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Reavaliando a estratégia dos EUA no Oriente Médio: a ascensão do Irã e a ameaça ofuscada da China

Pessoas caminham pelas ruas de Teerã enquanto continuam suas vidas diárias após as explosões ouvidas nas cidades de Isfahan e Tabriz, no Irã, em Teerã, Irã, em 19 de abril de 2024. [Fatemeh Bahrami - Agência Anadolu].

Na complexa tapeçaria da geopolítica global, o recente ataque com mísseis do Irã contra alvos israelenses marca uma mudança crítica no paradigma de segurança do Oriente Médio. Esse evento, longe de ser um ato de dissuasão, significa um novo equilíbrio de segurança na região, fortemente inclinado a favor do Irã. Essa mudança exige uma profunda reavaliação da política externa dos EUA, especialmente à luz do desafio estratégico mais amplo representado pelo poder crescente da China.

O ataque com mísseis iranianos em 14 de abril não é apenas mais um surto episódico na região; ele representa uma demonstração calculada das capacidades militares aprimoradas do Irã e sua disposição de confrontar diretamente os interesses israelenses. Esse ato anulou efetivamente a viabilidade estratégica do corredor IMEC, uma iniciativa destinada a estabelecer uma zona econômica e de segurança que poderia conter a influência iraniana juntamente com as ambições regionais russas e chinesas. Com o fracasso do corredor, os EUA se encontram em uma encruzilhada, precisando de uma nova abordagem tanto para a estabilidade regional quanto para suas prioridades estratégicas globais.

A teoria realista da política internacional de John Mearsheimer oferece uma lente para visualizar esses acontecimentos. De acordo com Mearsheimer, os Estados são motivados principalmente pela busca de poder em um mundo anárquico, onde as grandes potências inevitavelmente disputam o domínio. Os EUA, na visão de Mearsheimer, deveriam estar estrategicamente concentrados em combater a ascensão da China, seu concorrente mais formidável no cenário global. No entanto, o envolvimento dos Estados Unidos no Oriente Médio, particularmente seu apoio incondicional às ações israelenses sob o comando do primeiro-ministro Netanyahu, exemplifica uma alocação equivocada e significativa de recursos e foco estratégico.

O recente veto do governo Biden a uma resolução da ONU que reconhece a condição de Estado palestino ilustra ainda mais esse passo em falso. Essa ação, embora tenha a intenção de apoiar um aliado, paradoxalmente fortaleceu a posição do Irã no mundo árabe e corroeu a posição dos EUA entre seus aliados árabes tradicionais. Ao parecerem estar incondicionalmente do lado de Israel, os EUA minam sua própria credibilidade e influência na região, fazendo inadvertidamente o jogo da Rússia e da China.

Enquanto isso, a China tem aproveitado essas distrações para reforçar sua posição econômica e militar em todo o mundo. Seus investimentos estratégicos na Ásia, África e América Latina, juntamente com seu papel na intermediação de negociações entre a Arábia Saudita e o Irã, sugerem uma visão de longo prazo que visa a se reposicionar como uma força estabilizadora e uma alternativa viável à hegemonia dos EUA. Enquanto os EUA concentram suas energias no atoleiro do Oriente Médio, a China aumenta discretamente sua influência global, principalmente em regiões críticas para os interesses estratégicos dos EUA, como o Mar do Sul da China e o Indo-Pacífico.

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Dadas as novas realidades no terreno, os EUA devem girar sua estratégia não apenas para lidar com as implicações imediatas do poder crescente do Irã, mas também para voltar a se concentrar na região do Indo-Pacífico, onde o verdadeiro desafio da China à supremacia dos EUA está se cristalizando. O estabelecimento de um Estado palestino independente surge como um componente essencial dessa estratégia. Essa medida atenderia a várias funções estratégicas: aplacaria os aliados dos EUA no mundo árabe, enfraqueceria as bases ideológicas de grupos como o Hamas e reduziria a influência do Irã sobre seus representantes regionais.

Além disso, a defesa de uma Palestina soberana está alinhada com normas internacionais mais amplas e poderia ajudar a restaurar a credibilidade dos EUA em relação aos direitos humanos e à resolução de conflitos. Isso também sinalizaria para aliados e adversários que os EUA são capazes de adaptar suas estratégias em resposta às mudanças na dinâmica geopolítica, fortalecendo, assim, sua posição na negociação de outros acordos internacionais, especialmente em relação à contenção das ambições da China.

Os EUA devem, portanto, recalibrar sua política externa não apenas para lidar com as complexidades do Oriente Médio, mas também para enfrentar adequadamente o desafio sistêmico representado pela China. Isso envolve a retirada de compromissos militares excessivamente estendidos e, em vez disso, a utilização de ferramentas diplomáticas e econômicas para estabilizar regiões voláteis. Ao mesmo tempo, os EUA precisam fortalecer alianças e parcerias no Indo-Pacífico, investindo em tecnologias emergentes e aprimorando suas capacidades militares para combater diretamente o expansionismo chinês.

Considerando a postura ainda ambivalente da política externa do Irã, os Estados Unidos têm uma janela de oportunidade crucial para envolver Teerã de forma que possa realinhar suas afiliações regionais e alianças globais. Reconhecendo as nuances e a possível flexibilidade nas relações exteriores do Irã, os EUA devem explorar todos os caminhos diplomáticos para afastar o Irã da influência da China e da Rússia. Isso envolveria alavancar as necessidades econômicas do Irã, as preocupações com a segurança e o orgulho histórico de sua soberania e influência regional, apresentando alternativas que se alinham melhor aos interesses estratégicos de longo prazo do Irã do que as parcerias atuais com Pequim e Moscou poderiam oferecer.

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Os EUA estão em um momento crucial, no qual devem escolher entre continuar com seus compromissos dispendiosos em campos de batalha inúteis, como o Oriente Médio e a Ucrânia, ou realocar seu foco para combater as manobras estratégicas da China. A escolha determinará não apenas os resultados regionais, mas os contornos futuros da dinâmica do poder global. O caminho a seguir requer um reconhecimento claro das novas realidades geopolíticas e uma disposição ousada para buscar a estabilidade estratégica de longo prazo em vez de ganhos táticos de curto prazo.

No entanto, os Estados Unidos parecem ter optado por compromissos onerosos e contínuos, como evidenciado pela aprovação do pacote de US$ 95 bilhões pela Câmara dos Deputados. Esse financiamento apoia principalmente a Ucrânia e Israel, em vez de adotar uma estratégia de contenção em relação à China.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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