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Matando os palestinos, por genocídio e por formalidades

13 de julho de 2025, às 05h00

Criança transferida ao mortuário do Hospital Nasser, após ataque de Israel, em Khan Younis, no sul de Gaza, em 23 de março de 2025 [Abdallah F.S. Alattar/Agência Anadolu]

Israel não exibiu de formalidade alguma ao cometer seu genocídio. A União Europeia, por outro lado, decidiu tratar o regime israelense com o grau máximo de formalidade, conveniente para que a entidade colonial de assentamentos ilegais conquistasse pouco a pouco seus intuitos de extermínio. 

Após novo relatório sobre o Acordo de Associação entre Israel e Europa, cujos detalhes mostram uma linguagem hesitante — de que há “indicativos de que Israel possa estar descumprindo suas obrigações de direitos humanos sob o Artigo 2” —, o bloco traçou mais uma postergação formal, com uma lista de medidas punitivas sobre os quais seus Estados-membros pouco devem concordar; sobretudo, em que nenhum dos quais de fato interrompe o genocídio ainda em curso na Faixa de Gaza.

As ações podem abranger ou não suspensão parcial ou plena do Acordo de Associação, sanções a ministros, oficiais e colonos israelenses, restrições de comércios, suspensão da cooperação científica e mesmo embargo de armas.

Noticiários atribulados, contudo, não tardaram a notar: “Embora muitas dessas opções tenham sido debatidas informalmente nos meses recentes, é a primeira vez que serão introduzidas oficialmente por escrito”.

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Resoluções das Nações Unidas também são determinações postas sobre o papel, assim como a lei internacional. Todavia, em vez de proteger os palestinos, mostraram-se agir em pleno prejuízo de seus direitos. Pois qual valor merecem meandros em resposta a Israel? 

As supostas medidas serão discutidas em 15 de julho, antes do recesso de verão para o bloco europeu. Enquanto diplomatas brancos adotam, provavelmente, noções arcaicas e ocidentalizadas de direitos humanos, os palestinos seguirão enfrentando os ataques, bombas e invasões de Israel, com seu território encolhendo cada vez mais, até que seja apenas uma gaiola tomada de massacres. É claro, porém, que nenhum desses cenários perturbará as férias de verão. O teatro das formalidades e da preocupação com o povo palestino, sobretudo em Gaza, voltará à pauta no calendário ocidental.

Israel tampouco se importa com apresentações formais por escrito. O que tanto estima de fato é a lei para além das linhas. Em junho, Kaja Kallas, chefe de política externa da União Europeia, ostentou passos do bloco para lugar nenhum: mudanças em campo e, somente então, maiores medidas. E enquanto a Europa tanto aguarda tais “mudanças em campo”, Israel as entregou a seu modo e bel-prazer: de fato, a chamada Fundação Humanitária de Gaza (GHF, em inglês) está pouco a pouco alterando a dinâmica tanto em território quanto demografia, mediante chacinas. Planos recentemente vazados ao público revelaram além: esquemas para concentrar os palestinos em “áreas de trânsito humanitário” ou “cidades humanitárias”, nada mais do que eufemismos e mecanismo para a limpeza étnica.

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Unanimidade na União Europeia é certamente impossível. Embora a Espanha tenha se mostrado a maior defensora dos direitos fundamentais, ao pressionar por uma posição do bloco, outros Estados ainda oscilam entre uma retórica presunçosa ou mais e mais alegações para justificar ou legitimar o genocídio. Sem mencionar o fato de que parar o genocídio sequer está sobre a mesa de debates. Caso a legislação de direitos humanos realmente existisse, para evitar que violações aconteçam, impedir o genocídio deveria prescindir de quaisquer discussões ou ponderações.

As medidas sugeridas pela União Europeia não terão qualquer impacto no genocídio de Israel cometido na Faixa de Gaza. O Artigo 2 do Acordo de Associação indica ainda que “o respeito por direitos humanos e princípios democráticos” é fundamental — ambos infringidos desde sua implementação formal no ano 2000. 

Tudo que a União Europeia espera alcançar — contudo, sem conseguir — é mitigar os danos prévios daquilo que deveria ter sido feito. Em vez disso, tanto Tel Aviv quanto a Europa seguem em contumaz violação de “princípios” — esta, ao apoiar a narrativa de segurança israelense a todo o custo e auxiliar a entidade colonial de assentamentos a expulsar os palestinos de suas terras, por meio de uma paradigma de normalização sob obstinado verniz humanitário. Enquanto a Europa se sente proativa por deixar letrinhas sobre o papel, bastante formal, palestinos continuam a ser massacrados pelas bombas de Israel e por tamanha polidez.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.