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Palestinos descrevem caos e terror ao fugir de hospital em Gaza

Mulher lamenta familiares mortos pelos bombardeios israelenses, no necrotério do Hospital Nasser em Khan Yunis, na Faixa de Gaza, em 22 de janeiro de 2024 [Jehad Alshrafi/Agência Anadolu]

Disparos de armas de fogo ecoaram pelos corredores do Hospital Nasser, em Khan Yunis, no sul de Gaza, enquanto pacientes, médicos e refugiados tentavam fugir do local invadido por tropas da ocupação israelense, em uma noite de caos e terror.

Sobreviventes do ataque realizado na última semana ao segundo maior hospital de Gaza — um dos últimos ainda parcialmente operantes — reportaram à agência de notícias Reuters enfrentar uma via crúcis em busca de segurança, em corredores escuros repletos de cadáveres.

Um médico relatou que a captura de um enfermeiro por soldados israelenses, que despiram seu refém e o levaram aos gritos.

Conforme Ahmed al-Mughraby, diretor do Departamento de Cirurgia Plástica, que fugiu do local com sua esposa e filhos: “Havia fumaça por toda a parte. Era como o dia do Juízo Final. Pessoas corriam para todos os lados”.

Mughraby encontrou refúgio com sua família perto de outro centro de saúde onde busca ajudar os necessitados. Segundo seu relato, forças israelenses ordenaram evacuação completa, exceto pacientes incapazes de andar e uma equipe bastante restrita de enfermeiros.

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Detalhes da ofensiva militar ao Hospital Nasser emergiram pouco a pouco à medida que baixava a poeira e seus refugiados chegavam a Rafah, no extremo-sul do território, a somente 10 km de distância. Rafah, designada “zona segura” por Israel, também está sob ataque, apesar de abrigar 1.5 milhão de pessoas no limite da fronteira com o Egito.

Israel insistiu em caracterizar a brutalidade no Hospital Nasser como uma operação de “precisão cirúrgica”, conduzida por Forças Especiais incumbidas de resgatar corpos de reféns. As forças da ocupação chegaram a alegar que não obrigaram a saída de ninguém; contudo, desmentidas por testemunhas em campo.

O ataque também causou alarde entre agências humanitárias. A Organização Mundial da Saúde (OMS) reiterou que os danos deixados são “indescritíveis”. A agência conduziu duas evacuações sucessivas no Hospital Nasser desde quinta-feira (15), mas observou apreensão nesta terça (20) de que aproximadamente 150 pacientes e médicos continuam no local.

Após sitiar o hospital, inclusive com franco-atiradores, forças israelenses finalmente o invadiram na quinta-feira, ao deter centenas de pessoas, descritas pela propaganda colonial sionista como “militantes à paisana”; contudo, sem detalhes ou provas.

O Hamas negou utilizar o centro médico e descreveu as alegações israelenses como “mentiras”.

Segundo o Ministério da Saúde de Gaza, o exército colonial deteve 70 profissionais e voluntários que atendiam aos pacientes. Analistas advertem que — sob verniz de alvejar o Hamas — Israel mantém ataques deliberados à infraestrutura básica do território palestino, a fim de compelir a população — 2.4 milhões de pessoas — a um êxodo em massa.

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No fim de semana, a OMS informou que o Hospital Nasser se manteve operante mesmo após os ataques de Israel; no entanto, sem luz ou água corrente, com acúmulo de resíduos médicos que representam um campo propício à propagação de doenças.

Drones e cães de ataque

Após quase cinco meses de massacres em Gaza, o Hospital Nasser tornou-se a maior instalação médica ainda funcional no território. A campanha israelense matou mais de 29 mil palestinos e feriu quase 70 mil, além de deixar dois milhões de pessoas desabrigadas.

Hakeem Salem Baraka, voluntário no local, informou a destruição completa do Departamento Ortopédico, ao notar ter testemunhado o corpo de um paciente partido em dois pela detonação de um projétil da ocupação.

Segundo Baraka, um drone disparou contra trabalhadores médicos que faziam uma pausa entre os pesados turnos no hospital, enquanto cães “agressivos”, com câmeras instaladas no pescoço, circundavam o hospital.

O exército israelense — novamente sem provas — alegou ter apreendido um grande volume de armas e veículos ligados aos ataques transfronteiriços do Hamas de 7 de outubro.

“Demos às pessoas uma chance para evacuar antes de entrarmos no hospital”, disse o coronel Moshe Tetro à imprensa. Perguntado se houvera algum tiroteio ou combate dentro do hospital, Tetro confirmou, no entanto: “Não”.

Ao deixar o hospital ainda antes do amanhecer, refugiados palestinos tiveram de andar no meio do esgoto, comentou Rasmeya Saleem Abu Jamoos, paciente de diálise que deixou o local junto de seu marido cego, Abu Jamoos.

Apesar de sua deficiência, Jamoos foi detido por soldados israelenses ao deixar o hospital.

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Conforme Mughraby, seu departamento foi atingido por uma leva de disparos israelenses; três pacientes morreram. Após chegar a um checkpoint israelense — onde um enfermeiro foi detido —, seu grupo enfrentou uma árdua jornada em uma terra devastada para obter ajuda. Entre os refugiados, estavam doentes e feridos.

Baraa Ahmed Abu Mustafa, caminhando com auxílio de muletas de pares diferentes, ouviu tiros sobre suas cabeças, ao passar pelos corpos acumulados na porta do hospital — executados de maneira metódica, por dias e dias, por franco-atiradores.

“Estou ferido, caminhei por uma hora”, lembrou Abu Mustafa. “É perigoso e o caminho é ruim”.

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