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Gaza está sendo asfixiada pelas forças israelenses

Permissão para entrada de ajuda humanitária ínfima em Gaza serve como cortina de fumaça para simular o fim do cerco

21 de maio de 2025, às 13h50

Complexo hospitalar do Nasser foi atingido por um bombardeio israelense no dia 19 de maio, pela terceira vez em dois meses. [MSF]

Uma quantidade insuficiente de ajuda humanitária está recebendo permissão para entrar na Faixa de Gaza, servindo apenas como cortina de fumaça para simular o fim do cerco ao território. Na última semana, pelo menos 20 instalações médicas foram danificadas ou forçadas a encerrar suas atividades de forma parcial ou total, por causa do avanço das operações terrestres israelenses, do aumento dos bombardeios aéreos e das ordens de evacuação generalizadas.

A população em Gaza tem vivido em desespero por cuidados médicos e ajuda humanitária. As autoridades israelenses precisam interromper a asfixia deliberada do território e a aniquilação de seu sistema de saúde, que sustentam a campanha de limpeza étnica em curso.

“A decisão das autoridades israelenses de autorizar a entrada de uma quantidade ridiculamente inadequada de ajuda em Gaza, após meses de cerco total, demonstra a intenção de evitar a acusação de levar a população à fome, quando, na verdade, mal permitem a sobrevivência das pessoas”, diz Pascale Coissard, coordenadora de emergências de Médicos Sem Fronteiras (MSF) em Khan Younis, sul de Gaza. “Este plano é uma forma de instrumentalizar a ajuda, transformando-a em uma ferramenta para alcançar os objetivos militares das forças israelenses.”

Antes de outubro de 2023, cerca de 500 caminhões de ajuda humanitária entravam diariamente em Gaza, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU). Atualmente, apenas 100 caminhões por dia estão sendo autorizados — uma quantidade extremamente insuficiente diante da gravidade da situação.

Enquanto isso, as ordens de evacuação continuam a deslocar a população, e as forças israelenses mantêm intensos ataques às unidades de saúde.

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No dia 19 de maio, entre as 6h e as 6h30, equipes de MSF relataram ter ouvido quase um bombardeio por minuto em Khan Younis. Um desses ataques atingiu o complexo hospitalar Nasser, a apenas cem metros da unidade de terapia intensiva e do setor de internação administrados por MSF. Esta é a terceira vez em dois meses que o complexo hospitalar Nasser é atingido, privando novamente a população de tratamento e cuidados médicos.

Para reduzir a exposição ao perigo, as equipes de MSF foram forçadas a fechar temporariamente o ambulatório e a sala de sedação para pacientes em cirurgia ou recuperação, além de suspender atividades de fisioterapia e de saúde mental — essenciais para pacientes com queimaduras, a maioria deles crianças.

Ataque ao estoque do Nasser pressiona ainda mais a situação dos suprimentos médicos em Gaza. ©MSF

O ataque desta segunda-feira também danificou gravemente o estoque de medicamentos do Ministério da Saúde dentro do Hospital Nasser, agravando a situação dos estoques médicos, que já estão criticamente baixos devido ao cerco a Gaza.

Como parte da expansão das operações terrestres, as forças israelenses emitiram ordens de evacuação em larga escala, limitando ainda mais o acesso da população aos cuidados médicos e dificultando a atuação de MSF. No dia 19 de maio, por exemplo, uma ordem de evacuação incluiu quase toda a parte leste de Khan Younis — perto do hospital Nasser — e forçou as pessoas a se deslocarem imediatamente para a região de Al Mawasi.

Segundo o site Management Cluster, mais de 138.900 pessoas foram deslocadas à força entre os dias 15 e 20 de maio deste ano. Os intensos bombardeios e as ordens de evacuação em Khan Younis forçaram MSF a manter apenas atividades vitais nas salas de emergência das clínicas de Al Attar e Al Mawasi. Desde segunda-feira, a clínica Al Hakker, em Deir Al Balah, também foi fechada. Antes disso, as equipes de MSF realizavam mais de 350 atendimentos por dia, incluindo cuidados pediátricos, pré-natais e pós-natais, primeiros socorros psicológicos e tratamento nutricional ambulatorial, entre outros serviços.

Em 15 de maio, as autoridades israelenses emitiram uma ordem de evacuação para a unidade de saúde básica Sheikh Radwan, na Cidade de Gaza, o que forçou o fechamento da instalação. Antes disso, com apoio de MSF, as equipes do Ministério da Saúde ofereciam no local cerca de 3 mil consultas por dia, em uma área com população estimada em 250 mil pessoas. Este era o último centro público de saúde básica totalmente funcional na região.

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Segundo o Ministério da Saúde, após o cerco ao Hospital Indonésio, todos os hospitais públicos do norte de Gaza estão agora fora de operação. No hospital de campanha de MSF em Deir Al Balah, a capacidade de leitos atingiu 150% nos últimos dias, forçando a ampliação da equipe e o acréscimo de 20 leitos à estrutura original. De acordo com a ONU, atualmente existem cerca de mil leitos hospitalares funcionais em toda a Faixa de Gaza — antes da guerra, a capacidade era de 3.500.

Os ataques contra civis e unidades de saúde devem cessar imediatamente, e a ajuda precisa entrar em Gaza em quantidades suficientes e de forma que possa chegar a quem precisa. Os aliados de Israel devem exercer toda a sua pressão para que isso aconteça com máxima urgência. Cada dia perdido reforça a cumplicidade na aniquilação da população de Gaza.

Publicado originalmente em Médicos Sem Fronteiras