O sionismo bolsonarista e sua última jogada

Nos atos ameaçadoramente golpistas de 7 de setembro, a primeira dama Michelle Bolsonaro afirmou em seu discurso: “Deus abeçoe Israel”. Até aqui nenhuma novidade, apenas o reforço da ligação entre as grandes lideranças empresariais pentecostais e neopentecostais generosamente denominadas de “evangélicas” no apoio ao apartheid na Palestina Ocupada e à extrema direita brasileira. Se Bolsonaro é o “trumpismo tropical”, sua “guerra cultural” passa pela defesa da herança ocidental “judaico-cristã”, balela esta que se materializa no Mandato Britânico na Palestina e depois na consumação de um Estado feito por invasores europeus na parcela cananeia da Grande Fenícia.

A condição objetiva desta relação vai dos discursos do deputado federal Eduardo Bolsonaro (também conhecido como Duda Bananinha), dos estranhos contratos junto a empresas de espionagem eletrônica com dados comutados no complexo de segurança de Tel Aviv, até a pregação escancarada de cabos eleitorais do protofascismo como Silas Malafaia, empresário também dedicado a organizar viagens para a Palestina Ocupada (com direito a escala em Dubai).

Para além desta consagrada reprodução da extrema direita estadunidense, associando o apoio militar aos ocupantes com proselitismo supostamente religioso de alta rentabilidade, a reta final da campanha presidencial de 2022 se depara com uma novidade.

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O suposto padre ortodoxo não canônico

Kelmon Luís da Silva Souza é baiano, tem 45 anos, e concorre à Presidência pelo PTB, no lugar de Roberto Jefferson, que não obteve autorização da Justiça. Após sua aparição no debate do SBT (rede que pertence ao empresário Senor Abravanel, vulgo Silvio Santos), o país ficou estarrecido ao verificar a existência de um pároco oriundo das mais tradicionais igrejas do oriente e, em tese, seguidor dos passos do profeta Issa. O mesmo pregador, além de ser um apoio permanente de Jair Bolsonaro (notório aliado do sionismo e do Estado de Istael), tem trajetória na internet com pregações islamofóbicas.

Ao pesquisar como palavra-chave o nome completo do substituto de Roberto Jefferson, simplesmente não consta registro algum na Igreja Síria Ortodoxa. Em 14 de setembro Dom Tito Paulo George Hanna assina texto com ampla difusão refutando qualquer presença ou pertencimento do candidato petebista nesta milenar instituição. Eis que ele, Kelmon, está vinculado a um racha notoriamente anti-comunista de matriz russo, e com matriz peruana, na esteira da presença do proselitismo religioso do período da Guerra Fria.

Logo na sequência, o patriarcado de Antioquia nega sua pertença porque reforça que a suposta igreja de Kelmon não é reconhecida. Em seu site oficial afirma:

“Esclarecemos, portanto e mais uma vez, que a referida “Igreja Católica Apostólica Ortodoxa do Peru NÃO POSSUI qualquer vínculo, relação, dependência, processo em andamento ou ligação oficial (ou extra-oficial) com a Igreja Sirian Ortodoxa de Antioquia ou com nossa Igreja na Índia, tendo a mesma, através de seus representantes legais, renunciado de forma IRREVOGÁVEL qualquer possibilidade de comunhão e aceitação por parte de nossa Igreja.

Aliás, esclarecemos mais uma vez que nenhum de seus “bispos” ou representantes legais hierárquicos jamais foram ordenados, sagrados ou tiveram suas “sagrações episcopais” confirmadas por nenhum bispo ou Patriarca de nossa Igreja, e que qualquer tentativa de utilizar de fotos do período de acompanhamento por nossa Igreja de antes da renúncia caracteriza-se como desonestidade, mentira e difamação.”

Em sua defesa surge mais um pregador. O padre Miguel Phellype é vigário episcopal da Igreja Ortodoxa do Peru no Brasil. Segundo o próprio, em entrevista para o UOL, o padre Kelmon seria um legítimo representante desta instituição.

