Portuguese / English

Middle East Near You

O incremento das relações Brasil – Arábia Saudita

Vice-presidente do Brasil, Geraldo Alckmin, ao lado de ministros e de representantes do governo da Arábia Saudita, em Riad, 3 de junho de 2024 [Secom/Divulgação]

Existe um evidente incremento das relações do Brasil com os países de maioria islâmica, árabes e do Golfo. Especificamente, neste artigo, abordamos o avanço nas trocas, assinaturas de convênios e possibilidades de investimentos e comércio bilateral entre nosso país e a Arábia Saudita. Abordemos algumas evidências deste processo.

O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Geraldo Alckmin, embarcou no sábado (1º de junho) para uma viagem a Arábia Saudita e China. O médico descendente de árabes foi liderando uma delegação brasileira de ministros e empresários que busca fortalecer laços, estabelecer cooperação em várias áreas e abrir mercados para produtos brasileiros.

Antes da viagem, Alckmin avaliou que: “Os sauditas têm demonstrado grande interesse em investir no Brasil, e a China é hoje o principal destino de nossas exportações. Teremos uma agenda intensa com autoridades, empresários e investidores e esperamos trazer na bagagem de volta bons acordos e boas perspectivas de negócios para as empresas brasileiras”.

Em Riad, na Arábia Saudita, houve encontro bilateral com o ministro de Investimentos, Khalid Al Falih, e com o ministro da Defesa, príncipe Khalid bin Salman. A agenda saudita incluiu ainda reuniões com empresários e fundos de investimento dos dois países, em que participam o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Confederação Nacional da Indústria (CNI), Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) e Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI).

US$8 bilhões por ano de fluxo comercial 

O vice-presidente também assinou o acordo de cooperação em defesa com o ministro saudita Khalid bin Salman. O documento prevê o aprofundamento das relações entre o Brasil e o Reino da Arábia Saudita em diversas áreas, com foco na indústria, logística e tecnologia.

LEIA: Príncipe saudita investe em nova companhia de IA de Elon Musk

Alckmin informou que houve “boas conversas” sobre as aeronaves da Embraer. Há interesse na venda de modelos da aviação comercial e militar KC-390.

Três memorandos de entendimento também foram assinados durante a visita. A primeira, entre a ApexBrasil e a maior rede de supermercados do Oriente Médio, Lulu, com o objetivo de promover alimentos e bebidas produzidos no Brasil no mercado saudita. Foi também assinado outro memorando de entendimento entre o Ministério do Investimento Saudita (MISA) e a EP Capital, com o objetivo de fortalecer o corredor bilateral de investimento entre os dois países. O MISA também assinou um memorando de entendimento com o Pátria Investimentos, igualmente com foco na facilitação de investimentos entre países. Vejamos o segundo e mais importante acordo.

Uma das parcerias de investimentos firmada através da intermediação do Poder Executivo brasileiro foi entre o Fundo Soberano Saudita (PIF) e o Fundo Pátria. Este, gerido por brasileiros, com o fundador tendo experiência oriunda no antigo Banco Patrimônio, é a maior gestora de investimentos “alternativos” da América Latina.

No dia 3 de junho os executivos do fundo e o correspondente saudita assinaram um memorando de entendimento para realizar investimentos conjuntos com o Ministério de Investimento da Arábia Saudita. A expectativa é de que o acordo abra caminho para novas empreitadas dos sauditas junto à gestora brasileira, em especial na concessão de rodovias – onde já possuem sociedade. Por sua vez, o Pátria passa a estudar investimentos no reino do Oeste asiático, com olhar atento também para energia e moradias populares.

Segundo os objetivos estratégicos do reino, a meta da década, denominada Visão 2030 “estabelece um roteiro para a Arábia Saudita construir uma sociedade vibrante, um país próspero economicamente e uma nação ambiciosa. Para permitir isso, o reino está se abrindo e diversificar a sua economia para transformá-la numa potência de investimento global. A Visão também estabelece a meta de aumentar o investimento estrangeiro direto (IDE) para 5,7% do PIB e a contribuição do setor privado de 40% para 65% do PIB, de modo que devemos estar entre as 15 maiores economias do mundo até 2030.”

