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Palestinos à espera de uma explosão de consciência mundial

Um egípcio segura sua bandeira nacional enquanto profere mensagens contra o presidente Hosni Mubarak na Praça Tahrir, no Cairo, em 10 de fevereiro de 2011. [Pedro Ugarte/ AFP/Getty Images]
Um egípcio segura sua bandeira nacional enquanto profere mensagens contra o presidente Hosni Mubarak na Praça Tahrir, no Cairo, em 10 de fevereiro de 2011. [Pedro Ugarte/ AFP/Getty Images]

A decisão do Tribunal Internacional de Justiça, a Corte de Haia, de ordenar a Israel que abra caminho para a entrada de comida em Gaza foi bem recebida por lideranças palestinas, que reclamam medidas da comunidade internacional  para enfrentar a tragédia humanitária em curso, mas consideram a decisão insuficiente.  Como apontou o chefe de relações políticas e internacionais do Hamas, Basem Naim,  palestinos esperavam que a corte ordenasse o cessar- fogo para for fim ao sofrimento palestino. E isso não aconteceu.

A manifestação da corte, por outro lado, é vista como mais um ingrediente na receita de uma explosão internacional contra os aliados dessa guerra, sejam governos, empresas ou mesmo universidades, na linha do que ocorreu contra o apartheid na África do Sul, até que a Palestina seja livre.  E é nesta direção que as recentes declarações de países como o Brasil, Colômbia, Nicarágua e, agora, a Irlanda, ao se colocarem ao lado dos argumentos da África do Sul, são vistas por palestinos.

Em uma declaração conjunta, as organizações palestinas Al-Haq, o Centro Al Mezan para os Direitos Humanos e o Centro Palestino para os Direitos Humanos instaram outros países a seguirem o exemplo da África do Sul e reiteraram que “a campanha genocida de Israel não cessará a menos que a comunidade internacional se mobilize eficazmente para pressionar Israel a um cessar-fogo imediato.”

A imprensa voltou a discutir a eficácia da comunidade internacional. Embora vinculativa, a corte não tem como obrigar Israel a cumprí-la. E Israel já não cumpriu a decisão anterior, anunciada em  26 de janeiro de 2023, para que evitasse atos de genocídio. Mas Israel não os evitou e, pelo contrário, intensificou-os.

Como a decisão final em Haia pode demorar muito, até anos, Israel vai usando o tempo para avançar sobre Gaza, destruir sua infraestrutura, deslocar e matar palestinos e fazer planos para uma faixa sob seu controle.  Daí a expectativa de que a opinião pública mundial force mais governos a se manifestar e a comunidade internacional a agir.

No caso do Brasil, as posições sobre o massacre de Israel ganhou uma atenção a mais porque elevou o tom da denúncia ao comparar o sofrimento palestino hoje ao dos judeus perseguidos pelo nazismo na Europa. Para um dos pesquisadores da resistência palestina  ouvidos pelo MEMO, a fala de Lula não mudou as coisas. Mas tocou no que muda: a consciência coletiva global que está  exigindo o fim da agressão aos palestinos.

A repercussão da posição brasileira

Um fato pouco conhecido no Brasil foi relatado pelo pesquisador em Doha: a reação nas redes sociais árabes às declarações do presidente Lula. “Muitos trocaram sua foto de perfil nas redes pela foto do brasileiro”, disse ele. Isso porque Lula reafirmou o que disse e  tornou-se alvo de Israel e da mídia internacional que não admite a comparação do que acontece em Gaza com o Holocausto.

O fato também repercutiu no Fórum Social Mundial, realizado em Katmandu, capital do  Nepal, em fevereiro de 2024,  Lideranças palestinas como Omar Bargouthi, do Conselho Legislativo Palestino,  e Youssef Hasbah, do Conselho Internacional do FSM, se manifestaram agradeceram a solidariedade brasileira, capaz de ampliar as pressões internacionais, e expressaram solidariedade a Lula, por estar sendo atacado também.

LEIA: O Estado sionista e a ofensiva política no Brasil

Após as falas do presidente,  a reação israelense mostrou seu dedo na polarização da política interna do Brasil. Convidou o ex-presidente Jair Bolsonaro  e uma delegação de políticos aliados do ex-mandatário que se dispuseram a ir a Israel para  pedir desculpas desautorizadas, “em nome do povo brasileiro”.  Bolsonaro, porém, não teve como sair do país por ter o passaporte apreendido pela Justiça até que responda aos processos que enfrenta no Brasil. Pela informação do jornal The New York Times de que Bolsonaro passou dois dias pelo menos na embaixada da Hungria, ou seja, fora do Estado brasileiro sem autorização,  as suspeitas de que pense em exílio são razoáveis. O ex-presidente ainda esperava, até esta sexta-feira (28)  reaver seu passaporte para aceitar o convite renovado de Netanyahu. Mas o pedido foi rejeitado pelo ministro do STF Alexandre de Moraes.

“O presidente Lula manifestou apoio aos procedimentos da África do Sul na Corte Internacional de Justiça para investigar as possíveis violações de Israel à Convenção para a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio. O reconhecimento do caso pela Corte e a emissão de medidas imediatas são passos significativos para a responsabilização”, declarou o embaixador.

Mas quando virão medidas concretas?

Ẽ evidente que as pressões dos lobbies sionistas continuam tendo efeito sobre os governos. A pergunta dos palestinos, no entanto, é quando as pressões e declarações contra o genocídio do povo palestino resultarão em medidas concretas para barrar Israel. No caso brasileiro, apesar das posições de Lula, acordos militares com Israel continuam sendo feitos por seu governo.  Prova disso é o contrato de R$ 86,1 milhões firmado entre a FAB e a empresa Israel Aerospace Industries LTD (IAI), para manutenção e logística de dois drones brasileiros e agora questionado no Congresso Nacional or três deputados federais do PSOL.

No caso do Conselho de Segurança, a resolução finalmente aprovada e alardeada na mídia  ainda não levou a um cessar fogo. Pelo contrário, a violência aumentou em Rafah e também se viu mais um atentado contra jornalistas no ataque à tenda de imprensa na área do Hospital Shifa. . No caso da Corte de Haia, a determinação sobre acesso de Gaza à comida teve como resposta o bombardeio direcionado que matou a equipe internacional de ajuda alimentar a Gaza e forçou a retirada de seus colegas.

O teste da tolerância mundial ao genocídio está sendo levado ao limite. Em que momento uma  faísca levará à explosão de consciência que forçará governos e instituições multilaterais a romper e punir o Estado genocida é a questão de tempo que os palestinos esperam que não demore mais.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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Palestina: quatro mil anos de história
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