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Me negaram patentes internacionais por ser refugiado palestino

Entrevista com o inventor Amer Darwich (Parte 1)

Amer Darwich é inventor palestino, cujo nome surgiu nos últimos anos, especialmente depois de inventar, há um mês atrás, um dispositivo de higienização ligado a um smartphone, auxiliar na prevenção à covid-19.

Como diz o filósofo americano William James: “A dor é a chave para a criatividade e o caminho do gênio”. Foi da dor do refúgio nos acampamentos palestinos no Líbano que a criatividade desse inventor palestino nasceu, e o gênio encontrou seu caminho através de suas invenções.

O que ocorre, porém, com as invenções de Amar, fala muito sobre o modo como palestinos refugiados são tratados no mundo.

No Líbano, ele obteve uma patente local. Mas internacionalmente, os sistemas de patente não querem registrar o invento em seu nome. Nesta entrevista em duas partes, Amer Darwich fala sobre suas invenções e a luta por reconhecimento e inserção no mercado internacional.

Quem é o inventor Amer Darwich ? Como ele chegou onde está hoje?

Para começar … Sou um refugiado palestino, venho da aldeia de Nahef, no distrito de Acca, no norte da Palestina ocupada. Moro no campo de refugiados palestinos de Beddawi no norte do Líbano. Tenho mestrado em administração de empresas pela Universidade Al Jinan e adoro ler a respeito de temas variados, sendo os mais importantes deles: mídia, política e história.

As invenções começaram comigo como um hobby e me acompanham desde muito jovem. Lembro-me da minha infância, quando os meus pais me traziam um pequeno brinquedo, eu não gostava de brincar tanto quanto gostava de desmontar, ver o que tinha dentro e analisar como funcionava. Por isso hoje entendo que os pais devem dar liberdade para seus filhos brincarem da forma que eles considerem adequada, de acordo com suas tendências e com a natureza de seu pensamento, a fim de desenvolver suas capacidades mentais e criatividade futura.

Até agora tenho três invenções patenteadas na República Libanesa. São patentes locais, que protegem os direitos intelectuais apenas dentro das fronteiras do estado libanês. Mas o que eu quero e o que estou procurando e acho necessário é obter patentes internacionais, para transferir as ideias dos protótipos para produção em escala comercial.

Tentei obtê-las, mas o racismo internacional me impediu, por ser refugiado palestino. O pretexto é de que a lei não dá ao refugiado palestino nenhuma patente internacional. Eles me pediram para patentear em nome de qualquer pessoa de outra nacionalidade , mas eu recusei esta proposta categoricamente, pois estes são os meus esforços, a minha luta nos últimos anos, e como pessoa, devo gozar de todos os direitos que os outros gozam, incluindo a minha propriedade intelectual, e nunca desistirei.

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Sua última invenção foi lançada em plena pandemia de covid-19?

Sim, em setembro passado anunciei minha nova invenção, a Corona Fighter 48, e obtive a patente libanesa. É um pequeno aparelho eletrônico instalado na parte de trás de smartphones e executa a tarefa de esterilização (higienização) dos usuários. De acordo com a GSMA, existem mais de 5 bilhões de pessoas usando smartphone em todo o mundo e, assim, poderíamos oferecer esse serviço a um número enorme de pessoas.

A principal tarefa desse dispositivo é a higienização, mas ele tem vantagens secundárias, pois pode carregar o telefone sem fio, além de fornecer um serviço de infravermelho para medir a temperatura das pessoas em qualquer lugar.

A patente libanesa para o Corona Fighter 48 (Foto de arquivo)

A patente libanesa para o Corona Fighter 48 (Foto de arquivo)

Empresas ou entidades entraram em contato com você para comprar esta invenção?

Quando anunciei o mais recente dispositivo Corona Fighter 48, um grande número de empresas ao redor do mundo me contatou para comprar este produto e obter direitos exclusivos. Fui procurado por empresas especializadas em esterilização da América, Canadá, Europa e alguns países árabes. Algumas empresas europeias me pediram mais de 10 mil unidades. Solicitei um prazo, porque continuo trabalhando sozinho, e não posso entrar no campo industrial sem apoio oficial de países industrializados ou grandes empresas, que me permitiriam lançar o aparelho de forma profissional e elaborada. Daí a necessidade das patentes fora do Líbano

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Isso provoca desânimo ou você tem novas criações em andamento?

Eu anunciei anteriormente, em 2018, que há vários projetos e invenções nos quais estou trabalhando, que virão à luz quando os experimentos forem concluídos. Mas espero anunciar a próxima invenção, que terá uma marca científica palestina muito importante na luta contra o aquecimento global, que tem efeitos sobre humanos, animais e natureza, causando incêndios em todos os países do mundo e neve derretida em grandes quantidades. Então, eu gostaria que houvesse uma marca palestina e árabe na luta contra esse fenômeno. Espero anunciar uma invenção para isso dentro de algumas semanas.

Você acredita estar contribuindo para a causa dos refugiados palestinos?

Vocês notarão que todas as minhas invenções trazem o número 48 em seu nome, e esta é uma mensagem que sempre gosto de enviar, aos filhos do povo palestino primeiro, e depois ao mundo inteiro: a de que a nossa conexão com nossa terra é permanente e a memória da Nakba permanecerá presente em nossas mentes. Que com as nossas realizações alcançaremos o caminho do retorno à nossa terra e, por mais opressora seja a ocupação, a terra continuará sendo nossa, a pátria será nossa e a Palestina espera muito de nós. Se todos dominarem suas profissões, seremos capazes de reconstruir nossa pátria após alcançar o retorno.

Gostaria de salientar que sou frequentemente convidado para conferências internacionais para compartilhar meus pensamentos e propostas, mas sempre sou esbarrado devido ao meu documento palestino, já que este documento não me permite mover livremente ao redor do mundo. Há um estranho racismo e é difícil lidar com isso em todos os países, infelizmente.

A entrevista continua.

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