LEIA: Representantes islâmicos se reúnem com oficiais em Brasília no Dia da Nakba

Para dar conta desta meta, a diversificação de investimentos e parcerias é fundamental. Dentro dos objetivos da economia doméstica saudita, está a melhoria das condições materiais de vida da população, em especial no quesito habitação e infraestrutura urbana.

Acordo de vistos de turismo e negócios

A aproximação que se nota nas altas autoridades, no primeiro escalão de ambos Estados, também se vê refletida na facilidade para a visitação de nacionais. Em 27 de maio, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Decreto Legislativo 463/2022, que abrange o acordo entre Brasil e Arábia Saudita sobre a concessão de vistos de visita para cidadãos de ambos os países. O texto foi aprovado em plenário e será enviado ao Senado. Segundo o acordo, ambos os países concederão aos cidadãos da outra parte vistos com múltiplas entradas e de finalidade exclusiva de visita (turismo ou negócios).

Segundo o PDL 463/2022, “o acordo terá validade de cinco anos, podendo ser renovado automaticamente, e exige respeito a leis, regulamentos e tradições vigentes nos territórios. As partes se reservam o direito de negar entrada, abreviar a validade do visto ou terminar a estadia sempre que tiverem preocupações relativas a determinados indivíduos”.

Após aprovação o texto vai ser apreciado no Senado, onde deve avançar sem muitas dificuldades. O Grupo Parlamentar Brasil – Arábia Saudita tem representação das distintas vertentes políticas com peso hoje no Congresso. Sua nominata é composta assim: presidente, senador Wellington Fagundes – PL/MT; vice-presidente, senador Rogério Carvalho – PT/SE; primeiro secretário: Senador Esperidião Amin – PP/SC; e segundo secretário: deputado José Rocha – UNIÃO/BA.

LEIA: Arábia Saudita abrirá a primeira casa de bebidas alcoólicas para diplomatas

Note-se que a presença constante neste tipo de trabalho – de aproximação de Estados árabes ou de maioria islâmica – é do ex-governador catarinense Esperidião Amin, ele próprio descendente de libaneses (o pai era um comerciante de tecidos filiado a antiga União Democrática Nacional – UDN). Em demandas pragmáticas de relações exteriores, o político com origem na ARENA –apoiador da ditadura militar – se porta muito distante de seus aliados ideológicos – islamofóbicos e sionistas.

Voltando ao acordo, o que se observa é uma possibilidade maior de turismo de nacionais brasileiros para a Arábia Saudita, considerando o razoável aumento dos seguidores do islamismo no país. O inverso também é verdadeiro, pois a população saudita passa de 38 milhões de habitantes, sendo que mais de 80% residem em áreas urbanas. Logo, é um grande potencial turístico que pode ser atraído ao Brasil diante destas facilidades. Acordos assim logo implicam ampliação da malha aérea e criação de roteiros, papel institucional da Empresa Brasileira de Turismo (Embratur).

Tudo indica que as relações que se iniciaram ainda na tomada de empréstimos intermediados – os chamados petrodólares, na década de 1970 – avançaram na venda de commodities agrícolas e produtos alimentícios, até uma real diversificação como a que se nota agora. Esperamos que o processo de tomada de decisões bilaterais (Brasil e Arábia Saudita) esteja à altura do desafio do século XXI, da integração Sul – Sul e da ampliação da arquitetura financeira dos Brics.

LEIA: Lula de volta do Oriente Médio: laços mais fortes com o mundo árabe. Contradições ambientais também

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

Categorias
América LatinaArábia SauditaArtigoÁsia & AméricasBrasilOpiniãoOriente Médio
Show Comments
Palestina: quatro mil anos de história
Show Comments