Narrativas ocidentais frequentemente retratam o Irã como uma teocracia monolítica, intolerante à diversidade e presa à rigidez ideológica. O sistema político iraniano certamente não é uma democracia ao estilo ocidental. Eleições regulares são organizadas e há um certo grau de competição por políticas. O país pode apresentar déficits, assim como as democracias ocidentais, que são cada vez mais controladas por oligarcas e pelos mais ricos.
O cenário social, cultural e até político do Irã é muito mais matizado e pluralista do que as percepções ocidentais sugerem. Sob a superfície da imagem clerical austera da República Islâmica, encontra-se um mosaico de etnias, ideologias e formas de expressão cívica que desafiam o estereótipo simplista de um regime intolerante. A imagem e os mitos ocidentais tendem a inverter completamente essa realidade e, assim, a falsear. Esses mitos pintam nuances de islamofobia em relação ao Irã.
Rumi, o poeta persa e místico sufi do século XIII, é uma figura significativa na cultura iraniana e frequentemente invocado no discurso político iraniano. Embora seu túmulo esteja na Turquia, sua poesia, escrita em persa, ressoa profundamente no Irã, onde ele é considerado parte fundamental do patrimônio literário e cultural da nação.
O Irã abriga diversos grupos étnicos — persas, azeris, curdos, árabes, balúchis, turcomanos e outros — cada um com suas próprias línguas, tradições e práticas culturais. Embora o persa (farsi) seja a língua oficial, línguas minoritárias como o curdo, o azerbaijano, o árabe e o balúchi são amplamente faladas, principalmente na mídia regional, na literatura e na educação informal. A música e a dança curdas e azerbaijanas prosperam, e festivais culturais são realizados abertamente, embora sob certas restrições. Não há como negar a diversidade étnica e linguística no Irã.
O Irã é constitucionalmente uma República Islâmica Xiita, mas reconhece e garante a representação de minorias religiosas, incluindo cristãos (principalmente armênios e assírios), judeus e zoroastrianos. Essas comunidades têm assentos reservados no Parlamento (Majlis). O Irã abriga uma das maiores populações judaicas do mundo muçulmano. As sinagogas funcionam livremente e as escolas judaicas, embora sob supervisão estatal, funcionam com alguma autonomia. Há igrejas em bairros armênios e templos zoroastrianos são preservados como patrimônio cultural.
Embora o Irã não pratique uma democracia de estilo ocidental, sua arena política inclui um amplo espectro de vozes conservadoras, moderadas e reformistas. As eleições presidenciais e parlamentares são disputadas vigorosamente, com alta participação eleitoral. O Ocidente também não pode afirmar que a sua própria democracia é impecável. Sempre haverá espaço para aprimorar o funcionamento da democracia. No entanto, o Irã pratica o pluralismo político dentro de limites.
Candidatos reformistas como Mohammad Khatami e Hassan Rouhani defenderam a sociedade civil e o diálogo com o Ocidente. Organizações da sociedade civil, embora sob pressão, continuam a trabalhar em questões que vão desde os direitos das mulheres até a justiça ambiental.
A juventude iraniana – quase 60% da população – está profundamente engajada com a cultura global, domina a tecnologia digital e está ávida por mudanças. As mulheres, apesar da lei obrigatória do hijab, têm se afirmado na vida pública, na academia, nas artes e nos esportes. As mídias sociais servem como uma esfera paralela para discurso e protesto. O recente movimento “Mulher, Vida, Liberdade” é um testemunho da tenacidade das correntes pluralistas do Irã, mesmo diante de repressões brutais. Cada um desses eleitores na arena política iraniana adotou a “dissidência digital” em sua perspectiva e exercício político.
Esse pluralismo não é isento de contradições. A República Islâmica mantém um controle rígido sobre a dissidência, restringe a liberdade de imprensa e pune severamente o ativismo antigovernamental. Minorias étnicas e religiosas enfrentam discriminação, especialmente muçulmanos sunitas em regiões dominadas por xiitas. No entanto, paradoxalmente, o espaço para negociação, contestação e afirmação de identidade permanece vivo. O pluralismo do Irã é um aspecto notável de sua sociedade, e as comunidades minoritárias mantêm suas identidades e tradições distintas. O pluralismo político é aparente no vaivém de diversos recursos jurídicos, incluindo a sociedade civil e os direitos humanos universais. O sistema jurídico iraniano incorpora o direito religioso, o direito civil e o direito consuetudinário. É preciso afirmar que o próprio “pluralismo” pode ter diferentes interpretações e significados. O Irã não pode ser examinado com precisão pelos paradigmas ocidentais.
Figuras como Rumi e a diáspora iraniana servem como um espaço onde a diversidade é reconhecida e normalizada.
A constituição iraniana reconhece os direitos das minorias religiosas de praticarem livremente suas religiões. Relatos de discriminação e perseguição surgem de vez em quando, particularmente contra a comunidade Bahá’í. Essa, no entanto, é a realidade de todos os países que têm tradições pluralistas. O Irã não é uma exceção singular nesse sentido.
Em um vídeo recente no YouTube, a voz dos judeus iranianos é claramente articulada. Judeus no Irã estão no Irã há 2.700 anos e se consideram judeus iranianos e não judeus israelenses. Homayoun Sameyah, presidente do Comitê Judaico do Irã, afirma que existem treze sinagogas. O Irã, argumentam eles, é definido pela ausência de antissemitismo. Afirmam ter total liberdade religiosa. A mentira de que os iranianos querem matar todos os judeus é categoricamente negada pelos líderes judeus. O chefe da comunidade judaica iraniana, Siamek Morsadech, membro eleito do Parlamento iraniano, afirma: “Não posso viver sem a cultura iraniana”. O Irã não é uma democracia liberal nem um monólito totalitário. É uma sociedade que negocia suas complexidades – entre ortodoxia religiosa e reforma, tradição e modernidade, uniformidade e pluralismo. Reconhecer essa realidade matizada é essencial, não apenas para desafiar as representações ocidentais reducionistas, mas para dialogar com o Irã em termos que respeitem sua dinâmica interna e suas possibilidades de transformação.
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