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A mídia não deve dar espaço a `interpretações`do genocídio. O caso da Indonésia

3 de julho de 2025, às 07h00

As bandeiras da Indonésia e de Israel exibidas juntas [imagem gerada por IA]

A Indonésia há muito se posiciona como uma firme oponente do colonialismo e da injustiça. Essa postura não é retórica. Está consagrada em sua constituição, que afirma claramente:

“O colonialismo deve ser abolido neste mundo porque não está de acordo com a humanidade e a justiça”.

A ocupação israelense da Palestina, que dura décadas — um regime de controle militar, roubo de terras, deslocamento forçado e massacres — é o colonialismo em sua forma mais crua. A mídia indonésia não tem o direito de legitimá-lo.

No entanto, algumas emissoras nacionais, incluindo a TVOne e a iNews, têm repetidamente cedido espaço de transmissão a ativistas pró-Israel sob o pretexto de uma discussão equilibrada. Essas figuras não apresentam apenas uma opinião alternativa; elas promovem uma narrativa criada para justificar a desapropriação e a destruição de um povo inteiro. Eles defendem o que organizações globais de direitos humanos — incluindo a Anistia Internacional e a Human Rights Watch — definiram claramente como apartheid e crimes contra a humanidade.

Isso não é jornalismo. É cumplicidade.

Nos últimos dois anos, mais de 50.000 palestinos em Gaza foram mortos — a grande maioria civis, incluindo milhares de crianças. Isso não aconteceu do nada. Israel mantém um bloqueio paralisante em Gaza há mais de 17 anos, controlando suas fronteiras, espaço aéreo e acesso a água, medicamentos e eletricidade. Essas não são operações militares. São métodos de punição coletiva e aniquilação sistemática.

Dar destaque a vozes que buscam justificar essa brutalidade é abandonar o papel da imprensa como fiscalizadora e transformá-la em plataforma de propaganda. Isso não é “ouvir os dois lados”. Não há dois lados na limpeza étnica. Não há posição neutra quando um povo está sendo submetido à fome e bombardeado até a extinção.

Alguns podem argumentar que se recusar a acolher vozes pró-Israel é uma violação da liberdade de expressão. Isto é uma distorção do conceito. Liberdade de expressão significa o direito de falar sem medo da repressão estatal — não o direito de ser transmitido em rede nacional. As instituições de mídia não são obrigadas a amplificar todos os pontos de vista, especialmente quando esses pontos de vista defendem crimes de guerra. Assim como jamais daríamos espaço para a negação do Holocausto ou para supremacistas raciais em nome do “equilíbrio”, não devemos fornecer palco para aqueles que justificam a violência sistêmica de Israel contra os palestinos.

Os riscos não são meramente teóricos. Transmitir narrativas pró-Israel confunde o público, enfraquece nossa clareza moral e abre caminho para a normalização da violência colonial. Sugere que nossos princípios constitucionais — e o sofrimento do povo palestino — são discutíveis ou, pior, dispensáveis. Esse é um caminho perigoso.

A Indonésia é a maior nação de maioria muçulmana do mundo. Nossa solidariedade com a Palestina não é apenas política; é emocional e profundamente enraizada em nossa história. Sabemos como é a ocupação colonial. Sabemos o que significa resistir a ela. Para um veículo de comunicação nacional convidar alguém que defende esse mesmo sistema de ocupação — para pintá-lo como racional ou humano — não é apenas ofensivo. É um insulto à nossa memória nacional e à nossa dignidade coletiva.

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Alguns dirão que esses debates são educativos. Mas o que está sendo ensinado? Que o genocídio está aberto a interpretações? Que o apartheid merece uma audiência justa? Ideias não existem no vácuo — especialmente na mídia. Quando uma emissora apresenta uma voz, ela lhe confere legitimidade. Sinaliza ao público que essa é uma perspectiva que vale a pena considerar. Quando essa perspectiva está enraizada na justificativa da violência colonial, o resultado não é educação. É doutrinação.

Sejamos claros: recusar-se a dar voz a Israel não é censura. É discernimento moral. Nenhuma democracia séria é obrigada a dar espaço a ideologias que promovem a opressão. A mídia deve exercer seu julgamento. Esse julgamento deve estar alinhado com nossos princípios nacionais, nossos valores constitucionais e nossas obrigações éticas para com aqueles que vivem sob a bota do apartheid.

A mídia indonésia deve se perguntar: que tipo de sociedade deseja moldar? Uma que nivele as distinções morais em nome da neutralidade? Ou uma que se posicione firmemente ao lado das vítimas da ocupação e do genocídio?

Este não é um momento para ambiguidade. É um momento para clareza. Não há terreno neutro entre o opressor e o oprimido. A mídia deve escolher. E a mídia indonésia, se realmente reflete a alma da nação, deve se posicionar ao lado da Palestina — sem concessões e sem desculpas.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.