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O terror de Israel contra crianças de Gaza na tela do Netflix

Crianças palestinas em meio aos escombros de um edifício danificado por ataques israelenses em Beit Lahia, na Faixa de Gaza, 7 de junho de 2021 [Ashraf Amra/Agência Anadolu]
Crianças palestinas em meio aos escombros de um edifício danificado por ataques israelenses em Beit Lahia, na Faixa de Gaza, 7 de junho de 2021 [Ashraf Amra/Agência Anadolu]

A comemoração do 12 de outubro, Dia da Criança, me fez lembrar e rever o documentário Nascido em Gaza (Born in Gaza, 2014, 78 min.), do correspondente de guerra, escritor e cineasta de origem ítalo-argentina Hernán Zin, que pode ser visto na plataforma Netflix. O documentário foi rodado durante a ofensiva à Faixa de Gaza, em 2014, e retrata o cotidiano de dez crianças entre as bombas e a destruição provocada durante e após os ataques terroristas de Israel.

O que levou o diretor Hernán Zin a produzir o documentário foram as imagens aterrorizantes de um dos ataques aéreos em uma praia de Gaza, que resultou na morte de quatro crianças da mesma família (Mohamed, Ismail, Zakariya e Ahed), quando estavam jogando futebol. Casos como esse são os tais “efeitos colaterais” praticados pelo “exército mais moderno do mundo”, que não consegue distinguir crianças e combatentes militares.

Nascido em Gaza traduz o esforço dos palestinos para superar os traumas após os ataques, de maneira contundente e por meio de depoimentos como os de Mohamed, um menino que procura coisas nos lixões para vender e sustentar sua família, já que seu pai não pode trabalhar; Udai, que presenciou a morte de Mohamed, seu irmão mais velho, de 22 anos; e Mahmud, filho de um camponês palestino que teve suas plantações destruídas e cordeiros e camelos mortos pelos ataques sionistas.

O documentário também traz as falas de Sondos, uma garotinha que ainda guardava as marcas expostas do ferimento do seu fígado; Rajaf, filho de um motorista de ambulância que foi assassinado enquanto se ocupava em salvar vidas; Malak, uma jovem que presenciou o bombardeio da escola da Organização das Nações Unidas (ONU) para meninas, no campo de refugiados de Jabalia; Hamada, um dos quatro garotos que sobreviveu ao ataque na praia de Gaza; e Bisan, a menininha que teve pais mortos no bombardeio e necessita de cirurgia estética no olho, fora de Gaza.

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Os depoimentos são comoventes e relatam de maneira clara a trágica experiência e os efeitos da ocupação israelense em suas vidas, como quando Mahmud diz: “não temos mísseis ou tanques. Cultivamos vegetais e não bombas”; assim como a cena em que Rajaf e seus amigos prestam homenagem ao pai morto, borrifando água com uma garrafa de plástico em seu túmulo; ou na fala de Motasem, que sofre de estresse pós-traumático e necessita de ajuda psicológica fora de Gaza, o que não lhe é permitido por Israel, na qual relata que vê o fantasma do seu irmão morto todas as noites.

A obra usa o recurso de às vezes mostrar as crianças em câmera lenta enquanto transitam pelos escombros para torná-las indivíduos, vítimas concretas do terrorismo israelense, e não meras estatísticas de um conflito no qual a responsabilidade de Israel pela destruição e mortes é minimizada pela mídia e pela historiografia ocidental.

O filme retrata a dura realidade de como aquelas crianças e suas famílias sofrem e lutam para superar o trauma e para normalizar suas vidas diante da situação de destruição de suas casas, escolas e hospitais. Entre o dia 7 de julho e 26 de agosto de 2014, o terrorismo de Israel assassinou 2.200 palestinos, entre eles 550 crianças, 70% com menos de 12 anos de idade, e foi responsável por mais de 11.000 feridos, sendo 3.358 crianças, e por mais de 100 mil deslocados durante os atentados daquele ano, segundo o relatório anual do Escritório de Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA) da ONU. Do lado do agressor israelense, 73 pessoas morreram, incluindo 67 soldados.

Os fatos de destruição e mortes relatados no documentário fazem parte da história de Gaza, onde o ocupante israelense realiza uma agressão cruel permanente como forma de legitimar a ocupação colonial sionista e expandir ilegalmente o território atribuído a Israel. Os ataques com caças e bombas de última geração fornecidos pelos EUA têm como objetivo destruir a infraestrutura de Gaza, gerar o caos, promover a limpeza étnica e, com isso, enfraquecer a resistência palestina.

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Apesar de todo aparato militar moderno, Israel não tem conseguido dobrar as forças da resistência nem impedir a realização de gigantescas manifestações de solidariedade ao povo palestino, que denunciam os crimes do estado judeu nas principais capitais do mundo, bem como manifestações anti-Israel em várias cidades dos territórios atribuídos a Israel, nas quais residem judeus e palestinos de Israel.

A Faixa de Gaza, que tem 365 quilômetros quadrados e é habitada por mais de dois milhões de palestinos, é uma das áreas mais densamente povoadas do mundo, com cerca de 6 mil habitantes por quilometro quadrado, sendo mais de 70% deles crianças ou jovens, sem direito a água potável, eletricidade e remédios. Desde 2007, Israel impede a entrada de centenas de tipos de bens e matérias-primas em Gaza, bem como a exportação de muitos produtos industriais e agrícolas, devido ao fechamento da maioria dos acessos comerciais.

Israel transformou a Faixa de Gaza em um lugar insuportável, já que o cerco a tornou a maior prisão a céu aberto do mundo, recordando os campos de concentração nazista durante a Segunda Guerra Mundial, tão utilizados pelos sionistas como forma de chantagear o mundo e encobrir os seus crimes. Israel pratica um genocídio em câmera lenta contra os palestinos de Gaza, onde, somadas ao sofrimento diário da vida sob o cerco, as repetidas agressões só pioram as condições de vida dos seus moradores.

Ao roubar a infância das crianças palestinas, Israel é coerente com sua política iniciada em 1948 de limpeza étnica continuada do povo palestino. Enquanto muitas crianças recebem presentes pelo seu dia, o presente que as crianças palestinas querem e? o direito de brincar como qualquer outra criança e correr livres pelas ruas da Palestina, sem tanques de guerra e bombardeios, sem velórios diários e prisões.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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