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Escolha de Biden para cibersegurança é uma ameaça aos Estados Unidos

Presidente dos Estados Unidos Joe Biden, em Washington DC, 5 de fevereiro de 2021 [Chip Somodevilla/Getty Images]
Presidente dos Estados Unidos Joe Biden, em Washington DC, 5 de fevereiro de 2021 [Chip Somodevilla/Getty Images]

Logo após o Natal, Jonathan e Esther Pollard viajaram de Nova Jersey a Tel Aviv. Ao pousar, Jonathan beijou a pista e foi recebido por ninguém menos que o Primeiro-Ministro de Israel Benjamin Netanyahu. Os Pollards voaram com estilo, às custas de Miriam e Sheldon Adelson. O magnata dos cassinos faleceu há menos de duas semanas e, mesmo em seu leito de morte, parecia determinado a conduzir esta aproximação.

A rede de ostentosos cassinos de Sheldon em Las Vegas, Macau e Singapura o tornou um dos vinte homens mais ricos do mundo. Sem saúde há um bom tempo, porém, Sheldon já havia passado as ações de sua companhia à sua esposa em 2019. Miriam tornou-se, assim, a pessoa mais rica de Israel – “de longe”, segundo o jornal israelense Haaretz.

Jonathan Pollard, americano condenado por espionagem em nome de Israel, deixa o tribunal em Nova York, em 20 de novembro de 2015 [Spencer Platt/Getty Images]

Jonathan Pollard, americano condenado por espionagem em nome de Israel, deixa o tribunal em Nova York, em 20 de novembro de 2015 [Spencer Platt/Getty Images]

Por duas décadas, os Adelsons cultivaram uma rede de organizações de direita, extrema-direita e antipalestinas. Tornaram-se o casal forte do lobby sionista nos Estados Unidos. Sheldon e Miriam efetivamente financiaram proeminentes organizações como o Comitê de Assuntos Públicos Estados Unidos-Israel (AIPAC), o Conselho Israelo-Americano e a Fundação Birthright, todos grupos que promovem o apartheid e a colonização israelense na Palestina ocupada, direta ou indiretamente.

Diferente de alguns ricos doadores americanos, com quem Israel sempre contou para bancar algumas de suas atividades nefastas, os Adelsons jamais se omitiram nas sombras. O suposto ícone da “paz” israelense Shimon Peres, por exemplo, recrutou milionários judeus em Nova York para patrocinar o programa de armas nucleares de Israel, ao mantê-lo fora dos registros oficiais do estado sionista. Tudo isso feito a fim de manter a existência das ambições atômicas em segredo, mesmo diante do governo israelense, dada a oposição de alguns ministros, até que um acordo fosse consumado. Hoje, estima-se que Israel possua 200 ogivas nucleares, conforme a chamada “Opção Sansão”.

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Sheldon e Miriam Adelson foram uma força política como casal, um manto agora herdado pela sra. Adelson. Sua agenda é expressamente antipalestina, anti-iraniana e islamofóbica – em suma, coerente com o partido Likud, que domina a atual política israelense, e com o partido Republicano, nos Estados Unidos.

Quando os Pollards voaram a Tel Aviv, Miriam escreveu uma coluna ao seu próprio jornal israelense, celebrando a soltura de Jonathan, condenado por espionagem a serviço do governo sionista. “Jonathan merece a eterna e mais profunda gratidão de Israel”, afirmou. “Como um soldado ferido que retorna de uma longa e árdua jornada, merece cada benefício e apoio que o estado pode oferecer para assegurar que viva confortavelmente”.

O que Miriam ignorou deliberadamente é o fato de que Jonathan Pollard cometeu traição contra seu país, os Estados Unidos. Pollard não é israelense, mas ainda assim espionou Washington em nome de Tel Aviv e vazou uma pilha de documentos confidenciais em troca de envelopes abarrotados de dinheiro. Então foi condenado e passou trinta anos na prisão como traidor, até ser solto por Barack Obama. Seu período de liberdade condicional terminou sob a presidência de Donald Trump, que permitiu que ele e sua esposa viajassem a Israel.

As atividades de Pollard prejudicaram consideravelmente a segurança dos Estados Unidos. Segundo alguns especialistas de inteligência, seus crimes representaram o pior ato de traição em décadas.

Como ideóloga sionista, não surpreende que Miriam Adelson enalteça a traição de Jonathan Pollard. Contudo, os Adelsons não são os únicos bilionários sionistas que buscam influência no governo e no processo democrático dos Estados Unidos, a fim de remeter a uma direção ainda mais favorável ao estado sionista.

Anne Neuberger discursa durante a Cúpula WIRED 25, em San Francisco, Califórnia, 8 de novembro de 2019 [Phillip Faraone/Getty Images]

Anne Neuberger discursa durante a Cúpula WIRED 25, em San Francisco, Califórnia, 8 de novembro de 2019 [Phillip Faraone/Getty Images]

Nesta conjuntura, sabemos agora que o Presidente Joe Biden indicou Anne Neuberger como sua assessora responsável por coordenar os esforços do governo federal em termos de cibersegurança. Como oficial de carreira na Agência de Segurança Nacional (NSA), Neuberger pode até parecer uma escolha óbvia e bastante apropriada ao cargo.

O que pouquíssimas agências de imprensa notaram, contudo, é que Neuberger também é uma patrocinadora de destaque ao lobby sionista nos Estados Unidos. A fundação da família controlada por Neuberger e seu marido doou mais de US$600 mil à AIPAC somente em 2018. Segundo a declaração tributária da fundação, tais doações foram executadas para “influenciar um corpo legislativo” ou “influenciar a opinião pública” nos Estados Unidos, em nome de Israel.

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Combinado com suas posições de poder no alto escalão do governo e da comunidade de inteligência dos Estados Unidos, temos razões para crer que Neuberger representa uma ameaça à própria segurança americana, sobretudo porque Israel – embora considerado aliado – é visto como ameaça de alto nível por oficiais americanos de contra-inteligência. Apesar do estado colonial propor-se publicamente como “aliado”, na verdade, investe recursos massivos para espionar alvos nos Estados Unidos, como o caso de Pollard ilustra bem.

Israel e seus defensores alegam que Pollard não passou de um incidente único e que “Israel aprendeu sua lição”, como disse Miriam Adelson recentemente. Mas nada poderia ser menos verossímil.

Em um episódio bastante recente, em 2015, Israel lançou uma campanha majoritária de espionagem contra os Estados Unidos, a fim de sabotar as negociações do governo Obama sobre o programa nuclear iraniano. Os esforços de Tel Aviv não angariaram êxito e o acordo de fato avançou. Porém, o sucessor de Obama, o republicano Donald Trump – sem dúvida, sob influência de seus doadores de campanha, os Adelsons – reverteu o compromisso americano em atenuar as sanções em troca de inspeções regulares ao programa de energia atômica do Irã. Trump foi além e impôs sanções ainda mais duras contra Teerã. No fim, Israel conseguiu o que tanto queria.

Sheldon Adelson, certa vez, defendeu lançar bombas nucleares sobre o Irã – logo, uma postura anti-iraniana de sua esposa não é surpresa alguma. Em entrevista na sexta-feira (5), Biden afirmou que manterá por ora as duras sanções da era Trump. Um retorno dos Estados Unidos ao Plano de Ação Conjunta Global, assinado em 2015, parece distante. O líder na Casa Branca pode ter mudado, mas a política sionista dos Estados Unidos continua a mesma.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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Palestina: quatro mil anos de história
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