À medida que o sangrento ataque a Gaza prossegue, Israel testemunha um aumento sem precedentes de petições, cartas e declarações públicas assinadas por centenas e milhares de pessoas de diversos setores e disciplinas, todas amplamente divulgadas ao público. Esses apelos compartilham uma demanda única e unificada: acabar com a guerra — agora, não depois. A crescente pressão levou o governo e seu líder a uma resposta frenética, lançando ataques verbais contra os peticionários e exigindo que a liderança do exército dispensasse todos os militares envolvidos na campanha.
Há semanas, Israel tem assistido a um movimento crescente, centrado no objetivo de trazer os prisioneiros de volta para casa e interromper a guerra em Gaza. Tudo começou com uma petição assinada por mil reservistas da Força Aérea, seguida por membros de várias unidades de combate e segurança, sindicalistas, advogados, especialistas jurídicos, acadêmicos e, por fim, pelas famílias dos soldados mortos. O ímpeto não mostra sinais de enfraquecimento e seu alcance final permanece desconhecido.
Uma mensagem comum nas petições das unidades militares é um apelo compartilhado para salvar vidas e devolver os reféns para casa sem demora — mesmo que isso signifique o fim imediato da guerra em Gaza. As petições argumentam que a continuação da guerra atende a interesses políticos e pessoais, não a necessidades de segurança.
No momento da redação deste texto, mais de 120.000 israelenses assinaram estas petições — um número sem precedentes na história de protestos contra guerras anteriores. Isso marca uma mudança significativa na crescente oposição à guerra em curso em Gaza, abrangendo dois grandes grupos da sociedade israelense. O primeiro é civil: incluindo as famílias dos soldados mortos em Gaza, acadêmicos, funcionários universitários, professores e advogados. O segundo é militar e relacionado à segurança: incluindo estudantes de escolas militares, paraquedistas, soldados de infantaria, oficiais do Mossad e do Shin Bet, membros do Conselho de Segurança Nacional, tripulações da Força Aérea, soldados de corpos blindados, pessoal médico do exército, unidades de forças especiais, equipe de unidades de porta-vozes, equipes de vigilância, unidades cibernéticas ofensivas, reservistas, membros de unidades de combate, capitães da Marinha, oficiais da Brigada Golani, soldados de artilharia, a Unidade de Elite 8200 e a unidade de elite do Estado-Maior.
Ao longo de quase 600 dias de aniquilação de Gaza, Israel testemunhou protestos contínuos, manifestações semanais e ocupações em massa. No entanto, a atual onda de petições se destaca como um evento significativo e excepcional, atraindo intensa atenção nacional. Isso ajuda a explicar o volume e a natureza das respostas, tanto de apoio quanto de oposição, com crescente especulação de que essas petições possam levar mais forças armadas a emitir demandas semelhantes para interromper a guerra — uma tendência já em andamento no momento em que este artigo é escrito. Isso confere peso e credibilidade à possibilidade de que esse movimento possa conter com sucesso a continuação da guerra.
As petições rapidamente mobilizaram partidos de oposição, que expressaram apoio e acusaram o governo de visar o que descreveram como a “ponta de lança” das Forças Armadas — ou seja, a Força Aérea. Este é o mesmo grupo de pilotos que, nos meses anteriores à guerra de Gaza, assinou petições semelhantes contra os esforços de reforma judicial e se recusou a participar de operações militares a serviço de um governo de direita. Sua postura anteriormente suscitou sérias preocupações entre as Forças Armadas sobre a possibilidade de o Estado ficar vulnerável caso a Força Aérea se tornasse inoperante. A abordagem do governo a essas petições agora é vista como perigosa e antiética, pois mina o exército, ameaça a segurança nacional e conduz o Estado à ruína moral e estratégica.
Os signatários da petição enfatizam que os soldados israelenses pagaram um alto preço na guerra e agora pedem o seu fim. Argumentam que a força militar não trará de volta os prisioneiros — somente soluções políticas podem fazê-lo. Cada dia que a guerra continua representa uma perda moral. Eles perguntam: por que continuar sacrificando as vidas de soldados e civis em Gaza?
Em contraste, a resposta do governo tem sido de raiva e escalada, culminando em uma declaração particularmente incendiária do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que ultrapassou todos os limites ao rotular os signatários como uma “turba caótica, maligna e barulhenta” em cujas “mentiras de propaganda” o público não acredita mais. Ele os descreveu como um grupo marginal “parecido com erva daninha”, liderado por ONGs financiadas por estrangeiros empenhadas em derrubar o governo de direita.
Outros ministros se juntaram, acusando os signatários de uma “tentativa inaceitável de minar a legitimidade da guerra em Gaza” e pedindo punições severas. Inicialmente, o Chefe do Gabinete Herzi Halevi ordenou a demissão dos signatários da petição, mas, à medida que a campanha ganhou força e mais oficiais aderiram, ele reconsiderou e abriu um diálogo com eles — uma atitude vista como uma vitória dos manifestantes sobre a liderança militar e governamental.
A liderança do exército teme novos protestos de mais militares, o que pode agravar os desafios que enfrenta, especialmente em meio a crescentes ameaças vindas de múltiplas frentes. Adicionar uma frente doméstica a esses fardos corre o risco de alimentar ainda mais uma crise interna já latente.
As petições de protesto coincidiram com uma queda notável nas taxas de alistamento na reserva. Embora o alistamento na reserva tenha atingido 130% nos primeiros meses da guerra, números recentes mostram um declínio acentuado para 60% a 70%, refletindo a crescente dificuldade em recrutar mais reservistas e amplificando os apelos pelo fim da guerra.
Há muitas razões por trás dessas petições — além do objetivo de resgatar os reféns. A principal delas é o reconhecimento de que perseguir “o último caça, o último foguete e o último túnel” em Gaza só leva a uma guerra sem fim. O custo social e militar tornou-se insuportável. Sinais de decadência institucional são cada vez mais visíveis, doutrinas militares parecem ultrapassadas e o exército mostra sinais alarmantes de exaustão e deterioração. A drenagem irresponsável de recursos em Gaza gerou consequências gritantes demais para esconder.
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