Anas Hawari, jornalista palestino de 28 anos, confirmou que não pretende retornar ao Brasil após sofrer assédio por agentes da Polícia Federal no Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro, reportou a Folha de S. Paulo.
Hawari recordou sua experiência traumática, incluindo interrogatórios arbitrários após passar pela imigração, sobre supostas conexões com o grupo palestino Hamas.
Radicado em Nablus, na Cisjordânia ocupada — onde o Hamas não possui presença —, Hawari viajou ao Brasil para participar de uma conferência internacional da associação de checagem de notícias GlobalFact, realizada no Rio em junho.
Hawari é correspondente do portal palestino Tayqan, que busca monitorar informações falsas e propaganda disseminada por grupos de extrema-direita, incluindo associações coloniais israelenses.
Jornalista ativo há dez anos, Hawari descreveu a abordagem das autoridades brasileiras como “violação injustificada”.
Ao pousar de Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, em 23 de junho, Hawari apresentou seu passaporte palestino na aduana brasileira, quando foi imediatamente conduzido a uma sala para aguardar orientações.
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Em seguida, foi interrogado por agentes não-identificados, conforme o seu relato: “Um deles começou a me fazer uma série de perguntas. Pediu informações pessoais e sobre meu trabalho … Então me disse: ‘Agora, o mais importante, qual a sua opinião sobre a guerra [sic] entre Israel e Hamas?’”.
A partir de então, Hawari notou insistência em questões sobre supostas ligações com o grupo, incluindo eventual treinamento militar. “Estava chocado. Respondi uma e outra vez que sou só um jornalista e checador de fatos — só isso”.
Após contundente questionamento, Hawari foi fichado ilegalmente, fotografado contra um fundo branco: “Por um momento, pareceu que eu era um criminoso”.
Hawari destacou o ineditismo da situação. Liberado, seguiu para o evento e teve uma boa experiência na cidade, salvo uma tentativa de roubo de celular. “Disseram que isso é comum no Brasil. Parece que as autoridades deveriam focar nisso”.
A conferência foi bem-sucedida, mas o assédio deixou marcar. “Não quero viajar para o Brasil de novo”, destacou o jornalista.
A abordagem é arbitrária mesmo que houvesse conexão com o Hamas, grupo político-militar não criminalizado pelo Estado brasileiro, que acompanha diretrizes do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a matéria.
Em contato com a Folha, a Superintendência da Polícia Federal no Rio prometeu apurar o caso. Contudo, denúncias prévias — incluindo do jornalista Muslim Abuumar, há um ano, em Guarulhos — não obtiveram resposta ou posição do governo.
No caso de Abuumar, impedido de entrar, fontes da imprensa apontaram que o assédio adveio de ordens da embaixada dos Estados Unidos, em violação da independência e soberania das instituições brasileiras.
Apesar de apelos internacionais, Israel mantêm ataques indiscriminados a Gaza.
As ações são punição coletiva a uma operação transfronteiriça de grupos da resistência palestina em Gaza, incluindo o Hamas, que capturou colonos e soldados israelenses em 7 de outubro de 2023.
Desde então, o enclave foi sitiado e destruído, com ao menos 56.500 mortos, 135.500 feridos, 11 mil desaparecidos e dois milhões de desabrigados sob fome generalizada. A maioria das vítimas são mulheres e crianças.
O Estado da ocupação israelense trata comunicação como parte crucial de sua política de propaganda de guerra, em detrimento dos direitos da liberdade de imprensa, assim como do direito do público a transparência e informação.
O governo brasileiro do presidente Luiz Inácio Lula da Silva reconhece o genocídio em Gaza — assim investigado pelo Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), sediado em Haia. Contudo, apesar de ataques do lado israelense e reivindicações de massa, procrastina a ruptura de relações com o Estado ocupante.