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Não ignorem a luta palestina

Manifestante com cartaz ‘Vidas Palestina Importam’ durante protesto em Berlim, Alemanha, 19 de maio de 2021 [John MacDougall/AFP/ Getty Images]
Manifestante com cartaz ‘Vidas Palestina Importam’ durante protesto em Berlim, Alemanha, 19 de maio de 2021 [John MacDougall/AFP/ Getty Images]

Se há um breve sopro de esperança a surgir dos horrores infligidos por Israel aos palestinos, no último mês, este repousa em um novo sentimento de união entre o próprio povo palestino. Além disso, o movimento de solidariedade global também ganhou novo impulso. Em nossas ruas, em nossas redes sociais e — sim — mesmo na grande imprensa, a visibilidade da luta palestina nunca foi tão grande.

Hoje, porém, as coisas inevitavelmente se assentaram. Movimentos vêm e vão. A consciência cresce devagar ao longo de meses, anos, décadas e — no caso de lutas de longo prazo por liberdade, como a causa palestina — até mesmo séculos.

O movimento Black Lives Matter (Vidas Negras Importam), por exemplo, teve início em 2014, após o jovem afro-americano Michael Brown ser baleado e morto por um policial branco na cidade de Ferguson. Esta iniciativa também desenvolveu-se em ondas, à medida que ativistas atraíam atenção a mais e mais casos de injustiça contra a população negra, sobretudo jovens, vítimas da brutalidade e do racismo policial.

A última grande onda do Black Lives Matter alcançou seu ápice no último ano, após a morte de George Floyd. Neste mês, Derek Chauvin foi condenado a 22 anos e meio de prisão pelo assassinato. Na ocasião, o então policial aplicou força excessiva ao deter Floyd por um suposto crime sem qualquer gravidade. Chauvin ajoelhou-se sobre a garganta de Floyd por quase nove minutos e todo o assassinato foi registrado em vídeo por testemunhas.

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É um fato infeliz na história que somente após casos de violência chocante a injustiça é de fato exposta ao público, para que todos e todas vejam; apenas então, surge uma reação poderosa o bastante para de fato conquistar alguma mudança.

Também é assim na Palestina ocupada. É incomum ver a grande mídia prestar atenção aos palestinos até que reajam efetivamente à violência de Israel.

A expulsão de palestinos de bairros de Jerusalém Oriental, como Sheikh Jarrah, por autoridades da ocupação israelense, denunciada por ativistas nos últimos meses, não é nada novo. De fato, como destacam muitos ativistas, toda a Palestina é Sheikh Jarrah, de uma forma ou de outra.

Foram os eventos em Jerusalém que culminaram na última ofensiva militar israelense contra a população civil da Faixa de Gaza. Ao menos uma vez, o massacre de onze dias perpetrado por Israel em maio pareceu bastante claro aos olhos de todos.

A escalada de tensão sobre as expulsões alimentou ainda maior violência de extremistas israelenses. Colonos kahanistas passaram a rondar as ruas de Jerusalém aos gritos de “Morte aos árabes”, em busca de nativos e residentes palestinos a serem agredidos. Ao longo dos anos, forças israelenses avançaram gradativamente também contra muçulmanos na Mesquita de Al-Aqsa, flagrante violação de todas as normas de liberdade de culto e moralidade básica, sem sequer mencionar o valor simbólico da religião.

Foi a gota d’água. As facções armadas em Gaza, lideradas pelo Hamas, decidiram responder à agressão israelense em Jerusalém. Sua tecnologia de foguetes de longo alcance — ainda artesanal, mas em desenvolvimento — tornou isso possível. Pela primeira vez, mísseis da resistência foram capazes de sobrevoar todo o território ocupado da Palestina histórica

A subsequente guerra de onze dias resultou em vitória à resistência palestina. A marcha anual de “Morte aos árabes” em Jerusalém foi postergada, naquele primeiro momento. Eventualmente, foi realizada, no início de junho, embora bastante restrita, à medida que extremistas judeus foram proibidos de entrar na Cidade Velha de Jerusalém.

Mais de 250 palestinos foram mortos em Gaza, incluindo 67 crianças, mas os palestinos ainda consideram o resultado da guerra como uma proeminente vitória — com boa razão. As condições objetivas de êxito para uma guerrilha nativa não são as mesmas que as demandas de uma entidade estrangeira, militar e invasora.

A resistência foi capaz de submeter um duro custo ao colonizador e impor certo fator de dissuasão. A expulsão dos palestinos de Jerusalém foi adiada pelo judiciário da ocupação. Tropas israelenses não conseguiram entrar em Gaza, dado que os comandantes sabiam que muitos voltariam em sacos fúnebres, caso ao menos voltassem. Políticos da extrema-direita israelense, como Itamar Ben Gvir, queixaram-se que Yahya Sinwar, líder do Hamas em Gaza, foi contemplado com a decisão sobre quem poderia ou não marchar em Jerusalém, após a procissão de “Morte aos árabes” ser limitada por receios de sua repercussão.

Mas agora, com a imprensa global distanciando-se novamente da Palestina, a ameaça de expropriação volta a pairar sobre as famílias palestinas. Israel retomou a demolição de casas e lojas palestinas no bairro de Silwan, em Jerusalém ocupada. A decisão judicial há muito adiada sobre Sheikh Jarrah deve sair em breve.

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Os palestinos não esperam qualquer justiça das cortes racistas da ocupação. Cabe a nós reaver a visibilidade palestina e estabelecer responsabilidade sobre os crimes israelenses, ao impor assim um novo curso na história.

Para nós no Ocidente, significa conduzir campanhas e manifestações e promover o movimento de Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) contra o regime de apartheid imposto pelo estado israelense contra o povo palestino. Agora, mais do que nunca, a mensagem é simples: não ignorem a luta palestina.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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Palestina: quatro mil anos de história
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