Mais de 23 mil palestinos em Gaza foram assassinados por Israel em apenas três meses, com ajuda de armas e munição de Washington. Ainda assim, o secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken, insiste em pressionar líderes árabes para conter a violência. Estes, vale dizer, jamais deveriam ter abandonado o povo palestino, e os Acordos de Abraão deram precedente a um novo tipo de cumpliciade. Mesmo a países não-signatários dos acordos de normalização com Israel, a diplomacia já não é a mesma. O sonho de criar alianças com Tel Aviv no Oriente Médio ganhou tração e apoio; de fato, muito mais do que a luta anticolonial palestina em qualquer momento da história. O genocídio perpetrado por Israel na Faixa de Gaza mostrou bem a hipocrisia dos líderes árabes e o isolamento político dos palestinos em sua região.
Contudo, a forma com que Blinken busca contornar a cumplicidade dos Estados Unidos vem se manifestando ao pressionar os países da região a exercer uma suposta influência, após o governo americano inundar as forças agressoras com armas destrutivas. “Queremos que os países da região usem seus contatos com alguns dos agentes que possam estar envolvidos para manter a tampa na panela de pressão e assegurar que não tenhamos uma propagação do conflito”, declarou Blinken após se reunir com líderes da Grécia e Turquia no sábado (6).
O chanceler americano omitiu, contudo, dois aspectos centrais. Primeiro, Israel se considera acima de qualquer lei e age dessa maneira desde sua criação em 1948, nas costa de diversas campanhas terroristas cometidas por milícias coloniais sionistas na Palestina histórica. Além disso, Washington sempre apoiou a mesma história — se não verbalmente, por meio de sua assistência militar.
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À medida que Israel enfrenta o Tribunal Penal de Justiça (TIJ), nesta quinta e sexta-feira, 11 e 12 de janeiro,, o presidente israelense Isaac Herzog declarou que “não há nada mais atroz e absurdo” do que a denúncia de genocídio apresentada pela África do Sul. Os Estados Unidos reforçaram seu apoio à escalada israelense, ao defender ataques a líderes políticos do grupo Hamas em solo estrangeiro, aumentando o risco de propagar a guerra, em particular, após o assassinato a drone de Saleh al-Arouri na cidade de Beirute.
E neste contexto, entre palavras e ações, o que os líderes políticos da região deveriam fazer, exatamente? Dizer aos palestinos que aceitem de bom grado seu deslocamento à força? Ou que aceitem o genocídio que lhes imposto?
O interminável ciclo de violência de que Blinken não cansa de falar não pode acabar apenas com a diplomacia árabe — e o próprio sentimento de abandono do povo palestino confirma este fato. Líderes árabes que capitularam aos Acordos de Abraão, seja por assinarem o pacto ou por deixar de criticá-lo abertamente, expuseram sua dependência da ocupação israelense e da hegemonia dos Estados Unidos. Se Israel é capaz de ignorar impunemente os apelos de Washington por moderação — que sequer chegam ao ponto de pedir um cessar-fogo, mas somente reduzir a escala dos massacres, isto é, do escrutínio —, como é que Israel poderá ouvir a regimes de fachada que jamais, em nenhum momento, obtiveram seu respeito?
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Blinken pede a todos que colaborem com Israel. Se a Casa Branca realmente quisesse baixar a escala de baixas civis na Faixa de Gaza, não mais enviaria armas e munições ao Estado de Israel. Somente agora, após dezenas de milhares de pessoas chacinadas, é que Washington se dispõe a fingir que a diplomacia regional resolverá alguma coisa. Com a mesma hipocrisia, Blinken pede de Tel Aviv, embora em um tom muito mais amansado, que mantenha viável o paradigma de dois Estados, a fim de preservar a aceitação a sua hegemonia. Entretanto, nas mais diversas formas, os regimes do Oriente Médio já fizeram as pazes com a ocupação e a colonização israelenses. Mas levantemos a hipótese: e se, de alguma maneira, a narrativa se voltasse à Palestina e às reivindicações do povo palestino, para que obtenham, de uma vez por todas, aquilo que lhes é de direito?
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