Com a Síria entrando em uma nova fase sob a liderança de Ahmad Al-Sharaa, o novo governo enfrentou diversas barreiras, notadamente as sanções impostas pelos Estados Unidos (EUA) à Síria. Em resposta, em 13 de maio de 2025, o novo presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou que seu governo suspenderia as sanções à Síria, expressando a necessidade de dar ao novo governo sírio a chance de reanimar o país. Após este anúncio, Trump assinou um decreto em 30 de junho de 2025 para encerrar as sanções americanas à Síria, em uma tentativa de apoiar os esforços de reconstrução do país.
No entanto, a decisão de Trump de remover as sanções à Síria vem acompanhada de mensagens mistas e altamente politizadas, revelando o lado não humanitário de seu gesto. Embora os benefícios dessa medida para o povo sírio e sua importância para a estabilidade política, o crescimento econômico e o futuro a longo prazo da Síria sejam indiscutíveis, isso levanta questões sobre o futuro do país.
O fim das sanções americanas de décadas à Síria
As sanções têm servido como uma ferramenta crucial para os EUA e outros governos ocidentais exercerem pressão política sobre países além da Síria, como Irã e Venezuela. As sanções americanas à Síria datam de várias décadas. Após o apoio da Síria à revolução iraniana em 1979, sanções foram impostas à Síria e a indivíduos afiliados ao regime pelo governo americano, considerando-o patrocinador do terrorismo. Posteriormente, seguiram-se outras ondas de sanções em 2004, 2011 e 2019, conhecidas como Lei de Proteção Civil Caesar Syria. Essas sanções afetaram negativamente a Síria, isolando o país do sistema financeiro global e impondo severas restrições econômicas por mais de uma década, impedindo, assim, qualquer forma de recuperação e reconstrução econômica. Essas sanções persistiram mesmo após a queda de Assad, constituindo um obstáculo significativo aos esforços do novo governo para liderar uma transição eficaz. Mais importante ainda, o povo sírio não pôde participar significativamente da transformação do país em meio ao caos prolongado.
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Como resultado, o foco principal do novo governo sírio voltou-se para a libertação do país pela segunda vez; após a queda do regime de Assad, o governo buscou o fim das sanções impostas pelos EUA à Síria. O objetivo por trás dessa estratégia é fortalecer a economia síria, facilitar os esforços humanitários que visam contribuir para a sobrevivência do povo sírio e reintegrar a Síria ao mundo globalizado após décadas de isolamento. De fato, Trump suspendeu as sanções em menos de quatro meses após sua chegada ao gabinete presidencial.
Síria sem sanções: enquadramento humanitário, ação política
Apesar da importância da remoção das sanções de Trump para a Síria, surgem várias questões sobre a natureza subjacente dessa medida. A decisão de Trump é considerada um esforço humanitário, especialmente devido à sua ênfase nos desafios enfrentados pela população síria e à importância de dar ao governo sírio a chance de liderar o país rumo à estabilidade e à prosperidade. O presidente dos EUA encerrou seu discurso dizendo “Boa sorte, Síria. Mostre-nos algo muito especial”, expressando seu desejo de ver o governo em Damasco ter sucesso.
Logo após o anúncio de Trump, investidores dos Emirados Árabes Unidos (EAU), Kuwait, Arábia Saudita e outros atores internacionais importantes demonstraram interesse em investir na Síria, conforme relatado pelo Ministro das Finanças sírio, Yisr Barnieh. Consequentemente, o crescimento econômico da Síria desempenhará um papel fundamental nos esforços de recuperação, particularmente na reconstrução de setores-chave — saúde, energia e educação — e infraestrutura. Tais esforços contribuem significativamente para o enfrentamento de outras questões importantes, como desemprego, pobreza e a crise dos refugiados, com milhões de refugiados tendo a oportunidade de retornar ao seu país e contribuir para sua revitalização.
De fato, Trump praticou a tradicional política da cenoura e do castigo com a Al-Sharaa, prometendo suspender as sanções à Síria se seus pedidos fossem atendidos. Para Trump, a Al-Sharaa deve deportar palestinos, considerando-os terroristas, assumir a responsabilidade pelos centros de detenção dos combatentes do Estado Islâmico do Iraque e do Levante (ISIS) no nordeste da Síria e, mais significativamente, que a Síria assine os Acordos de Abraão com Israel. Por sua vez, a Al-Sharaa sinalizou que está disposto a cooperar. Ele ofereceu a Trump outros incentivos para garantir a remoção das sanções, incluindo o acesso dos EUA ao petróleo sírio, garantias para a segurança de Israel e o estabelecimento de uma torre Trump na capital síria. Isso sinaliza que a remoção das sanções foi uma medida condicional na qual Al-Sharaa foi recompensado por sua disposição de agir em consonância com os interesses dos EUA. Portanto, a medida foi política e não humanitária, atendendo aos objetivos estratégicos dos EUA, com a linguagem humanitária sendo substancialmente utilizada para ganhos políticos e diplomáticos.
Atos políticos em nome do humanitarismo? Lições Aprendidas
As sanções impostas pelos EUA à Síria prejudicaram a capacidade de diversos doadores e organizações internacionais de se envolverem efetivamente em atividades humanitárias no país. Isso não apenas colocou em risco a vida de milhões de pessoas, mas também criou uma forte dependência das declarações e decisões tomadas por governos importantes como o dos EUA. Agora, após Trump suspender as sanções à Síria, as pessoas podem receber ajuda e colaborar com atores internacionais para lançar os esforços de reconstrução e conduzir seu país rumo à prosperidade. Graças às mudanças políticas implementadas pelo novo governo dos EUA.
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Em suma, a remoção das sanções por Trump e suas implicações devem ser entendidas como parte do cálculo político mais amplo que define o humanitarismo internacional — em termos do sistema como um todo e de suas operações. A atual estrutura política internacional expõe como os esforços e decisões humanitários são usados para promover os interesses de potências globais. As sanções de décadas contra a Síria foram suspensas apenas porque isso oferecia ganhos tangíveis aos EUA e seus aliados. Esse dilema reflete uma lógica híbrida de compaixão e controle, em que decisões humanitárias são tomadas para garantir o controle sobre países frágeis que precisam urgentemente de apoio para sobreviver. Portanto, a decisão dos EUA de remover as sanções contra a Síria não pode ser considerada puramente humanitária. Em vez disso, representa uma isca humanitária, com fins geopolíticos de longo prazo em mente.
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