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‘Esperava um milagre’, diz pescadora que inspirou jornada do Madleen a Gaza

10 de junho de 2025, às 06h23

Embarcação Madleen, da Flotilha da Liberdade, em Catânia, na Itália, em 1º de junho de 2025 [Salvatore Allegra/Agência Anadolu]

Na última semana, Madleen Kulad — pescadora palestina que emprestou seu nome ao barco Madleen, da Flotilha da Liberdade — acompanhou com ansiedade e esperança a jornada da missão a Gaza, na tentativa de romper o cerco imposto por Israel.

Ao longo da missão, Kulab manteve contato com organizadores e apoiadores, reportou a rede Al Jazeera. Neste domingo (8), contudo, a comunicação cessou, quando agentes israelenses invadiram o barco e sequestraram seus 12 tripulantes.

“Partiu meu coração”, disse Kulab à Al Jazeera. “É claro que eu previ esse cenário, mas tinha esperanças de um milagre, de que, de algum modo, o barco conseguisse romper esse bloqueio e chegar em Gaza”.

Na noite de sábado (7), Kulab participou de uma ligação por vídeo com Rima Hassan — deputada francesa do Parlamento Europeu e uma das ativistas a bordo da embarcação, sequestrada por Israel.

“Suas palavras me comoveram, a forma como entregou sua vida à causa palestina. Ela me disse que seu sonho era visitar Gaza”, destacou Kulab. “Esse sonho simples, porém, segue impossibilitado pelas ações de Israel”.

Para Kulab, o ataque ao barco não é apenas político, como pessoal. Vivendo sob cerco, ela conhece bem o peso do isolamento e o sentimento de desamparo.

“Vivemos em um lugar completamente apartado do mundo”, relatou. “Todas as outras tentativas de navios ou flotilhas de romper o cerco sofreram intervenção militar. E isso antecedeu a guerra em ao menos 15 anos. Imagine agora”.

Nas madrugada desta segunda-feira (9), agentes de Israel interceptaram o Madleen em águas internacionais e detiveram ilegalmente os 12 ativistas a bordo, dentre os quais o brasileiro Thiago Ávila e a sueca Greta Thunberg.

O Madleen partiu da Sicília em 1º de junho, a fim de desafiar o cerco absoluto de Israel intensificado há três meses contra a população civil de Gaza — 2.4 milhões de pessoas.  A embarcação carrega comida, medicamentos e fórmula para bebês e crianças.

O navio foi batizado em homenagem a Madleen Kulab, de 31 anos, única pescadora de Gaza. Os ativistas a contactaram ainda antes de partir, ao se mostrarem comovidos por sua história e sua conexão com o mar e a terra de Gaza.

À rede New Arab, recordou Kulab: “Comecei a pescar com cinco anos. Eu acompanhava meu pai e comecei a trabalhar no barco quando ele adoeceu, com somente 13 anos de idade. Como todos os pescadores de Gaza, minha vida é o mar e a terra. Leio as ondas, leio o vento, sei bem quando pescar”.

Kulab espera seu quinto bebê, uma das dezenas de milhares de mulheres grávidas sob risco de morte pela violência e cerco impostos por Israel.

Sobre sua comunidade, explicou: “Nossos barcos foram destruídos; nossas redes foram rasgadas. Tudo aquilo que construímos — as melhorias que fizemos, nossas poupanças — foi varrido pela guerra”.

Pescadores de Gaza, notou, já viviam sob restrições severas de acesso ao mar, além de falta de equipamento e ataques reiterados de Israel na costa palestina.

Para Kulab, a iniciativa, no entanto, segue como uma mensagem ao mundo: “Em nosso isolamento, este barco é um símbolo de solidariedade. Nos diz que os povos livres do mundo ainda estão conosco”.

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