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Organizações reivindicam ações contra apartheid sionista a futuro Governo Lula

Ato em solidariedade com o povo palestino, no Rio de Janeiro, em 2014 [Mídia Ninja]
Ato em solidariedade com o povo palestino, no Rio de Janeiro, em 2014 [Mídia Ninja]

Concluídos os relatórios preliminares dos 32 Grupos de Transição (GTs) que apresentam diagnóstico sobre a trágica situação da máquina pública deixada por Bolsonaro e indicam “revogaço” de atos deste, bem como as prioridades ao Governo Lula a partir de 1º. de janeiro de 2023, é momento de reivindicar que medidas contra o apartheid sionista não fiquem de fora.

Propostas nesse sentido constam de carta assinada por movimentos sociais e populares brasileiros, organizações da comunidade árabe-palestina no País e acadêmicos. O documento foi enviado pela Frente em Defesa do Povo Palestino no dia 8 de dezembro último aos GTs de Direitos Humanos e de Relações Exteriores – assessoria deste último confirmou o recebimento e agradeceu as contribuições. Foi ainda encaminhado pessoalmente pessoalmente pela Sociedade Árabe-Palestina de Brasília e organizações. A Frente em Defesa do Povo Palestino assina o documento com 42 entidades, movimentos e intelectuais, incluindo o Monitor do Oriente Médio (MEMO).

O Espaço Cultural Palestino Al Janiah, que se engajou fortemente na campanha para derrotar Bolsonaro e recebeu vários candidatos de esquerda em sua casa para apresentarem suas propostas e debater com o público, está entre as organizações da comunidade que aderiram, bem como a Federação Árabe-Palestina do Brasil (Fepal), a União Palestina da América Latina (Upal), o Fórum Latino-Palestino e a Associação Islâmica de São Paulo E também partidos políticos, centrais sindicais como CUT, CSP-Conlutas e Intersindical, bem como os movimentos dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e Sem Terra (MST), coletivos e movimentos de mulheres, de favelas, ambientais, de comunicação, de trabalhadores, negros e artistas.

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O documento traz diretrizes básicas a um governo em linha com os princípios de defesa de direitos humanos fundamentais e democráticos. Nesse sentido, ao lembrar que na Palestina ocupada cerca de 90% dos votos nas últimas eleições se destinaram a Lula, conclama que o “novo governo lidere, na América Latina e no Sul Global, esforços de reconhecimento” na Organização das Nações Unidas (ONU) de que “o regime implementado pelo Estado de Israel é de apartheid contra a totalidade do povo palestino, oprimindo e segregando as pessoas palestinas refugiadas,  as que vivem na Cisjordânia e Faixa de Gaza, e as que possuem cidadania israelense, mas vivem sob um regime de discriminação institucionalizado”.

Assim, pleiteia que não mantenha acordos com regime de “segregação racial, colonização e ocupação que os palestinos enfrentam há mais de sete décadas, adotando com urgência um imediato embargo militar a Israel, em atendimento ao clamor do povo palestino por solidariedade aos moldes da pressão internacional que ajudou a pôr fim ao regime de apartheid na África do Sul em 1994”. Lamentavelmente o Brasil se tornou ao longo da última década o quinto maior importador de tecnologia militar israelense, na contramão da solidariedade necessária. Bolsonaro esfregou na cara do mundo, vergonhosamente, o sionismo explícito na cadeira do Planalto. Agora Lula tem a oportunidade de fazer o caminho inverso.

A carta também pede “fim do sigilo referente a tratados, contratos e relações entre Brasil e Israel durante o Governo Bolsonaro e transparência em relação a todos os dispositivos firmados, além de gestões junto ao Congresso Nacional para revogação do Decreto Legislativo 124/2022, que contraria a Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527, de 18 de novembro de 2011) e a transparência em prol do interesse público”.

O embasamento, como explicado na carta, encontra-se em detalhados e bem fundamentados relatórios de reconhecidas organizações internacionais como Anistia Internacional e Human Rights Watch, bem como da israelense de direitos humanos BTSelem. “Além disso, o apartheid também é reconhecido pelo relator especial do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, Michael Link, além de diversos comitês, conselhos e ex-ministros europeus. O Estado de Israel é, inclusive, investigado no Tribunal Penal Internacional (TPI), por crimes contra a humanidade”, pontua.

As organizações da comunidade árabe-palestina e movimentos lembram ainda que a demanda vai ao encontro de compromisso assumido por Lula quando era então ex-presidente, em julho de 2020, ao assinar a Declaração “Resposta do Sul Global”, que propugna sanções ao apartheid israelense.

Movimentos de favelas, indígenas e negros

Ainda entre os documentos enviados ao Grupo de Transição, uma carta aberta de organizações e movimentos indígenas, negros e de favelas sobre a situação do povo palestino foi entregue aos GTs de Relações Exteriores, de Direitos Humanos e de Igualdade Racial no dia 6 de dezembro.

Entre os que aderiram estão Movimento Negro Unificado (MNU), Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Marcha das Mulheres Negras de São Paulo, Rede de Comunidades e Movimento contra a Violência, Movimento Independente Mães de Maio, Articulação Internacional Julho Negro (Movimento de Favelas do Rio de Janeiro), Soweto Organização Negra, associações e coletivos de hip hop e de favelas, incluindo a Frente de Mobilização da Maré, e muitos outros. (confira aqui seu conteúdo e todas as adesões)

Na carta, enfatizam que a luta contra o racismo e o colonialismo é internacional, “de todos os povos”, mencionando os relatórios de instituições reconhecidas que denunciam o regime de apartheid sionista.

As organizações salientam: “Lutar contra a militarização de nossas vidas e o genocídio do povo negro e indígena no Brasil, enfrentar a segregação espacial e os despejos, denunciar o racismo diariamente e defender nossas terras do interesse de empresas que lucram com nossa tragédia nos faz profundamente solidários com as palestinas e palestinos que vivem situações semelhantes em virtude das violações perpetradas pelo Estado de Israel. São mais de sete décadas de limpeza étnica e de políticas e leis de discriminação racial institucional, as quais afetam mais de 5 milhões de pessoas refugiadas, aquelas que vivem sob ocupação militar na Cisjordânia e Faixa de Gaza, e também as que possuem cidadania israelense mas não têm os mesmos direitos simplesmente por serem palestinas.”

Assim, vaticinam: “É alarmante que o Brasil permaneça cúmplice destas violações do direito internacional e dos direitos humanos e, pior ainda, que aprofunde ainda mais as injustiças em nosso país ao importar armas, tecnologias, táticas e ideologias desenvolvidas pelo apartheid israelense – utilizadas sobretudo contra as populações negras, faveladas e indígenas. Assim, ao reivindicar que o futuro governo Lula seja voz ativa no movimento global contra o apartheid israelense, manifestamos não só nossa solidariedade com o povo palestino, mas também reforçamos nossa própria luta contra o racismo e a militarização no Brasil. Nesse sentido, ecoamos o chamado do povo palestino por um embargo militar a Israel e chamamos o novo governo brasileiro a denunciar o apartheid israelense e atuar pela reativação dos mecanismos da ONU contra esse crime de lesa-humanidade.”

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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