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Fixing Stories – Correspondentes de mídia em locais de conflito

Autor do livro(s) : Noah Amir Arjomand
Data de publicação :Março de 2022
Editora :Cambridge University Press
Número de páginas do Livro :288 páginas páginas
ISBN-13 :978-1316518007

Em sua obra Fixing Stories, Noah Amir Arjomand nos leva ao mundo do trabalho fundamental e amplamente invisível do fixer – ou correspondente local para jornalismo internacional. Definir o que faz um fixer é uma tarefa árdua, dada a variedade de suas funções. Contudo, a ideia geral é que, ao visitar um país ou uma área alheia a seus conhecimentos, um repórter internacional costuma contratar um intermediário para ajudá-lo a encontrar e formular suas histórias. Os fixers realizam uma série de tarefas: buscar entrevistados, organizar viagens, ajudar o correspondente a compreender o contexto local. Após estudar a vida de profissionais turcos, curdos, afegãos e sírios, sobretudo na Turquia, Arjomand decidiu nos transportar a seu mundo.

O próprio autor esteve nas duas pontas da pesquisa: tanto como repórter internacional quanto fixer contratado por colegas estrangeiros. “Enredados no meio de interesses e valores regionais e globais, os fixers mediam a comunicação entre clientes e suas fontes, de forma a reconciliar conflitos políticos e culturais e transmitir informações entre seus nichos”.

Fixing Stories busca entender as raízes sociais do ofício, sua posição dentro do jornalismo e as escolhas morais feitas por profissionais que se tornam fixers. A obra indaga ainda sobre o modo com que tais profissionais difundem as informações e se encaixam na economia global do setor de imprensa. O relacionamento entre local e estrangeiro exerce um papel proeminente na vida dos fixers; frequentemente, são escolhidos por estarem inseridos em certas culturas, embora distantes o suficiente para que a história seja objetiva sob os parâmetros internacionais. Essas expectativas atribuem um fardo incomum e contraditório sobre tais personagens: alheios, mas integrais ao sistema de correspondência estrangeira.

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Veja, por exemplo, a história de Nur – ativista de esquerda falante do inglês, radicado na região de Diyarbakir. Tornar-se um fixer partiu de sua ideologia, a serviço de sua causa. Nur reflete um valoroso recurso a jornalistas externos que querem cobrir a situação dos curdos na Turquia, em particular, em Diyarbakir. De fato, há pouquíssimos residentes na área com conhecimento do inglês, isto é, capacitados para seu trabalho. Alison – jornalista estrangeira que levou Nur à profissão – desfruta e valoriza o acesso que obteve de seu correspondente local, sobretudo ao obter fontes importantes na esquerda nacionalista curda enquanto traduzia, por meio de Nur, o estado emocional de seus entrevistados. Apesar disso, segundo Arjomand: “Alison via Nur como um ativista ao invés de repórter profissional, ao considerá-lo enviesado, próximo demais de sua própria história”.

O papel vago e as capacidades precisas do fixer implicam em um distanciamento frequente com jornalistas estabelecidos, que buscam estabelecer fronteiras entre ambos os mundos. No livro, encontramos histórias de Burcu e Elif, mulheres que viveram na Turquia e nos Estados Unidos e compreendem ambas as culturas. Burcu trabalhou para uma emissora de televisão americana e obteve sucesso profissional considerável também na Turquia. Contudo, ser bem-sucedida em Istambul não implicou em contratação direta por redes ocidentais para que reportasse os fatos de sua terra natal. Burcu, portanto, construiu uma carreira como fixer até tornar-se produtora, ao trabalhar nas fileiras de uma emissora americana radicada em seu país.

Porém, ao conquistar uma posição aceita como “jornalista de verdade”, Burcu viu-se atraída de volta ao mundo dos fixers. Ao debater seu trabalho com Elif – certa vez contratada por Burcu –, a consagrada repórter observou que a diferença entre as partes é que “produtores sabem qual a duração e o formato requerido pelas organizações de mídia, assim como navegar nos processos burocráticos e tecnológicos e quais histórias enquadrar nas expectativas da agência”. Contudo, ao avançar a conversa e refletir sobre o estado do jornalismo contemporâneo na Turquia, alerta Burcu: “A qualidade das pessoas com quem trabalhamos aqui, em geral, não é tão boa. Sejam cinegrafistas ou produtores – e quem não é produtor? – algo está sempre faltando”. Arjomand observa que a “qualidade” e a “ausência” citados por Burcu nada tem a ver com conhecimento técnico ou capacidade de compilar histórias, mas sim afinidade e ciência sobre a expectativa e a cultura do público ocidental. A mesma análise vale para fixers sírios mencionados no livro. Um fixer precisa saber até mesmo como alimentar os preconceitos dos editores americanos e enquadrar suas histórias em tais expectativas.

Há ainda incidentes excepcionais nos quais um fixer não obtém acesso a uma história e escolhe um parente para fingir ser um personagem relevante. Um intermediário sírio, por exemplo, fez uma prima vestir um véu e se passar por ex-membro da brigada feminina de polícia do Estado Islâmico (Daesh). Embora sejam histórias curiosas, há incidentes bastante mais graves nos quais jornalistas pedem a seus correspondentes que arrisquem suas vidas, a despeito de uma série de parâmetros éticos e morais. Além disso, adaptar as histórias ao público ocidental pode levar a reforços de estereótipos degradantes e fixers que tentam contestar tais perspectivas costumam ser atacados ou ostracizados.

Fixing Stories concede um mergulho imersivo e ponderado sobre a história desses personagens obscuros, os dilemas que enfrentam e como tentam navegar entre as expectativas culturais e de mídia. O trabalho dos fixers é frequentemente invisível, mas podemos esperar que um estudo como esse traga luz a seu papel vital no jornalismo internacional.

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