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Sobreviventes de carros-bomba na Somália relatam seus traumas

Danos deixados por um atentado a bomba contra um restaurante em Mogadishu, capital da Somália, em 23 de abril de 2022 [Abukar Mohamed Muhudin/Agência Anadolu]

Era uma tarde de sábado. Pessoas ocupadas marchavam de lá para cá em Mogadishu, capital da Somália, quando uma das principais rotatórias da região central se abalou pela explosão de dois carros-bomba que deixou dezenas de mortos.

O grupo terrorista al-Shabaab – ligado à al-Qaeda – assumiu responsabilidade pelo atentado que matou 120 pessoas e feriu outras trezentas. Autoridades temem aumento das baixas; cidadãos continuam desaparecidos.

Sobreviventes que falaram à agência de notícias Anadolu dizem que o atentado foi um dos piores a atingir a cidade.

Safiyo Abdullahi, de 26 anos, viajava em um riquixá na hora do atentado. Sobreviveu ilesa, mas seu motorista não teve a mesma sorte. “Eu estava a caminho do hospital de Kulan, no distrito de Dharkinley, para visitar um amigo. A rotatória estava muito movimentada. Havia carros, motos, riquixás e pessoas em todo canto. De repente, eu fui atingida por uma onda de calor e a terra tremeu sobre meus pés. Então, eu ouvi as explosões. Foi um milagre, mas eu sobrevivi”.

O ataque ocorreu na intersecção de Zoobe, um dos cruzamentos mais ocupados em Mogadishu. Neste mesmo lugar, cinco anos atrás, em 14 de outubro, um caminhão carregado de explosivos explodiu. Mais de 600 pessoas morreram; outras mil – na maioria, civis – foram feridas.

Ali Abdi Bulle, de 37 anos, empresário de Mogadishu, relatou que estava perto de uma agência bancária, prestes a realizar um depósito, quando ocorreu a detonação. Após o primeiro ataque, dezenas de pessoas correram à cena, recordou Bulle. “A situação era caótica; havia destroços e sangue por toda a parte. Então, as forças de segurança chegaram e nos mandaram ir embora”. Pouco depois, uma outra bomba explodiu. “Pela graça de Deus, eu sobrevivi. Mas sete de meus amigos morreram na hora”, concluiu Bulle com lágrimas nos olhos.

Hospitais sob pressão

Jornalistas, estudantes, comerciantes e agentes de segurança estavam entre as vítimas dos dois ataques. As instalações de saúde de Mogadishu – já bastante debilitadas – tentavam às pressas socorrer os feridos. Os hospitais foram superlotados devido ao alto índice de pessoas e famílias que buscavam seus entes queridos.

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As autoridades somalis formaram um comitê, encabeçado pelo Ministro da Saúde Ali Haji para coordenar a resposta de emergência após o presidente Hassan Sheikh Mohamud pedir socorro internacional. Turquia, Egito, Arábia Saudita e Quênia foram abordados para enviar médicos ao país empobrecido do Chifre da África. Mohamud conversou com o presidente turco Recep Tayyip Erdogan, que lhe ofertou condolências. Ambos afirmaram urgência em arrancar pela raiz o mal do terrorismo internacional.

Anos de conflito deixaram o setor de saúde da Somália em frangalhos, em processo contínuo de reconstrução. Emergências complexas incorrem sobre a estrutura sanitária uma atrás da outra.

Ayub Mohamed, enfermeira no hospital de Daarushifa em Mogadishu, observou à Anadolu que, apesar do país ter um sistema de saúde “bastante frágil”, as pessoas se uniram para ajudar seus irmãos em necessidade. “Após o atentado, vi jovens unidos se organizarem e irem aos hospitais para doar sangue – mas não era o suficiente”.

O governo lançou uma campanha por doações de sangue. O Ministério da Saúde corroborou as dificuldades em transportar por ar centenas de feridos. Ademais, a Somália carece de um banco de sangue e hospitais privados cobram as vítimas pelas transfusões.

A Turquia condena o ataque

Na segunda-feira, Erdogan condenou veementemente o atentado terrorista “hediondo” contra a Somália. “Não há desculpa para matar civis inocentes, crianças a caminho da escola, pessoas orando nas mesquitas”, insistiu. “Condenamos este ataque vil e traiçoeiro e desejamos a nossos irmãos e irmãs somalis que fiquem bem logo”.

A Somália luta contra uma persistente crise de segurança há anos. O al-Shabaab representa um dos maiores desafios. Desde 2007, a organização filiada à al-Qaeda conduz uma campanha mortal contra o governo e forças estrangeiras que operam no país, às custas de milhares de vidas.

A Organização das Nações Unidas (ONU) alertou sucessivas vezes para a instabilidade crescente no pequeno país do Chifre da África. Seus relatórios periódicos sobre a Somália detalham riscos impostos pelo al-Shabaab e grupos alinhados à organização terrorista Estado Islâmico (Daesh). Ao menos 1.242 civis foram mortos por atentados na Somália entre 2018 e 2019; outros 1.735 foram feridos, estimou a ONU.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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