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Guerra civil na Síria: Interesses estrangeiros e esforços para solucionar o problema

Bombardeio em Alepo, na Síria, em 4 de outubro de 2016 [Mahmut Faysal/Agência Anadolu]

A guerra civil na Síria é um conflito ainda em curso que teve início em 2011 – consequência da Primavera Árabe e do advento de protestos contra o governo, por democracia, que varreram o Oriente Médio e Norte da África. Desde então, o regime do presidente Bashar al-Assad trava batalhas contra diversos grupos de oposição. O conflito deixou centenas de milhares de mortos e milhões de deslocados. Potências estrangeiras sentiram-se atraídas a intervir. A situação síria permanece como um das crise humanitárias mais letais e complexas de nosso tempo.

A Primavera Árabe na Síria começou com manifestações pacíficas por reforma política; contudo, rapidamente avançou a confrontos armados devido à resposta brutal de Assad. Desde então, o conflito escalou a uma guerra multilateral, com numerosos grupos rebeldes, forças do governo e poderes internacionais envolvidos no problema, resultando no altíssimo número de mortos e refugiados, então espalhados por todo o mundo.

O papel da Rússia na Síria

Analistas observam que o papel da Rússia na guerra civil da Síria mostrou-se perigoso e ineficaz – sobretudo no que se refere a um plano político –, à medida que Moscou insiste em fornecer ajuda militar ao regime de Assad. Muitos condenam a intervenção russa na Síria por incorrer na morte de civis e ter como alvo preferencial grupos oposicionistas moderados. O envolvimento da Rússia agravou a violência e levou a aumento de tensões com outros países, em particular, Estados Unidos e aliados, que mantém apoio a opositores do regime.

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Outro fator de risco é o fato da ingerência russa ter prolongado o conflito e a subsequente crise humanitária. Milhões foram deslocados, milhares foram mortos; cidades e aldeias, destruídas e a situação no país ainda é grave.

Analistas descrevem o envolvimento do Kremlin no dilema sírio como esforço para ampliar sua influência geopolítica no Oriente Médio e ameaça frequente à estabilidade regional. Forças russas são implicadas em múltiplos crimes de guerra e lesa-humanidade durante sua campanha na Síria, incluindo bombardeios aéreos a áreas civis e uso de armas banidas, como bombas de fragmentação. O regime sírio é acusado de usar armas químicas contra civis com aval e apoio da Rússia. Além disso, empresas russas foram implicadas em exploração de petróleo e mineração ilegal no decorrer do conflito.

Em âmbito político, os esforços diplomáticos de Moscou concentram-se sobretudo em manter Assad no poder, sem consideração devida à proteção da população civil ou uma solução capaz de abordar as causas implícitas do conflito. Moscou recorreu a seu poder de veto no Conselho de Segurança das Nações Unidas em diversas ocasiões, para obstruir resoluções eventualmente críticas ao regime sír io.

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De maneira geral, o envolvimento russo impediu o colapso do regime de Assad, mas também é um fator na escalada da violência e no persistente sofrimento do país. A ingerência de Moscou agravou tensões com estados vizinhos e internacionais, conforme múltiplos analistas, ao colocar em xeque a estabilidade de toda a região.

O papel do Irã na Síria

O Irã está envolvido na guerra síria desde os primórdios do conflito, em 2011, ao prover apoio militar e financeiro ao regime de Bashar al-Assad. A participação iraniana no conflito é alvo de críticas e controvérsias, maculada por acusações de colaborar com abusos de direitos humanos e com a escalada da violência no país.

Teerã forneceu ao governo em Damasco armas, equipamentos e assessoria militar. A república islâmica também enviou tropas e grupos por procuração para lutar ao lado de Assad. Milícias e organizações armadas – como o movimento libanês Hezbollah e outros aliados de Teerã – são acusadas de cometerem crimes de guerra e lesa-humanidade e agravar a crise dos refugiados e deslocados internos. Tais grupos por procuração também cometeram crimes sectários contra a população sunita, ao contribuir com a radicalização de certos grupos opositores.

O envolvimento iraniano na Síria é também uma tática para expandir a influência do estado dos aiatolás no Oriente Médio – segundo alertas, outra ameaça em potencial à suposta estabilidade regional. Alguns países, com destaque para Israel e Arábia Saudita, condenam Teerã por intervir na Síria e buscaram agir para contra-atacá-lo – não por preocupações humanitárias, mas sim cálculos políticos.

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Ademais, o papel do Irã na Síria equipou o regime de Assad ao longo dos anos, em contraponto à perda de legitimidade do governo aos olhos de boa parte da população síria, devido a brutal repressão contra apelos populares por democracia e persistente violação de direitos humanos.

A solução na Síria 

A solução à questão síria parece complexa e multifacetada; contudo, ainda desconhecida. Para conquistar uma paz abrangente e duradoura na Síria é preciso uma combinação de negociações e esforços diplomáticos e políticos, além de um compromisso em abordar as causas inerentes do conflito.

Uma iniciativa de destaque para encerrar a guerra na Síria está representada nas conversas de paz mediadas pela ONU lançadas em 2016 – no entanto, até então sem êxito. Outros esforços repousam no chamado processo de Astana, um fórum de negociação constituído por Rússia, Irã e Turquia, também incapaz de chegar a uma solução abrangente. O fracasso de Astana, segundo analistas, decorre da desconsideração à Resolução 2254, dado que Rússia, Irã e Turquia insistem em priorizar interesses próprios, sem soluções satisfatórias para o povo sírio.

Uma solução política ao conflito envolver negociações entre o governo sírio e oposicionistas, a fim de chegar a um acordo de compartilhamento de poder, levar à instauração de um governo transicional e, eventualmente, a eleições democráticas. Tais negociações devem tratar ainda de questões fundamentais que alimentaram o conflito, dentre as quais, representação política, direitos humanos e desenvolvimento econômico.

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Outro passo essencial rumo a uma paz duradoura seria abordar a crise humanitária na Síria, fornecer socorro e apoio às vítimas do conflito e propor uma solução adequada aos milhões de refugiados e deslocados internos.

Esforços políticos e diplomáticas devem exigir um longo processo de reconciliação, com inclusão de todas as partes em confronto e todas as comunidades da Síria. O processo tem de abordar aspectos de justiça de transição, reconstrução e reabilitação do país.

De modo geral, encontrar uma solução à guerra na Síria deve demandar esforços contínuos e multifacetados em âmbito diplomático, político e humanitário. Certamente é preciso apresentar soluções para as causas estruturais e subjacentes do conflito.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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