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AIPAC, o centro nevrálgico do lobby sionista dentro do Império

Em ordem, o então vice-presidente dos EUA, Joe Biden, e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu,em declarações conjuntas à imprensa em Jerusalém, em 9 de março de 2016. [Debiie Hill/AFP via Getty Images]

O presente artigo aborda a mais poderosa estrutura de lobby permanente da entidade sionista, também conhecida como Estado de Israel. Trata-se do Comitê de Relações Públicas Israelense-Americano (AIPAC na sigla em inglês), fundado em 1963. Não se trata de segredo nem nada por estilo, considerando o grau de exposição dos lobistas e a análise detalhada no livro “The Israel Lobby and U.S. Foreign Policy, escrito por John Mearsheimer e Stephen Walt” (lançado em agosto de 2007, entrou na lista dos mais vendidos pelo jornal New York Times, Farrar Straus Giroux editora, 484 páginas).  A obra escrita por dois consagrados cientistas políticos e professores de Relações Internacionais é parte da literatura consolidada da área e presença permanente em think tanks imperialistas. O livro demonstra que o jogo de mútua reciprocidade esconde até dos EUA o seu “interesse nacional” pelo jogo de pressão de Tel Aviv e seus institutos de apoio.

O texto que apresentamos neste portal é parte de uma pequena coletânea. Recentemente publicamos artigos que abordavam o desenho do lobby sionista dentro do império anglo saxão estadunidense, herdeiro do imperialismo britânico, com vocação cruzada e invasora do Oriente Médio. Essa série iniciou com um relevo da “aliança essencial” em artigo que abordava as principais entidades apoiadoras do Apartheid na Palestina Ocupada, sendo que de cinco, quatro operam a partir dos EUA . Na sequência fomos destrinchando os nós do sionismo difuso da Liga Anti Difamação, defensora do imperialismo sob o manto do “combate ao antissemitismo” ( Curiosa correlação, pois a dita Liga combate o antissemitismo de semitas autênticos contra invasores eurojudeus. Dessa forma, ou se trata de hipocrisia ou estão do lado errado da história (a segunda hipótese é a comprovadamente acertada). Posteriormente, nossa análise se debruçou sobre o lobby militar propriamente dito, estudando as estruturas explícitas do JINSA, o Instituto Judaico de Segurança Nacional da América. Novamente, o inimigo joga na confusão proposital. O termo correto seria “instituto sionista”, considerando que há judaísmo por fora do sionismo e, inclusive, de origem árabe e semita.

[Charge Carlos Latuff]

Ao trazer o AIPAC para o debate público brasileiro, vamos de encontro a verdadeiras aberrações, como as falas do deputado federal Eduardo Bolsonaro. O filho “03” do mais sionista dos presidentes fora de Israel, recentemente afirmou que o país sofreu bombardeios e massacres por parte de forças de defesa do povo palestino a partir de Gaza, durante a heroica resistência na Operação Espada de Jerusalém . Na reunião da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional (CREDN), em julho de 2021, Eduardo Bolsonaro recuou ao ver a MSC  749/2019 (o famigerado acordo entre Brasil  e Israel, de cooperação em áreas sensíveis), acusando os colegas de “um golpe” para retirar a matéria da pauta, alegando que a não apreciação seria pressão de terrorista ou preconceito contra a comunidade judaica.

Nada poderia ser tão semelhante quanto a presença pró-Israel no Congresso dos Estados Unidos. Neste artigo traduzido ao português (prévio ao livro), Mearsheimer e Walt demonstram o poder classificado como “moral e constrangedor” do lobby sionista:

“E o valor estratégico de Israel não é a única questão. Seus apoiadores também argumentam que ele merece um apoio irrestrito porque é fraco e está cercado por inimigos; é uma democracia; o povo judeu foi vítima de crimes no passado e por tanto merece tratamento especial; e a conduta de Israel tem sido moralmente superior à de seus adversários. Analisados em detalhe, nenhum desses argumentos é convincente. Há um forte argumento moral para apoiar a existência de Israel, mas ela não está em risco. Vista objetivamente, sua conduta passada e presente não oferece nenhuma base moral para privilegiar Israel em relação aos palestinos”. .

LEIA: A permanente acusação de antissemitismo como arma do Apartheid

É justo o oposto do que afirma o AIPAC. Na sua Agenda de Políticas, os lobistas afirmam com todas as letras: “A AIPAC defende assistência de segurança vital a Israel e o desenvolvimento de programas cooperativos de defesa antimísseis com os Estados Unidos, que permitem a Israel se defender por si mesmo. Trabalhamos para acabar com o isolamento de Israel em fóruns internacionais e promover a cooperação estratégica entre os Estados Unidos e Israel em setores-chave, incluindo tecnologia, energia, segurança cibernética, segurança de fronteira, compartilhamento de inteligência e agricultura.” .

Na lista de melhores empresas para se trabalhar na capital dos EUA, o prestigioso jornal Washington Post classifica o AIPAC na 33ª posição dentre as de médio porte, com 159 empregados a tempo completo, sem contar milhares de colaboradores e apoios de diversos tipos. No ranking do setor sem fins lucrativos, o lobby dos colonialistas atinge a primeira posição ). A capilaridade do Comitê é grande e reforçada tanto pela paranoia anti-árabe e islamofóbica, como pelos vínculos multiculturais com o pentecostalismo conservador. Na Convenção Anual, com 7000 presentes, o lobby afirma ter representações além de pluriétnicas, bipartidárias (Democratas e Republicanos) e dos 50 estados do país . Em um exercício de franqueza extrema, demonstram a parceria estratégica Israel-EUA dentro da lista de vídeos “fazendo lobby em um minuto”.

O orçamento do AIPAC desde o governo Obama gira em torno de 60 milhões de dólares. As doações mantém um padrão de 140 milhões ano e, no ciclo eleitoral, fica em torno dos 22 milhões de dólares (os afiliados no lobby são cerca de 100 mil pessoas, conforme o link . Em 2018, as despesas diretamente gastas com lobby foram de  $3,518,028. Ainda assim, a “concorrência” é grande, porque haveria outros 31 Comitês de Ação Política (PACs na sigla em inglês) atuando a favor do Apartheid na Palestina Ocupada.

Para ganhar dos concorrentes, o AIPAC tem um braço fundamental: as viagens de congressistas para Israel, através da Fundação Educacional Americano-Israelense (aiefdn.org), cujo registro aparece como caridade. Teriam sido gastos US $ 16 milhões em visitas de mais de 1.400 legisladores e seus funcionários, desde 2000 até 2019, de acordo com registros de viagens do Congresso . A fundação, que também capta recursos por conta própria, é controlada pelo lobby, de acordo com declarações de impostos das duas entidades.

LEIA: Lobby pró-Israel teme que o apoio possa se autodestruir sobre o bombardeio de Gaza

A forma de trabalho é muito parecida. No Brasil, Eduardo Bolsonaro viajou seguidas vezes para a Palestina Ocupada, incluindo uma inócua visita durante a pandemia. Mesmo que de forma tosca, reforça o lobby sionista nacional, imitando o poderoso AIPAC e grupos afins. Já nos EUA, são tantas as formas de pressão sobre o Congresso da superpotência que mesmo o poderoso AIPAC se vê obrigado a disputar espaço entre concorrentes com propósito semelhante. Enquanto o orçamento dos Estados Unidos, em especial o de “defesa”, estiver diretamente vinculado ao Apartheid Colonial, a única “previsibilidade” possível na região é a heroica resistência do povo palestino e seus aliados.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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