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Testemunha relata a execução Abdul Fattah al-Sharif por um soldado de Israel

Colonos observam enquanto forças israelenses evacuam o corpo de Abdel Fattah al-Sharif, morto por Elor Azaria, médico do exército israelense, Hebron (Al-Khalil), Cisjordânia ocupada, 24 de março de 2016 [foto de arquivo]
Colonos observam enquanto forças israelenses evacuam o corpo de Abdel Fattah al-Sharif, morto por Elor Azaria, médico do exército israelense, Hebron (Al-Khalil), Cisjordânia ocupada, 24 de março de 2016 [foto de arquivo]

À medida que colonos ilegais israelenses intensificam seus ataques contra civis palestinos na cidade ocupada de Al-Khalil (Hebron), os residentes palestinos continuam a mobilizar sua forte campanha de resistência popular.

Um dos canais de resistência é a organização Human Rights Defenders (HRD) – “ organização palestina não-partidária de base, que trabalha para apoiar a resistência popular não-violenta, por meio de ações diretas e documentação de violações de direitos humanos cometidas pela ocupação [israelense].”

Para compreender melhor a situação em Hebron, conversei com Badee Dwaik, chefe da HRD; Raghad Neiroukh, jornalista; e Flora Thomas, ativista britânica de solidariedade ao povo palestino.

Contudo, a conversa incluiu também outro membro do HRD, Imad Abu Shamsiyah, corajoso ativista que registrou em vídeo o assassinato do jovem palestino Abdul Fattah al-Sharif e detalhou-me o episódio.

Em 24 de março de 2016, o médico do exército israelense Elor Azaria assassinou al-Sharif a sangue frio, na cidade de Hebron, Cisjordânia ocupada. O Exército de Israel alegou mais tarde que al-Sharif, junto de outro palestino, tentou esfaquear um soldado israelense.

O assassinato foi corretamente descrito como “execução extrajudicial” por grupos de direitos humanos. Sob pressão internacional, Israel realizou um julgamento contra Azaria, pelo qual o condenou a dezoito meses de prisão. As autoridades da ocupação, no entanto, eventualmente o soltaram, apenas catorze meses depois. Azaria foi recebido como herói por muitos políticos israelenses, por sua família e por cidadãos comuns.

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Perguntei a Abu Shamsiyah sobre os eventos daquele dia, quando testemunhou em primeira mão e registrou em vídeo a execução do jovem palestino.

“Era cerca de 8 horas da manhã e eu tomava café com minha esposa. Ouvi o som de um tiro do lado de fora, muito perto de minha casa”, contou-me o ativista. “Saí imediatamente para ver o que estava acontecendo; minha esposa me seguiu e trouxe a câmera com ela … descobri que havia uma pessoa jogada na rua; vestia uma camiseta preta e calça comprida”.

Prosseguiu: “Vi que havia outra pessoa no chão. Movimentei a câmera para tentar registrá-la e percebi que sangrava no rosto … observei alguns soldados israelenses se aproximando de uma das pessoas no chão; estavam muito perto de mim”.

“Percebi que Abdul Fattah al-Sharif era palestino somente quando um dos soldados de Israel começou a chutá-lo … quando o chutou, al-Sharif mexeu suas pernas e mãos. Registrei tudo isso com minha câmera”, relatou Shamsiyah.

 

Execução extrajudicial à luz do dia, em Hebron (Al-Khalil), Cisjordânia ocupada, março de 2016

“Naquele momento, minha esposa começou a gritar: ‘Haram, haram’. Tentei ajudar o jovem ferido … quando os soldados ouviram seus gritos, perceberam nossa presença na rua e então nos expulsaram, nos enxotaram dali”, continuou o ativista palestino de Hebron. “Fui para casa e comecei a pensar em outro jeito de continuar a filmar. Subi no telhado de um dos vizinhos e voltei a gravar a execução.”

“Vi uma ambulância israelense chegando ao local, mas ela não foi em direção a al-Sharif. Ao contrário, foi em direção a outra pessoa que ainda estava caída no chão. Somente então percebi que a outra pessoa era de fato um soldado Israelense.”

“Dei zoom na imagem da câmera para capturar melhor a figura do soldado, que parecia levemente ferido. A ambulância realizou os primeiros socorros e o tratou rapidamente; negou qualquer cuidado a al-Sharif e o outro palestino ferido.”

“Carregaram o soldado israelense para dentro da ambulância; ampliei a imagem novamente e ele já estava de pé. Como disse, estava apenas levemente ferido”, reiterou Shamsyiah.

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“A ambulância começou a dar a volta para deixar o local. Foi então que ouvi o som de um dos soldados carregando sua arma. Ele se aproximou cada vez mais aonde estava al-Sharif. Quando ficou a apenas um metro de distância, [o soldado] apontou sua arma para a cabeça de al-Sharif.”

“[Abdul Fattah] al-Sharif não impôs qualquer ameaça soldado, posteriormente identificado pela imprensa como Elor Azaria. Foi aí que Azaria disparou na cabeça do jovem palestino ferido”.

“Eu ainda filmava e um dos colonos judeus, que percebeu minha presença, delatou-me aos soldados. Um dos soldados virou-se em minha direção e deu ordens para que eu deixasse a área. Mas eu já estava de saída porque havia filmado toda a cena.”

“Fui imediatamente ao HRD onde subi o vídeo para a internet e muitas pessoas o viram … Os soldados israelenses matam os palestinos a sangue frio e acusam suas vítimas de tentar esfaqueá-los”, concluiu Shamsiyah.

Após o incidente e ao longo do julgamento de Azaria, Abu Shamsiyah e sua família vivenciaram enorme assédio por parte do Exército de Israel, por revelar a verdade que a ocupação deseja encobrir: a brutalidade de seus soldados e a relação intrínseca entre o exército sionista e os colonos ilegais.

Ao conversar com Abu Shamsiyah, quatro anos depois da morte trágica de al-Sharif, o ativista palestino permanece resoluto em sua crença de que violações de direitos humanos cometidas por Israel, ainda hoje, devem ser expostas. Sua voz revela determinação; nenhuma hesitação ou medo.

A organização Human Rights Defenders, como muitos outros grupos palestinos, continua a canalizar e orientar a resistência popular do povo palestino em Hebron e muitas cidades e aldeias por toda a Palestina ocupada. Tais grupos representa uma declaração explícita da resiliência da sociedade palestina – valente, resistente, inabalável.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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