Islamismo, Raça e Rebelião nas Américas: Ecos Transatlânticos das Jihads da África Ocidental

Adel Hamedi
5 meses ago

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A escravidão nas Américas representou um dos fenômenos mais terríveis da história da humanidade, com milhões de africanos sendo arrancados de suas terras natais e transportados à força para o Novo Mundo para trabalhar em condições desumanas. No cerne dessa escuridão emergiram histórias de resistência e resiliência, principalmente o papel dos muçulmanos da África Ocidental, que trouxeram consigo não apenas seus corpos acorrentados, mas também uma rica herança religiosa e cultural. Apesar da opressão e das indignidades a que foram submetidos, esses muçulmanos contribuíram para acender o espírito de rebelião e lideraram movimentos de resistência contra o sistema escravista das plantações. Eles se basearam em seus valores islâmicos e tradições jihadistas, que serviram tanto como fonte de inspiração quanto como ferramenta de organização diante da injustiça. Esta introdução estabelece as bases para uma compreensão mais profunda da relação entre religião, identidade e libertação, conforme explorada em profundidade por Daud Abdullah em seu estudo.

Em seu livro mais recente, “Islam, Race and Rebellion in the Americas: Trans-Atlantic Echoes of the West African Jihads” (Islã, Raça e Rebelião nas Américas: Ecos Transatlânticos das Jihads da África Ocidental), Daud Abdullah oferece uma leitura reveladora e aprofundada da história dos muçulmanos escravizados nas Américas. Ele abre uma janela para uma dimensão histórica da diáspora africana nas Américas, há muito marginalizada — o papel do Islã e das jihads da África Ocidental em inspirar revoltas e levantes contra o regime brutal da escravidão nas plantações.

O livro destaca os horrores da escravidão nas Américas e no Caribe, um sistema no qual os africanos foram reduzidos às formas mais baixas de desumanização, rotulados com nomes degradantes como “mulas de açúcar” e “escravos do algodão”. Ele destaca como o legado cultural e intelectual dos movimentos de jihad na África Ocidental influenciou profundamente os escravos muçulmanos transportados para o Novo Mundo, afirmando que as ideias e os conflitos predominantes nas sociedades da África Ocidental cruzaram o Atlântico com eles.

O autor argumenta que o islamismo nas Américas não foi meramente um resíduo cultural ou uma coleção de rituais passageiros, mas sim uma força intelectual e política sustentada — um motor central de resistência e rebelião que preservou a identidade negra diante da escravidão e da perseguição e contribuiu para remodelar a história na direção da liberdade.

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O livro explora um debate central nos estudos sobre escravidão — entre acadêmicos como Eric Williams, que argumentava que a escravidão era principalmente uma construção econômica, e outros como a jornalista americana e vencedora do Prêmio Pulitzer Nikole Hannah-Jones, que via a escravidão como um fenômeno puramente racial. Abdullah demonstra que o Islã era mais do que uma religião; era uma força cultural e política que fortalecia a resistência dos escravizados e desafiava o sistema escravista opressivo.

O livro também traça o contexto histórico da escravidão transatlântica, começando com o uso inicial de escravos da África Ocidental por Portugal na Europa, justificado por motivos religiosos e autoritários consagrados em decretos papais. Examina como os antagonismos cristãos-muçulmanos medievais se estenderam às colônias escravistas do Novo Mundo, com a profunda hostilidade portuguesa contra os muçulmanos sendo transferida para o Brasil e outras regiões.

O autor explora as raízes da tradição da jihad na África Ocidental, examinando como movimentos como o liderado pelo xeque Usman dan Fodio na atual Nigéria influenciaram revoltas nas Américas. O livro investiga as diferenças sutis nas práticas de escravidão entre as colônias espanholas e inglesas, particularmente na forma como os escravizados interagiam com as línguas e culturas europeias. Os escravos muçulmanos preservaram notavelmente a alfabetização árabe como um meio secreto de comunicação.

Posteriormente, no capítulo quatro, Abdullah destaca o papel dos escravos muçulmanos em revoltas específicas, como a revolta de 1835 na Bahia, Brasil, onde lideraram uma rebelião armada inspirada nos ensinamentos islâmicos, utilizando a língua árabe e as mesquitas como ferramentas de mobilização — um sinal claro de coesão cultural e espiritual, apesar da dura opressão.

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Islã, Raça e Rebelião nas Américas explica que a relação entre escravos e seus senhores nas Américas era marcada por constante tensão, alimentada por raízes históricas que remontavam às Cruzadas e aos conflitos medievais entre cristãos e muçulmanos. Os muçulmanos escravizados nunca se renderam; mantiveram sua identidade religiosa e cultural e estavam dispostos a morrer pela liberdade, inspirados pelo conceito islâmico de martírio.

Este livro afirma ainda que o impacto dessas revoltas estendeu-se além da resistência à escravidão — elas lançaram as bases para os movimentos de Volta à África, ajudaram a desencadear movimentos pan-africanistas e de raízes, e deram origem a novas correntes islâmicas na diáspora africana no século XX, como o Templo da Ciência Mouro, a Nação do Islã e os movimentos pelos direitos civis.

O autor conclui que o islamismo nas Américas não foi meramente um resíduo cultural ou um conjunto passageiro de rituais. Foi um movimento intelectual e político contínuo — uma força central por trás da resistência e da rebelião que preservou a identidade negra diante da escravidão e da opressão e contribuiu para direcionar o curso da história em direção à libertação.

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