Nas eleições mais pleiteadas e surpreendentes da última década no Peru, os cidadãos foram às urnas no último domingo, 6 de junho, esperando pôr um fim à incerteza e aos sobressaltos de um período de cinco anos caracterizado por diferentes terremotos políticos na nação andina, desde a queda do presidente Pedro Pablo Kuczynski, a dissolução do Congresso da República e a subsequente demissão do ex-presidente interino Martin Vizcarra. Ainda que os resultados não tenham sido promulgados, matematicamente, a apuração dá a vitória a Pedro Castillo.
No início da corrida eleitoral atual, ninguém imaginava que um professor camponês de Cajamarca, José Pedro Castillo Terrones, candidato do partido Peru Livre, iria para o segundo turno das eleições para competir com a líder da Força Popular, Keiko Sofia Fujimori, herdeira política e filha de um dos presidentes mais populares, mas também mais questionados do século XX, Alberto Fujimori, atualmente cumprindo uma pena de 25 anos de prisão por violações dos direitos humanos e corrupção, entre outras acusações.
Os resultados do primeiro turno foram recebidos com surpresa, medo e consternação pela maioria dos peruanos que esperavam poder escolher entre o que consideram a direita e a esquerda moderada, mas em vez disso foram obrigados a escolher entre o professor provincial e líder sindical cuja capacidade de dirigir o país é questionada, e Fujimori, que para muitos representa o lado obscuro do Fujimorismo: ela foi presa três vezes sob acusações de lavagem de dinheiro, obstrução da justiça e falsa declaração em processos administrativos, entre outras coisas.
Candidata da direita, Keiko Fujimori, e candidato da esquerda, Pedro Castillo, nas eleições presidenciais do Peru [Fotos Divulgação: Montagem Resumen Latinoamerican]
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Considerado um país altamente conservador pelos próprios peruanos, Castillo, que se define como “progressista e não-marxista”, foi a surpresa destas eleições. Sua popularidade cresceu como fogo selvagem devido ao cansaço dos cidadãos com a corrupção representada pelos partidos governantes atuais, predominantemente de direita, e a esperança de mudanças reais. Talvez estas razões motivaram seus eleitores a fixar sua atenção no professor de Cajamarca, que, acompanhado por um lápis, está apostando na “revolução educacional”, na nacionalização da mineração e da água, no extrativismo responsável e sustentável e na tecnificação agrícola, para enumerar alguns dos pontos fortes de seu plano governamental.
Não foi fácil para Fujimori, que concorreu à presidência pela terceira vez, acompanhar o candidato de 51 anos em termos de preferência eleitoral, apesar de contar com o apoio da imprensa metropolitana e ter uma campanha de propaganda, especialmente nas principais cidades, que excede em muito o orçamento de seu oponente do Peru Livre.
A tática de Fujimori para desgastar a imagem e invalidar a proposta de Castillo diante do eleitorado foi o discurso de combate ao “comunismo”. Até o ex-candidato presidencial Rafael López Aliaga, do partido Renovação Popular, chegou a entoar “Morte ao comunismo, morte a Castillo”, de acordo com relatos da imprensa local. Esta atribuição ao Castillo não passou despercebida pelos eleitores: muitos deles foram influenciados por esta possibilidade e optaram pela Fujimori ou por anular seu voto.
Pedro Castillo já é considerado vencedor, apesar do resultado ainda não ter sido anunciado oficialmente, ele recebeu 50,20 por cento dos votos contra 49,79 para Fujimori, após a apuração de 99,9 por cento das urnas, nesta quinta-feira (10), segundo o Escritório Nacional de Processos Eleitorais do Peru, ONPE. A presidência de Castillo vem em condições não muito favoráveis, já que ele terá um congresso que se opõe amplamente a ele.
Sua vitória, por outro lado, permite avançar um processo judicial pendente contra Keiko Fujimori, que pode levá-la a prisão. Nesta quinta-feira, um promotor anticorrupção pediu a prisão preventiva da candidata de direita, o que aumentou ainda mais a tensão no Peru sobre a definição da eleição presidencial.
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