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Al-Biruni: uma das mentes científicas mais brilhantes de todos os tempos

Estátua de Abu Rayhan al-Biruni em Park-e Laleh, Teerã, Irã, em 25 de abril de 2013 [David Stanley/Flickr]

Um dos eruditos mais importantes e uma das mentes científicas mais brilhantes de todos os tempos e civilizações é o polímata muçulmano Al-Biruni. Foi contemporâneo do grande Avicena (Ibn Sina), com o qual teve uma breve amizade, marcada pela troca de conhecimentos eruditos. Ambos nasceram no atual Uzbequistão, no final do século X da era cristã, e morreram em meados do século XI, no atual Irã. Abu Rayhan Mohammad ibn Ahmad Al-Biruni nasceu no ano de 973 e morreu no ano de 1048, após uma vida intensa marcada pela dedicação à sabedoria, erudição e busca pelo conhecimento. A sua dedicação à busca pelo conhecimento tornou-se lendária. Dizem os seus biógrafos que, até no seu leito de morte, Al-Biruni discutiu com um erudito sobre uma questão de teologia e jurisprudência.  Ao ser questionado sobre como ele fazia esse tipo de questionamento no leito de morte, Al-Biruni respondeu que seria melhor morrer sabendo a tal questão teológica levantada do que morrer ignorando-a.

Al-Biruni foi um nobre exemplo nas culturas islâmica e universal da busca do conhecimento pelo conhecimento, e não pelas vantagens e lucros que dele podem advir, sejam eles status, honrarias, dinheiro ou outros benefícios mundanos. Ele pensava que estava bem pago pelo conhecimento, e dispensava qualquer outra recompensa ou reconhecimento. Assim como todos os grandes eruditos, sábios, cientistas e polímatas que a cultura islâmica no seu apogeu produziu, Al-Biruni, que tinha a alcunha de Abou Al-Raihan, escreveu a maior parte da sua obra na língua árabe, a língua da ciência e erudição na maior parte da Idade Média no mundo todo. Mas vale, aqui, citar que Al-Biruni foi um exímio políglota, e dominava além do árabe e persa (a sua língua materna), o sânscrito, o hebraico, o grego e o siríaco. Isso lhe permitiu aumentar consideravelmente a sua erudição e traduzir importantes obras hindus para o árabe.

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Al-Biruni em selo postal da União Soviética (URSS), em 1973 [Wikimedia]

A importância de Al-Biruni foi reconhecida na era contemporânea, tanto no Ocidente quanto no Oriente. Uma das crateras vulcânicas na superfície da Lua recebeu o nome deste grande polímata. Um asteroide recebeu o nome de Al-Biruni 9936, em homenagem a este grande vulto do Islã. Em 1974, a União Soviética na época, produziu um filme sobre a vida de Al-Biruni. Isso se deve ao fato de Al-Biruni ter nascido na República de Uzbequistão, que na época fazia parte da União Soviética. Além de tudo isso, Al-Biruni foi considerado por certos orientalistas e arabistas ocidentais como a mente científica mais genial e brilhante de toda a História da Humanidade. Vale lembrar que o nome arabista e orientalista é dado aos eruditos, sobretudo ocidentais, que dedicam-se ao estudo das culturas árabe e islâmica.

Excepcional e genial polímata que foi, Al-Biruni era astrônomo, geógrafo, historiador, antropólogo, físico, matemático, filósofo, tradutor, farmacêutico, além de ter estudado medicina e escrito obras de crítica literária. Em todas estas áreas ele teve contribuições importantíssimas. Por exemplo, Al-Biruni, quase cinco séculos antes das grandes navegações e da descoberta das Américas, previu que o hemisfério ocidental tinha um continente habitado sobre o qual o velho mundo nada conhecia. Ele sabia que a terra era redonda e produziu um mapa-mundi bem preciso. Lembrando que na época o sul ficava na parte de cima dos mapas e o norte na parte de baixo, ao contrário do que ocorre hoje. Este fato é um reflexo de onde ficam os centros de poder mundial em cada período.

al-Biruni em um selo postal iraniano de 1973, em comemoração do seu milésimo aniversário  [Ali Azargin/ Wikimedia]

