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Arte e transformação: Um convite para a 19ª Mostra Mundo Árabe de Cinema

Cena do filme Inshallah, um menino, dirigido por Amjad Al Rasheed, parte da programação da 19ª Mostra Mundo Árabe de Cinema, com exibições no CineSesc — São Paulo [Divulgação]

A 19ª Mostra Mundo Árabe de Cinema, promovida pelo Instituto de Cultura Árabe (ICArabe), ocorrerá entre os dias 29 de agosto a 4 de setembro, na modalidade presencial, no CineSesc (Rua Augusta, 2075), em São Paulo, com abertura nesta quinta-feira (29), às 20h. A Mostra, idealizada por Soraya Smaili, com curadoria de Arthur Jafet, já marca a cena cultural de São Paulo há 19 anos, aproximando a população paulistana da cultura árabe e de seus aspectos sociais, políticos e culturais. A edição deste ano homenageia e celebra os 20 anos de trajetória do Instituto da Cultura Árabe e o centenário de Aziz Ab´Saber, geógrafo, cientista e intelectual brasileiro falecido em 2012 e presidente de honra do ICArabe.

O Instituto de Cultura Árabe é uma instituição cultural que procura integrar, estudar e promover as várias formas de expressão da cultura árabe, antigas e contemporâneas, e encorajar o reconhecimento de sua presença na sociedade brasileira. Ao completar 20 anos em 2024, o Instituto, em comemoração, realiza a 19ª Mostra de Cinema Árabe que traz filmes inéditos para a cena cultural paulistana.

Segundo Arthur Jafet, curador da Mostra: “Em um momento de turbulência no Oriente Médio e protestos antiguerra em espaços públicos e universidades dos Estados Unidos, nossa 19ª Mostra Mundo Árabe de Cinema é mais contemporânea e mais significativa do que nunca. Destacando novos trabalhos dos cineastas mais ousados do Oriente Médio e Norte da África, a série de filmes ilumina a diversidade e a complexidade do mundo árabe moderno”.

Em 2022, a Mostra Mundo Árabe de Cinema teve como tema “O Mundo Fala E Vê Em Árabe”, refletida na escolha de dez filmes inéditos, entre eles, Caixa de Memórias (Memory Box), de Joana Hadjithomas e Khalil Joreige, lançado no Festival Internacional de Berlim. O filme explora temas como memória, identidade e a influência do passado no presente, à medida que a protagonista revive e reflete sobre a sua história e a história de sua família, revelando as complexidades da vida durante e após a Guerra Civil libanesa (1975–1990).

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Em sua última edição, em 2023, a Mundo Árabe de Cinema teve como filme de abertura a produção franco-libanesa Ventre Materno (La Nuit du Verre D’eau), dirigida por Carlos Chahine.

A mostra deste ano traz 11 filmes de países e gêneros diversos, que exploram variadas temáticas do mundo árabe, aproximando o público daquela realidade e possibilitando a conscientização do espectador sobre assuntos importantes, a partir de pontos de vistas distintos. Entre as obras: O Professor, LYD, A Leste do Meio-Dia, A Mãe de Todas as Mentiras, Inchallah, um menino, Beirut Hold’em, O Poeta Rei, Retorno à Alexandria, Um Fardo, Imortais e À Beira do Vulcão.

O evento deste ano contará também com um debate no domingo, 1º de setembro, às 19h05, sobre o filme O Fardo, em uma mesa redonda com a participação de Renan Quinalha, coordenador adjunto do Núcleo Trans da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e Sâmia Bomfim, deputada federal pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). A mediação é de Laura Di Pietro, diretora da Editora Tabla.

Os filmes trazem de maneira ilustrativa a construção da realidade do mundo árabe.  A arte é fundamental para a sociedade não apenas porque reflete e questiona a realidade, mas também porque inspira mudanças, promove o entendimento intercultural e enriquece a vida humana com criatividade e profundidade emocional. Como um de seus frutos mais recentes, os filmes são capazes de refletir o espírito de seu tempo que, por meio das diversas possibilidades das lentes e dos olhares de seus diretores, permitem uma aproximação entre mundos e realidades distantes, mas que são perpassadas por questões universais da vida humana.

