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Soldados israelenses em Gaza ostentam má conduta

Mês da Herança Nativa Americana nos EUA: Ecos do colonialismo na Palestina histórica

Ao chegar na costa americana, colonos europeus se encontram com os povos originários, em 1683, pintura por J.L.G. Ferris [Universal History Archive/UIG via Getty Images]

A história é conhecida de todos nós: uma população indígena que vive em sua terra por incontáveis gerações é expulsa à força, assassinada e explorada nas mãos de colonizadores. Os colonos chegam a se vangloriar como “pioneiros” ao edificar “assentamentos” e marginalizar sistematicamente as comunidades nativas, expropriá-las de qualquer autonomia, roubar seus recursos — como água, insumos energéticos e outras riquezas – e destruir não apenas seu extenso tecido cultural, como seu modo de vida.

Mesmo sem especificar nomes e localidades, a descrição cabe ao genocídio cometido contra os povos nativos americanos para estabelecer assim, o mais antigo Estado colonial de assentamento: os Estados Unidos da América. Contudo, é a mesma história para as mais diversas comunidades indígenas ao redor do mundo, incluindo os cidadãos nativos da Palestina histórica — seja na Cisjordânia e Faixa de Gaza, seja no território designado Israel.

Passamos de dois meses da brutal ofensiva militar israelense contra Gaza, com apoio incondicional dos Estados Unidos, deixando 20 mil mortos — em grande maioria, mulheres e crianças. Oito mil pessoas estão desaparecidas sob os escombros e centenas mais são mortas diariamente. Joe Biden e seu governo, no entanto, insistem em propagar desinformação a fim de ofuscar a verdadeira face do genocídio israelense em Gaza e sua inerente cumplicidade. À medida que políticos em Washington buscam justificar o injustificável, testemunhamos o que realmente acontece por meio de incontáveis relatos em primeira pessoa, incluindo imagens e vídeos registrados em campo, que documentam a destruição e a devastação imposta ao povo palestino.

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Enquanto somos consumidos pela catástrofe que se desenrola em Gaza e pelo fato de que o contribuinte americano tragicamente financia o massacre, quase deixamos passar despercebida a ironia de que, em casa, nos Estados Unidos, novembro foi o Mês Nacional de Herança Nativa Americana. Segundo o governo, a ideia é reconhecer a história e a contribuição das comunidades originárias no tecido multicultural da sociedade americana. No fim de outubro, o presidente Biden — enquanto promovia os esforços de guerra e o genocídio em Gaza — reiterou seu compromisso em “apoiar a soberania das tribos, manter a confiança e as responsabilidades do governo e trabalhar em parceria com as nações indígenas para avançar na prosperidade, dignidade e segurança dos povos”.

A hipocrisia de sua declaração é desconcertante, dado que o governo dos Estados Unidos mantém seu apoio a Israel, incondicionalmente, em sua destruição das comunidades originárias da Palestina, enquanto celebra a cultura e as tradições dos nativos americanos. Os paralelos entre o roubo de terras na América — exemplificado pelo apagamento deliberado de seus marcos patrimoniais e esgotamento de seus recursos naturais — e as ações israelenses na Palestina, incluindo a destruição de oliveiras e a expulsão de camponeses de suas terras, demonstram um padrão compartilhado de marginalização, expropriação e exploração ambiental. Nos dizem que Israel tem o direito a suposta “autodefesa”, mas vale questionar que “defesa” é essa contra árvores centenárias, padarias comunitárias ou bebês prematuros em incubadoras.

Como estudantes cujas histórias familiares são impactadas diretamente pelo colonialismo e pela ocupação, reconhecemos que a terra, o povo e o período histórico podem ser diferentes, mas a realidade é comum, os traumas são compartilhados e a luta por libertação e justiça não tem fronteiras.

