites. Certa vez um sonho no coração das pessoas; agora, realidade vista em primeira mão. O pequeno país árabe realiza uma festa colossal a todo o planeta. Dois milhões de turistas devem chegar ao Catar para a Copa do Mundo FIFA, com seus emblemas no peito e suas bandeiras em riste. Bilhões de torcedores em todos os cantos do mundo assistirão os jogos pela televisão. Gastos não poupados: trata-se da Copa do Mundo mais cara da história das Copas.

Trata-se de um verdadeiro ponto de inflexão a Doha e à relação dos povos árabes com eventos esportivos internacionais. É a primeira Copa do Mundo organizada em um país árabe e islâmico. Os anfitriões aceitaram o desafio e conquistaram o direito de receber o torneio mais popular do globo em dezembro de 2010. A cerimônia de abertura foi sofisticada e bem dirigida, como uma vitrine da engenhosidade árabe. Toda a nação demonstra entusiasmo ao evento esportivo.

Tudo isso foi feito diante de uma campanha coordenada e sem precedentes sobre acusações de abusos de direitos humanos e outras questões. Desde as preocupações sobre o clima no Golfo a alegações de propina e apoio ao “terrorismo”, uma máquina de propaganda entrou em ação no que se refere à Copa do Mundo. Reformas e recuos do governo, assim como suas conquistas ao longo dos últimos anos, parecem ser ignorados.

Palestinos em Gaza assistem aos jogos da Copa do Mundo FIFA, realizada no Catar, em 20 de novembro de 2022 [Mohammad Asad/Monitor do Oriente Médio]

O bloqueio imposto ao Catar por seus vizinhos do Golfo, em 2017, somou-se à guerra midiática que clamava por boicote ao torneio ou mesmo substituição do país-sede. A campanha intensiva não terminou com a reconciliação e o acordo de al-Ula, em 2020, assinado com Arábia Saudita. Em meio à pandemia de coronavírus e a invasão russa da Ucrânia, países-irmãos aproveitaram a chance para espalhar rumores sobre o suposto cancelamento da Copa do Mundo. Suas redes de imprensa propagaram e alimentaram boatos. No entanto, ao perceber que seus chamados não teriam êxito, passaram a desdenhar do Catar por gastar tanto na Copa do Mundo.

Em último caso, o foco voltou-se às leis de equidade no Catar, sobretudo aquelas que divergem do Ocidente, em particular, referentes aos direitos da comunidade LGBTQ+. As autoridades em Doha insistem que todos são bem-vindos; reconhecem que costumes e direitos são distintos em outros países; mas pedem aos turistas que respeitem os costumes, tradições e padrões morais adotados no país.

Diante disso, o Ocidente revelou outra vez seu rosto colonial, racista e odiento. Os ataques não foram motivados por preocupações sobre terrorismo, direitos humanos, direitos das mulheres, dos homossexuais, dos trabalhadores, ou quaisquer outros. E como poderia ser se os governos ocidentais mantêm seu contundente apoio à ocupação israelense e suas violações cotidianas de direitos humanos e da lei internacional?

A verdadeira razão é que a Copa do Mundo é sediada por um estado árabe e islâmico. Trata-se de islamofobia e racismo, puro e simples.

LEIA: Copa do Mundo: Catar prefere evitar problemas em casa a capitular ao Ocidente

Todavia, começou o torneio, em meio a apelos para que futebol não se misture com política. No entanto, a justaposição entre futebol e política não é novidade e mesmo a campanha contra o Catar demonstra a politização do esporte. A Copa do Mundo FIFA não é somente um torneio de futebol, mas também uma plataforma mundial para expor diversas ideologias e representações identitárias. Contra o Catar, vemos a prática orientalista de impor valores e morais ocidentais a estados islâmicos. Ao fazê-lo, críticos estilhaçaram a própria crença de que o futebol em geral e a Copa do Mundo, em particular, podem reunir os povos de maneira absolutamente distinta de outros eventos. O Catar, neste entremeio, insiste preservar seus valores, tradições e identidade islâmica enquanto promete abertura e acolhimento a visitantes de todo o planeta.

O emir catariano Tamim Bin Hamad al-Thani lamentou a “difamação sem precedentes” que seu país enfrentou às vésperas do evento. “Receber uma Copa do Mundo é uma oportunidade para mostrar quem somos, não apenas em termos de força de nossa economia e nossas instituições, mas também em termos de nossa identidade civilizacional”, reafirmou o emir. “Aceitamos este desafio sob a fé em nosso potencial, de que nós obteremos sucesso, pois temos ciência do quão importante é receber um evento tão grande quanto a Copa do Mundo em um estado árabe”.

Palestinos em Gaza assistem aos jogos da Copa do Mundo FIFA, realizada no Catar, em 20 de novembro de 2022 [Mohammad Asad/Monitor do Oriente Médio]

Por mais que tentassem, os detratores não impediram o Catar de trabalhar duro nos últimos 12 anos para construir a infraestrutura do torneio e responder a apreensões em voga, ao emendar sucessivas leis catarianas. Bilhões foram gastos para assegurar acomodação e conforto a todos os visitantes, para que possam se locomover às partidas sem atrasos ou dificuldades, apesar de numerosos problemas logísticos em torno de tamanha demanda a um país tão pequeno. Itens de tecnologia de ponta foram adotados para conceder atualizações imediatas sobre o trânsito e sugerir rotas alternativas, por exemplo. Pela primeira vez, um sistema de “cidade inteligente” foi empregue no mundo árabe, com intuito de beneficiar torcedores, equipes e residentes.

“Sempre dissemos que o Catar entregaria a melhor Copa do Mundo da história”, argumentou o presidente da FIFA Gianni Infantino. “O mundo está animado; o Catar está o pronto. Juntos, nós faremos a melhor Copa do Mundo da história, tanto dentro quanto fora de campo”.

Assim esperamos. O esporte constrói laços entre os povos. Reconciliação é fundamental. Vimos os presidentes do Egito e da Turquia apertar as mãos, apesar de um relacionamento turbulento entre as partes. Vimos Mohammed bin Salman, príncipe herdeiro saudita, se envolver com uma bandeira do Catar e ser um dos primeiros governantes árabes a visitar vizinho após rematar seu bloqueio. Bin Salman instruiu seu regime a apoiar os esforços da Copa do Mundo no Catar. Não obstante, a ausência de líderes emiradenses foi notável.

As próximas semanas representam um momento de celebração árabe, não apenas catariana. O sucesso do Catar é o sucesso de todos os povos árabes. Gostaria que apoiadores do sionismo e do colonialismo percebessem isso e se juntassem à festa.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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