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A hasbara sionista na grande mídia brasileira

Ato contra apoio da rede Globo ao genocídio israelense em Gaza, na sede da emissora, em São Paulo, 28 de janeiro de 2024 [Sérgio Koei/Divulgação/Frente Palestina SP]
Ato contra apoio da rede Globo ao genocídio israelense em Gaza, na sede da emissora, em São Paulo, 28 de janeiro de 2024 [Sérgio Koei/Divulgação/Frente Palestina SP]

“A imprensa é tão poderosa no seu papel de construção de imagem que pode fazer um criminoso se passar por vítima e a vítima se passar por criminoso. Esta é a imprensa, uma imprensa irresponsável. Se você não for cuidadoso, os jornais vão levá-lo a odiar os oprimidos e amar os opressores.” A frase do líder negro americano Malcom X não poderia definir melhor a antítese do que seria uma cobertura jornalística na chamada grande mídia brasileira em meio ao genocídio na Faixa de Gaza. Na verdade, uma propaganda de guerra contra todo o povo palestino, que reproduz com maestria a hasbara sionista.

Hasbara designa o esforço sionista em difundir distorções, mitos e invenções que compõem narrativa e propaganda favoráveis ao Estado racista e colonial de Israel, de modo a justificar, alimentar e encobrir o genocídio, limpeza étnica, colonização e apartheid.

Introduzida ao vocabulário sionista inicialmente pelo jornalista polonês e líder sionista Nahum Sokolow ao início do século XX, a hasbara está no cerne do projeto colonial sionista, como se observa em seus mitos fundacionais já totalmente desgastados. Entre os quais, que se tratava de “uma terra sem povo para um povo sem terra”.

Relações públicas de Israel

Além dos mitos fundacionais, no processo de colonização e limpeza étnica sionistas que já dura mais de 75 anos, entre as mais conhecidas e replicadas como verdade está a ideia de que o ocupante (Israel) estaria se defendendo, ao arrepio do que seria direito de defesa de acordo com as leis internacionais e mesmo resoluções da Organização das Nações Unidas (ONU). Quem tem o direito de resistir, sob todos os meios, é o oprimido, sob ocupação – portanto, o povo palestino –, mas a propaganda sionista promove inversão para legitimar suas atrocidades. Essa mentira segue a ser reciclada e ecoada pela grande mídia.

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Outro exemplo da hasbara nos meios de comunicação de massa é a tática do diversionismo, ou seja, a insistência em desviar a atenção para a carnificina em curso há mais de cinco meses, ao sempre buscar explorar os mitos construídos por Israel em torno do 7 de outubro, dos mais diversos ângulos.

A persistência em retratar a resistência palestina como um bando de selvagens é parte desse esforço. Mitos buscam demonizar e desumanizar o povo palestino, sempre na ótica orientalista e racista da “civilização contra a barbárie”. Os meios de comunicação de massa, como Globo, têm cumprido bem essa tarefa, como agências de relações públicas de Israel. Isso não é jornalismo.

Enquanto amplificam a propaganda sionista, silenciam as vozes palestinas, absolutamente ausentes nesse contexto. São mais de 75 anos de contínua Nakba — catástrofe palestina cuja pedra fundamental é a formação do Estado racista de Israel em 15 de maio de 1948, mediante limpeza étnica planejada. Essa contextualização histórica inexiste no geral e dá lugar ao engodo de uma guerra circunstancial e pontual, entre Hamas x Israel, em que assombrosamente o Estado sionista se apresenta como a vítima. Isso também é hasbara. Assim como a acusação vil de que antissionismo é antissemitismo, para intimidar e silenciar as vozes que se levantam contra um regime colonial, racista e genocida.

Não à toa as portas da Globo já foram alvo de protestos em várias cidades brasileiras, como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília. Suas mãos estão manchadas de sangue palestino. Como em outros momentos da história, em que a Globo esteve do lado da ditadura no país, agora se consagra como cúmplice do genocídio em Gaza. Não é diferente com outras mídias.

Embora a Folha de S. Paulo abra a sua página 3 para o contraditório e haja colunistas que buscam noticiar os fatos e se posicionar contra o genocídio, a cobertura no geral segue tão vergonhosa quanto. Chega ao cúmulo de tentar desacreditar as informações sobre os muitos massacres, silenciando e ignorando a cobertura realizada in loco pelos jornalistas de Gaza, que dolorosamente cobrem seu próprio genocídio. Um a cada dez desses profissionais da comunicação foi vítima das bombas assassinas de Israel nos últimos mais de cinco meses. Já são mais de 135 jornalistas mortos. Mas suas vidas, junto às dos milhares de palestinos trucidados no genocídio na estreita faixa, entre os quais 70% mulheres e crianças, não importam para esse oligopólio midiático subserviente ao imperialismo dos Estados Unidos. A hasbara, um dos maiores investimentos do regime sionista — ao lado dos bilhões do imperialismo americano que transformaram Israel numa das maiores potências bélicas do mundo — tem espaço garantido.

Os “40 bebês decapitados” são a expressão mais acabada da hasbara em meio à tentativa de “solução final” por parte do Estado de Israel. Prenunciando o mar de mentiras, os meios de comunicação de massa apressaram-se a noticiar essa perversa invenção, dando um exemplo do que não é jornalismo. Mesmo após o desmentido, o mal segue feito, porque o impacto da primeira mentira continua a reverberar. Os “40 bebês decapitados” exerceram a função da farsa das “armas de destruição em massa” para o imperialismo dos Estados Unidos justificar a invasão do Iraque em 2003. Agora são os “estupros coletivos”, ao que Israel recusa uma investigação independente, porque sabe que nunca ocorreram e, como aponta reportagem do The Intercept, são desmentidos por aquelas que seriam as supostas vítimas. O genocídio é sempre justificado e segue a ser alimentado.

Contudo, nem mesmo a propaganda de guerra contra o povo palestino tem conseguido encobrir a carnificina perpetrada por Israel em Gaza. Em sua coluna na Folha no dia 29 de fevereiro, Mônica Bergamo revela que a imagem do Estado sionista despenca junto à opinião pública brasileira. A máscara cai. E como destacou o ator Mark Ruffalo, ao adentrar a cerimônia do Oscar saudando o atraso resultante do protesto pró-Palestina, “a humanidade vence”.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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