No campo da antropologia, a contribuição de Al-Biruni foi ter praticamente fundado o estudo erudito da cultura indiana. Ele escreveu uma importante obra sobre a Índia, que trata da cultura, hábitos e história dos hindus. Além disso, Al-Biruni, que aprendeu o sânscrito, debruçou-se sobre as obras de importantes sábios e eruditos indianos, tendo traduzido para o árabe algumas das importantes contribuições dos hindus para a cultura universal. A longa estadia de Al-Biruni na Índia, que durou algumas décadas, permitiu-lhe reunir os conhecimentos necessários para escrever sobre a cultura hindu de uma maneira erudita e enciclopédica.

A exemplo de outros grandes polímatas e eruditos da cultura islâmica, Al-Biruni escreveu uma extensa obra que conta com mais de cem títulos. As duas áreas do conhecimento que contaram com a sua maior dedicação foram a astronomia e matemática, sendo que a maior parte de sua extensa obra versa sobre estas duas áreas do conhecimento. É importante aqui citar que o estudo da astronomia, matemática, geografia e geologia, na cultura islâmica, era estimulado pela determinação da direção para a Meca, pelo horário das orações e pelas importantes datas do calendário lunar islâmico. As orações dos muçulmanos devem dirigir-se para Meca, a cidade mais sagrada do Islã e devem ser realizadas em determinados horários do dia, totalizando cinco orações diárias. O caso de Al-Biruni não foi diferente, tendo escrito um livro sobre como determinar a direção para Meca.

No campo da física e matemática, Al-Biruni fez importantes estudos de mecânica, hidrodinâmica, trigonometria e geometria, tendo escrito importantes obras em todas estas áreas. Não podemos esquecer também a gigante contribuição de Al-Biruni na área de farmácia e farmacologia, tendo escrito uma obra enciclopédica sobre os fármacos disponíveis na época. A metalurgia foi, também, uma área que também recebeu a atenção e contribuição eruditas de Al-Biruni. As suas obras no campo da historiografia revelaram um exímio historiador, que escreveu sobretudo a respeito da história indiana

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 A vasta erudição de Al-Biruni estendeu-se para as religiões, campo no qual teve a sua contribuição no estudo comparativo das religiões. Embora ele tenha sido um muçulmano devoto e conhecedor do Alcorão e da tradição profética, a sua imensa cultura permitiu-lhe ter um olhar mais tolerante sobre as outras religiões e doutrinas. Ele considerava que todas as religiões convergem para a mesma essência, por isso todas sem exceção merecem respeito. Este olhar tolerante e desprovido de preconceito mostra o real espírito da cultura islâmica, que na época do seu auge civilizacional e imperial, tratava com tolerância e benevolência as diversas etnias e religiões sob o seu domínio. Isso era facilitado pelo mandamento islâmico de busca do conhecimento e da erudição, o que acabava destruindo barreiras e erguendo pontes entre etnias, culturas e religiões.

Destruição do Templo de Jerusalém no livro The Remaining Signs of Past Centuries, de Abu al-Rayhan al-Biruni, pintado em Tabriz por volta de 1307 aC. Reproduzido no livro Le peinture persane, de Gray Basil, 1961 [Michel Bakni/Wikimedia]

Os abundantes exemplos de eruditos, sábios, polímatas e cientistas islâmicos, como o exemplo esplêndido de Al-Biruni, revelam o quão profunda e importante foi a contribuição islâmica para a cultura universal. Ao lembrarmos grandes vultos como Al-Biruni, não estamos em busca de um diletantismo cultural ou curiosidade intelectual. Estamos esmerando-nos em dois pontos: o primeiro é lançar luz sobre o inestimável e inegável legado islâmico para a cultura universal; o segundo é tentar mostrar aos muçulmanos e ao mundo que é possível aos muçulmanos contemporâneos seguirem os exemplos dos seus ancestrais. Uma cultura que deu à Humanidade nomes como Avicena (Ibn Sina), Averróes (Ibn Rushd), Al-Biruni e Ibn Arabi, é capaz de voltar a ter lugar de destaque e honra no mundo. Basta os muçulmanos atuais buscarem inspiração nos seus grandes e nobres ancestrais.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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