A filmografia foi utilizada, ao longo da história ocidental, para infundir entre a população a validação de valores civilizacionais e projetos políticos, mediadas por narrativas clássicas alicerçadas na imagem do herói. É muito comum ver na produção cinematográfica estadunidense, dos anos 1930, temas como a “expansão para o Oeste”, marcado por filmes do gênero de faroeste, nos quais o herói — homem branco, cristão, estadunidense — traria a civilização às tribos originárias, que frequentemente contestavam o avanço civilizatório, como em No Tempo das Diligências (Stagecoach, 1939), dirigido por John Ford.

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Durante as décadas seguintes viu-se esse modelo sendo transbordado para outros temas e contextos. Em meio à Guerra Fria, Hollywood foi utilizada como um bunker anticomunista, a fim de se construir uma narrativa de superioridade moral e civilizacional contra figuras, lideranças e países para além da Cortina de Ferro.  Atualmente, essa arma de moldar almas e consciências tem sido utilizada fortemente para construir uma nova alteridade a ser destruída: os árabes e sua cultura. Para verificar esta tese, basta olhar para filmes hollywoodianos das últimas décadas, incluindo Guerra ao Terror (The Hurt Locker, 2008) e obras de super-heróis, como Homem de Ferro e Homem de Ferro 2 (Iron Man, 2008 e 2010), nos quais as figuras estereotipadas dos vilões recaem ao Oriente Médio, bem como aos árabes.

É contra as caricaturas criadas sobre os árabes aqui no Ocidente que a 19ª Mostra de Filmes Árabes deseja trabalhar. Segundo Soraya Smaili, a Mostra Mundo Árabe de Cinema é um momento de reflexão, de questionar os estereótipos frequentemente associados ao mundo árabe de maneira geral. Neste sentido, o evento representa uma oportunidade de expandir horizontes, ao compreender, ao passo da envoltura das tramas, as dinâmicas do mundo árabe, como a complexidade da construção social e descrição dos reais problemas sociais, catalisados pela ocupação e agressão colonial.

O Ocidente carrega ainda uma visão profundamente enviesada sobre o mundo árabe, ao condenar sua cultura, sua religião e suas práticas. As mulheres árabes são um exemplo da profunda fetichização do Oriente pelo Ocidente. Existe, sim, opressão sobre as mulheres árabes, assim como existe em todos os cantos do globo, mas o foco, em nosso caso, é a desmistificação ocidental de que as mulheres no Oriente não possuem quaisquer direitos. Um exemplo de que essa realidade pode ser mais complexa do que o simples discurso propagado é o filme Inshallah, um menino, de Amjad Al Rasheed, que conta a história de uma viúva que luta por sua sobrevivência e de sua filha na batalha pela herança do marido.

A realidade é que o cenário do mundo árabe não é distinto daquele em todos os países colonizados no globo: carregado de complexidades que não cabem em pequenas caixas. É desta forma que a 19ª Mostra Mundo de Cinema se demonstra como um convite à população paulistana para expandir seus horizontes acerca do tema. A partir do entendimento da real complexidade das questões sociais, políticas e culturais do mundo árabe, o espectador também é convidado a questionar o mundo ao seu redor. De fato, a 19ª Mostra Mundo de Cinema se demonstra não apenas como elemento de enriquecimento artístico, mas também como objeto de transformação política.

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19ª Mostra Mundo Árabe de Cinema

Onde:

CineSesc — Rua Augusta, 2075, Cerqueira César, São Paulo

Telefone: (11) 3087-0500 — sescsp.org.br/cinesesc

Abertura:

29 de agosto (quinta-feira), às 20h, com o filme O Professor (em sessão gratuita — ingressos retirados a partir das 18h30 na bilheteria)

Em cartaz: De 29 de agosto a 4 de setembro

Programação: https://mundoarabe2024.icarabe.org/

Mais informações: www.icarabe.org

Realização: Instituto da Cultura Árabe (ICArabe)

Correalização: Sesc — São Paulo

Patrocínio: Câmara de Comércio Árabe-Brasileira, Casa Árabe e Instituto do Sono

Apoio: Unifesp — Cátedra Edward Said de Estudos da Contemporaneidade — Pró-Reitoria de Extensão e Cultura, Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa da Unifesp; CineFértil; e Editora Tabla

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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