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Tarcísio, Caiado e Netanyahu: aperto de mãos manchadas de sangue

Manifestantes demonstram solidariedade ao povo palestino durante ato contra a violência policial em frente à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), em São Paulo, Brasil, 18 de março de 2023 [Reprodução]
Manifestantes demonstram solidariedade ao povo palestino durante ato contra a violência policial em frente à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), em São Paulo, Brasil, 18 de março de 2023 [Reprodução]

Todos os horrores de mais de 160 dias da carnificina sionista em Gaza, incluindo massacres diários, ataques a hospitais e jornalistas, crianças e idosos morrendo de fome, ainda não mereceram passo a mais do Estado brasileiro diante do reconhecimento de Lula do genocídio. A cumplicidade explícita com esse crime contra a humanidade fica por conta de governadores como os bolsonaristas Tarcísio de Freitas (São Paulo) e Ronaldo Caiado (Goiás), em viagem agora ao Estado racista de Israel por cinco dias.

Até o momento, em pouco mais de cinco meses, já são mais de 32 mil palestinos assassinados, sem contar os milhares de desaparecidos sob os escombros. A maioria são mulheres e crianças. Entre estas últimas, que somam mais de 13 mil das vítimas fatais, mais de 25 morreram de fome recentemente. Todos os 2,4 milhões de habitantes da estreita faixa estão ameaçados pela insegurança alimentar, conforme a Organização das Nações Unidas (ONU). É a nova fase da contínua Nakba – a catástrofe palestina cuja pedra fundamental é a formação do Estado racista e colonial de Israel em 15 de maio de 1948 mediante limpeza étnica.

Nada disso causa o mínimo constrangimento a Tarcísio e Caiado em exporem o apoio ao genocídio em Gaza. Pelo contrário. Querem capitalizar a viagem eleitoralmente junto à extrema-direita e sua base que levanta bandeiras sionistas – parte alinhada ideologicamente, parte desinformada e enganada por representações bíblicas que promovem falsificação histórica, repetidas à exaustão pelas lideranças neopentecostais. Ambos buscam se cacifar como sucessores de Bolsonaro, que também foi convidado pelas autoridades sionistas a integrar a comitiva macabra, mas está com passaporte apreendido e não pôde se juntar a ela.

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Parceria da morte

Enquanto Tarcísio segue com a chacina no litoral paulista – que já deixou desde dezembro último mais de 50 mortos –, visita ainda empresas sionistas que garantem os fuzis e blindados para a matança.

As armas sionistas, testadas sobre as cobaias humanas em que Israel converte os palestinos, inclusive agora no genocídio em Gaza, servem ao genocídio do povo negro e pobre, bem como ao extermínio indígena. Essa denúncia foi ecoada durante ato contra a violência policial de Tarcísio no último dia 18 de março, em São Paulo. Que alcance o banco dos réus dos tribunais internacionais.

Na programação da “visita oficial” do governador paulista, consta a ida à sede da Israel Aerospace Industries (IAI), cujos drones que carregam até 490km serviram aos bombardeios em todos os massacres a Gaza e agora seguem sendo utilizados no genocídio em curso na estreita faixa. Esse arsenal da morte deve vir renovado e ampliado na bagagem do governador de São Paulo.

Tarcísio foi denunciado em 8 de março pelas organizações Conectas e Comissão Arns ao Conselho de Direitos Humanos da ONU pela letalidade policial. “Registros oficiais do Estado indicam que as mortes em decorrência de intervenção policial subiram 94% no primeiro bimestre de 2024. Esse é o resultado de uma ação deliberada do atual governador, Tarcísio de Freitas, que vem investindo na violência policial contra pessoas negras e pobres”, destaca trecho da denúncia apresentada. Tarcísio reagiu à lá Netanyahu: “Não estou nem aí.” “Diga-me com quem andas e te direi quem és”, ditado popular, serve como uma luva aqui.