As transgressões de Israel em Gaza e na Cisjordânia ecoam injustiças históricas impostas pelo Estado colonial de assentamentos dos Estados Unidos sobre os povos nativos americanos. O colonialismo de assentamento, como aponta o pesquisador Patrick Wolfe, opera na “lógica de eliminação”, ao buscar exterminar os coletivos indígenas e sua autonomia política. A conquista imperialista da terra e de seus recursos buscou a limpeza étnica dos povos originários das Américas,  resultando no assassinato de cerca 56 milhões de pessoas ao longo dos séculos. De forma similar, o sionismo — doutrina supremacista e fundacional do Estado de Israel, que reivindica a hegemonia da “nação judaica” na Palestina histórica — foi usada para justificar a Nakba, ou “catástrofe”, com a destruição de 500 aldeias e cidades palestinas e expulsão de mais de 750 mil pessoas de suas terras.

O legado da Nakba persiste — manifesto no roubo continuado de propriedades palestinas, perda irreparável de vidas, negação prolongada dos direitos legítimos de retorno dos refugiados e seus descendentes e, agora, a ofensiva a Gaza. As diretivas militares de Israel e a retórica de desumanização contra os palestinos certamente nos recorda da estratégia adotada por colonos e conquistadores para subjugar os povos nativos nas Américas. Massacres e fome como arma são elementos comuns. Na obstinada execução de crimes de lesa-humanidade, repousa o ataque deliberado e ininterrupto contra instalações e estruturas vitais — incluindo a imposição de um bloqueio total contra o território costeiro —, de modo a desmentir qualquer suposto compromisso em proteger civis.

Meses que celebram o patrimônio e a cultura dos povos diversos que compõem nossas comunidades não bastam, nem de longe, para reconhecer as injustiças e reparar a devastação e o genocídio das civilizações originárias. Muito pelo contrário, feriados como esses são ainda gestos simbólicos de sociedades inclinadas ao colonialismo e ao imperialismo que reforçam as estruturas de poder e buscam absolver o legado dos colonos e seus cúmplices da contínua marginalização das comunidades indígenas. A aparente contradição do presidente Biden se esmaece por seu reconhecimento meramente superficial dos povos nativos, ao mascarar políticas repressivas e a enorme complexidade das macroestruturas nos Estados Unidos e além.

O enfoque de novembro nas “contribuições” dos povos indígenas da América agrega uma nova camada à contradição de Washington, ao sugerir que os valores humanos são contingentes a quem produz e quando produz. Nenhum gesto político é capaz de compensar a comunidade nativa americana por tudo que perdeu com a colonização estrangeira. Devolver as terras e promover reparações e indenizações são fundamentais — contudo, não bastam. É preciso garantir que atrocidades não voltem a ocorrer, não importa a quem. Entretanto, o governo americano e seus líderes mais uma vez colaboram com o apagamento de populações nativas; desta vez, em Gaza e no restante da Palestina ocupada.

Para honrar verdadeiramente os povos nativos das Américas, nós, cidadãos americanos, temos de nos engajar com suas comunidades para compreender a devastação do colonialismo de assentamento que lhes foi imposta para jamais permitir a reincidência.

Nossos líderes eleitos devem ser responsabilizados e denunciados por sua hipocrisia em celebrar o Mês de Herança Nativa Americana enquanto promovem, com a mesma desfaçatez, o genocídio do povo originário da Palestina histórica.

Afinal, as táticas adotadas pela agressão israelense contra os palestinos de Gaza e da Cisjordânia são as mesmas que edificaram a pedra angular dos Estados Unidos da América. Devemos reconhecer tais fatos e soar o alarme quando padrões de desumanização e genocídio se repetem, particularmente quando somos financeira e politicamente cúmplices — mesmo que aconteçam distantes dos estudos de caso de nossa vã academia.

Devemos intervir antes que seja tarde demais. Devemos apoiar e reivindicar um cessar-fogo permanente. Nunca mais é nunca mais para todos. Devemos honrar o Mês de Herança Nativa Americana ao dar fim a mais essa opressão colonial e seus assentamentos.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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