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Brasileiros de volta. E como ficam os acordos com Israel?

Ato em São Paulo aconteceu enquanto os brasileiros faziam seu percurso de Gaza para o Egito e as notícias davam conta de 40 bebês com risco de morte em hospital sem oxigênio. O Brasil indiretamente financia isso?
A Bandeira palestina hasteada durante Ato de Solidariedade ao povo palestino em Gaza, realizado no domingo (12) em São Paulo [ Khaled Aldeek/Monitor do Oriente Médio]

O Brasil vai romper com os acordos que ajudam a financiar a indústria militar e de guerra israelense? Esta foi a principal pergunta ao Brasil, ouvida no Ato em Solidariedade ao Povo Palestino realizado domingo na Avenida Paulista, em São Paulo. Atraindo sempre novos participantes, esta foi a quinta manifestação de rua convocada pela Frente em Defesa do Povo Palestino e entidades e foi realizada em um dia de alívio em relação ao grupo de brasileiros que estava impedido por Israel e Egito de sair de Gaza. Mas foi mais um dia sem tréguas para a população de Gaza, com o sofrimento agravado pela criminosa situação dos internos do Hospital de Shifa, entre eles 40 bebês, cercado por tanques, sem oxigênio e sem eletricidade.

A imagem de mulheres desesperadas, vestidas de preto e com olhos vendados, carregando seus filhos mortos, envoltos em lençóis manchados de sangue, ou peças de vestuários, como um sapatinho de bebê respingado de vermelho, tem sido o símbolo mais forte dos atos que se realizam em São Paulo desde que o massacre começou há mais de um mês na Faixa cobiçada por Israel.  O grupo chamado “Refúgio Zero” tem feito as aberturas e performances,  parte em silêncio ou entoando canções. Em momentos, elas cantam em árabe a voz de crianças que chamam por elas sob os ataques e não podem ser socorridas: “Mãe, onde está você? Mãe, eles estão atirando. Mãe…“ Em português, porém, um grito acusador era dirigido ao mundo todo, por não agir para pôr fim à barbárie: “Parabéns consciência humana!” – a voz isolada era  repetida em coro pelas demais mulheres que erguiam embrulhos de lençol representando as crianças mortas. “Não são apenas os 40 bebẽs” – denunciavam. “ São mais de 6 mil crianças mortas. Parabéns consciência humana!”.

Grupo de mulheres faz performance com canto e jogral para denunciar o infanticídio em massa de Israel durante o Ato de Solidariedade ao povo palestino em Gaza, realizado no domingo (12) em São Paulo  Khaled Aldeek/ Monitor do Oriente Médio]

O ato teve início às 11h, concentrando-se na Praça Oswaldo Cruz, seguindo depois pela Avenida Paulista até a área do Museu de Arte de São Paulo (MASP), com nova concentração e falas de protesto. Todo o percurso teve o tom de denúncia dos crimes de Israel e solidariedade e apoio à causa palestina, expressa nos dizeres que mais se repetiram durante a marcha: “Estado de Israel, Estado assassino! E Viva a Luta do Povo Palestino!”. Mas os discursos se dirigiram também ao governo federal, que festeja a volta dos que estavam em Gaza.

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A saída do grupo pela fronteira de Rafah, liberada na manhã de domingo, e o início da travessia pelo Egito, encerrou um ciclo de dúvidas sobre a real posição brasileira diante dos ataques que o próprio presidente Lula já chamou de genocídio. Ao contrário de países como Colômbia, Chile, Honduras, que chamaram seu embaixador de volta, ou da Bolívia, que rompeu, mais uma vez, relações com Israel, o Brasil se manteve na linha de negociar a volta de seus cidadãos, enquanto buscava aprovar uma resolução de cessar fogo no Conselho de Segurança da ONU.  A justificativa para não elevar o tom repousava em não colocar em risco os diálogos diplomáticos em ambas as frentes de atuação. Em dado momento, o assessor especial Celso Amorim chegou a dizer que o Brasil estaria  “segurando” posições mais críticas da América Latina.

A situação agora é outra. Os brasileiros estão à salvo, depois de muita demora, e o Brasil já não ocupa a presidência mensal temporária do Conselho (que comandou em outubro), onde tentava convencer, sem sucesso, os Estados Unidos a não vetar resoluções de cunho humanitário.

Com mais de um mẽs de ataques diários, com mortes civis que ultrapassaram as 10 mil vítimas, e um morticínio de crianças que não se viu em nenhuma outra guerra, manifestantes na Avenida Paulista aumentaram a pressão. Se o Brasil considera que em Gaza estão ocorrendo crimes de guerra, deve parar de financiá-los através dos acordos de compra de armas, tecnologia e treinamentos de Israel.

Além do governo federal, os Estados também mantêm negócios com a indústria militar de Israel, comprando caveirões para o Rio de Janeiro, blindados israelenses em São Paulo e Fuzis Negev no Amazonas.

O ato foi encerrado com um forte apelo da brasileira, filha de de palestino, Soraya Misleh: “Há um genocídio em curso em Gaza e uma limpeza étnica avançada em toda a Palestina ocupada nessa nova fase da contínua Nakba. Não há meias palavras nessa situação.  Exigimos que o Brasil rompa relações comerciais, militares e diplomáticas com o Estado terrorista de Israel”

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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