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Às vésperas de sua ida ao Estado racista de Israel, em encontro com entidade sionista, ele assinou carta de adesão à definição da Aliança Internacional para a Recordação do Holocausto (IHRA) que equipara falsamente antissionismo a antissemitismo. Ao reafirmar seu apoio ao Estado genocida durante a viagem, ele chegou ao ridículo de dizer que estaria “do lado certo da história”, expressão bastante utilizada por ativistas solidários ao povo palestino para chamar à necessidade de que se cesse toda forma de cumplicidade com Israel.

Privatização da água e arma da sede no genocídio

Também está programada em sua agenda visita no dia 21 de março à estação de tratamento de efluentes Shafdan da Mekorot, empresa israelense de saneamento responsável pelo apartheid da água a que está submetido o povo palestino. Informe publicado em março de 2020 pela Al Haq, organização palestina de direitos humanos, revelava que “em 2016, os palestinos na Cisjordânia ocupada consumiam em média apenas 73 litros de água por dia, bem abaixo dos 100 litros recomendados pela OMS [Organização Mundial da Saúde], enquanto os colonos israelenses consumiam aproximadamente 369 litros por dia, mais de três vezes a média recomendada”. Segundo a organização, esses residentes ilegais consomem três a oito vezes mais água do que toda a população palestina da Cisjordânia.

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À época, o informe da Al Haq já denunciava que em Gaza a situação era “particularmente preocupante”, em face do bloqueio criminoso sionista à estreita faixa: “De acordo com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a partir de 2019, somente uma em cada dez famílias de Gaza tinha acesso à água limpa e segura. Apenas 5% do abastecimento na Faixa de Gaza é fornecido por Israel, a potência ocupante, enquanto o restante vem do aquífero costeiro, que está amplamente contaminado, ou de poços privados, inacessíveis para a maioria dos palestinos. Além disso, menos de 4% da água doce de Gaza é própria para uso e consumo humano.”

Em meio ao genocídio, a situação alcança níveis catastróficos, com Israel utilizando também a sede como arma de guerra. Ao impor bloqueio pleno, fechou as tubulações que abastecem Gaza, e as instalações de águas residuais e dessalinização tiveram que ser praticamente encerradas ainda em novembro de 2023 por falta de eletricidade e combustível, como denunciou A. Kayum Ahmed, conselheiro especial para o Direito à Saúde da Human Rights Watch. Essa infraestrutura foi também alvo de bombardeios, impedindo que o abastecimento venha a ser restaurado e impondo a morte por desidratação e doenças infecciosas como parte do genocídio.

Um memorando de entendimento da Sabesp com a Mekorot chegou a ser suspenso em 2009 após ampla luta da solidariedade com o povo palestino. Na busca por privatizar a Sabesp, Tarcísio já prenunciava, logo após assumir o posto de governador, que primeiro macularia suas águas na cumplicidade com a colonização, o apartheid e a limpeza étnica do povo palestino. O genocídio não alterou em nada essa rota, pelo contrário. A visita vai nessa direção.

Garoto-propaganda do sionismo

Já Caiado é um dos principais porta-vozes dos latifundiários cujo histórico de ataques a quilombolas e povos indígenas é bem conhecido, assim como não são novidade os acordos com Israel nas áreas de tecnologia e agronegócio. Ele tem se esmerado em difundir a propaganda de guerra contra todo o povo palestino, buscando legitimar as mentirosas narrativas sionistas para justificar o genocídio em curso. Como mostra reportagem de Dolores Guerra publicada em 18 de março no Portal GGN, como garoto-propaganda exemplar, chegou a inaugurar no mês passado um parque “memorial às vítimas israelenses” na área do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) de Goiânia.

O encontro com o primeiro-ministro sionista, Benjamin Netanyahu, e o presidente do Estado genocida, Isaac Herzog, por ambos é, portanto, o aperto de mãos na parceria da morte. Mãos manchadas de sangue.

 

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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