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Meu coração dói por Mianmar e Caxemira, por Idlib e Aden

Uma criança síria recebe tratamento médico após um ataque químico executado pelo regime de Bashar Al-Assad, em Idlib, Síria [Agência Anadolu]

O que acontece aos muçulmanos ao redor do mundo? O que é essa perseguição, violência e racismo aos quais estão submetidos em todo canto que olhamos?

Muçulmanos rohingyas sofrem no Mianmar. Os homens são queimados vivos, crianças são mortas e mulheres são estupradas. O povo rohingya sofre deslocamentos massivos de suas cidades e aldeias na maior campanha de limpeza étnica já registrada pela ONU. A entidade internacional alertou que podemos esperar um desastre de grandes proporções caso o governo de Mianmar mantenha sua abordagem racista.

A Organização das Nações Unidas pode alertar e registrar os fatos; no entanto, suas advertências possuem nenhum valor ou sentido sem resultados efetivos, resoluções definitivas e medidas punitivas, como é estipulado pela Carta das Nações Unidas, especificamente Cláusula Sete, que define: todas as resoluções do Conselho de Segurança são obrigatórias aos estados-membros.

No entanto, podemos questionar: quando foi que a ONU de fato foi justa com os muçulmanos e árabes em geral? A organização foi especificamente estabelecida para o benefício das superpotências globais, não para auxiliar os povos vulneráveis e desamparados pelo mundo. Se este não fosse o caso, teria garantido todos os meios de justiça, por exemplo, ao povo palestino, ao confrontar os crimes e a brutalidade da ocupação ilegal de Israel.

A questão dos muçulmanos rohingyas ainda não é um assunto passado; seus problemas com o governo racista de Mianmar não foram resolvidos. Contudo, o mundo esqueceu-se da tragédia, por um breve momento, quando nos deparamos com um novo drama afligindo outro grupo islâmico: o povo uigur na província de Xinjiang, na China – embora eu prefira chamá-la de Turquestão Oriental, nome atribuído à região antes da colonização chinesa. Tais ocupantes torturam cotidianamente a população local; os muçulmanos uigures são submetidos às mais hediondas formas de humilhação, opressão e racismo pelo estado chinês.

Muçulmanos rohingyas fogem para Bangladesh após perseguição no Mianmar

O Turquestão Oriental, este país esquecido, localiza-se no distante noroeste da China, predominantemente muçulmano, com uma população de mais de nove milhões de pessoas. A área tem maioria uigur, etnia local que fala um idioma túrquico. Foi ocupada pela China em 1881, e ganhou independência após a guerra civil chinesa de 1944. No entanto, voltou a ser ocupada em 1949, quando a República Popular da China foi estabelecida, ao declarar o comunismo como seu sistema político. Esta área é rica em recursos naturais, incluindo petróleo, gás natural e urânio. A China governa com mão de ferro, ao saquear os recursos e as riquezas uigures, assassinar e torturar homens muçulmanos e estuprar suas esposas. Os muçulmanos locais também foram proibidos de praticar sua religião e foram forçados a denunciar o islamismo para sobreviver.

De fato, a China aparentemente construiu campos especiais onde detém ao menos um milhão de muçulmanos uigures, segundo relatório divulgado pela rede internacional BBC. Imagens de satélite registraram o campo cercado por uma enorme cerca e dezoito torres de vigilância. Aos olhos do mundo, agências de notícias e redes internacionais de imprensa exibiram imagens de torturas cometidas contra muçulmanos uigures. Os governos do Ocidente condenaram as ações e políticas de Pequim. Além disso, vinte e dois embaixadores enviaram uma carta ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas na qual também criticavam políticas chinesas na região e exigiam que o conselho condenasse a tirania e as flagrantes violações de direitos humanos executadas pela China contra os muçulmanos da chamada província de Xinjiang.O maior dos escândalos que aflige nossos corações, no entanto, é o fato de que, ao invés de correr em auxílio aos muçulmanos em todo o mundo, salvá-los da tortura e da limpeza étnica e apoiá-los contra os governos criminosos e racistas, alguns dos estados árabes e islâmicos – nomeadamente Arábia Saudita, Síria, Kuwait, Catar, Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Omã, Argélia, Egito, Sudão e Paquistão – decidiram emitir uma segunda carta assinado por um total de 33 países, justamente se opondo às declarações do embaixador. De modo bastante cruel, expressaram ali seu apoio à política chinesa em Xinjiang e descreveram-na como uma das grandes conquistas de direitos humanos pelo governo de Pequim. “Diante de grandes desafios, frente ao terrorismo e ao extremismo,” afirmaram tais países, “a China assumiu uma série de medidas de contraterrorismo e desradicalização em Xinjiang, incluindo o estabelecimento de centros de educação vocacional e de treinamento.” Os países islâmicos ainda reiteraram que uma suposta segurança foi salvaguardada, à medida que as pessoas passaram a sentir-se mais felizes, realizadas e seguras.

Em suas palavras, os cruéis campos de detenção nos quais os muçulmanos são forçados a renunciar ao islamismo são “centros de educação vocacional e de treinamento”. Os signatários árabes e islâmicos mudaram de postura: de um estranho silêncio diante dos atos brutais da China contra o povo uigur a de fato defender a opressão chinesa. São cúmplices dos crimes da China contra o povo uigur. Que desgraça é isto; quão baixo tais governos são capazes de descer? Fico sem palavras, já não sei o que dizer; já não posso processar ou compreender o que acontece. Todas as máscaras de decência e justiça caíram nas capitais por todo a região.

O que melhor descreve o estado da ummah – comunidade internacional islâmica – são as palavras do poeta palestino Mahmoud Darwish.

Caída está a máscara por sobre a máscara

Que antes vos cobre a máscara.

Caída está a máscara!

Não tens irmãos, irmão meu,

Sequer amigos, ou castelos, amigo meu.

Árabes que obedeceram aos francos

Árabes que venderam suas almas

Árabes, perdidos.

Caída está a máscara

A máscara caiu.

Na próxima semana, continuarei a discutir outras tragédias que afligem os muçulmanos ao redor do mundo, devido à fraqueza coletiva de seus representantes, cujo último exemplo é o movimento da Índia em revogar a autonomia da Caxemira, de maioria islâmica.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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