Supostamente o candidato é vinculado a Igreja Católica Ortodoxa do Peru e esta é derivada da Igreja da Bielorrúsia no exílio. O não reconhecimento entre antioquinos tradicionais é admitido na seção “quem somos”, mas entra em conflito com o que está sendo exposto na capa do sitio oficial. Sobre a condição de “igreja não reconhecida”, está admitido.

“A Igreja Católica Apostólica Ortodoxa do Peru (ICAOP) é ​​considerada uma igreja “não-canônica”, pois não é reconhecida pelos patriarcados ‘tradicionais’. O problema da ‘não-canonicidade’ de uma Igreja surge de problemas políticos que preocupam muitas igrejas. Houve igrejas que nasceram como ‘não canônicas’, mas depois foram aceitas por diferentes razões por alguns dos patriarcados tradicionais, tornando-se ‘canônicas’ da noite para o dia.”

Estamos diante de uma instituição religiosa não reconhecida por seu patriarcado e em busca de formas de se legitimar. Para tal, o processo de institucionalização passa pelo engajamento político, característica constitutiva desta igreja no exílio.

Como adepto recente, o neófito Kelmon Luís faz difusão e propaganda cibernética. Em seu canal na plataforma Youtube, um dos vídeos postados traz o título de “Seja defensor de nossa cultura judaico cristã”, onde em tese conspirtatória, afirma que a grande mídia quer acabar com “nossa matriz cultural”. Já na coletânea de imagens do vídeo intitulado “Theotokianos: Defesa da Fé Cristã”, há uma profunda e proposital confusão onde aparecem cruzados, acusações de apostasia salafista junto com uma mescla de islamofobia e pregação de costumes liberais progressistas. É a insanidade programada da tal “guerra cultural” anti-globalista ou qualquer outra imbecilidade semelhante. A audiência é pífia, mas a regularidade chama atenção. O segundo vídeo citado é de 2013 e o primeiro de 2020.

A pregação contra os árabes também é recorrente. Kelmon afirmou no 1º de maio de 2021, em pleno carro de som da extrema direita: “Onde a espada de Gideão passou, nenhum midianita ficou em pé.” Ao ganhar notoriedade com a campanha presidencial, o suposto sacerdote entra como linha auxiliar de Bolsonaro e tenta montar uma cunha no difuso voto da extrema direita mais próxima do catolicismo brasileiro. Curiosamente, a entrevista do “padre não canônico” no site do PTB – o partido pelo qual concorre ao Poder Executivo federal – não estava com o domínio válido no momento que este artigo foi escrito.

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A origem deste suposto religioso que transtorna a vida de quilombolas na Ilha de Maré, em Salvador Bahia, foi publicizada pelo professor e historiador Leandro Pereira Gonçalves, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Este acadêmico, muito respeitado entre os pares, está entre os maiores especialistas nacionais a respeito dos fascismos brasileiros e suas derivações contemporâneas. Kelmon e sua antiga Associação Theotokos estão ligados a panfletos difamatórios já na campanha presidencial de 2010. No IV Congresso Nacional do Movimento Integralista, o alegado “padre” foi palestrante. Trata-se, pura e simplesmente, de um fascista brasileiro, ainda que sob “nova roupagem”.

Bolsonaro é aliado do apartheid na Palestina Ocupada 

A jogada da linha auxiliar com o “padre” Kelmon é mais uma etapa da aproximação de uma obtusa leitura do Antigo Testamento com um criativo modelo de negócios onde ganha mais quem blasfema sem dó o legado e as pegadas do profeta Issa. Nenhum governo brasileiro anterior rompeu com a “teoria do empate” (que pela assimetria de forças acaba também sendo pró-Israel) e menos ainda envolveu seu núcleo familiar diretamente com as agendas do Ministério de Assuntos Estratégicos e Diplomacia Pública do Estado Colonial.

Grosso modo, a extrema direita reproduz o apoio incondicional dado pelo complexo industrial militar dos EUA para seu aliado estratégico com a finalidade de executar a Doutrina Wolfowitz. No Brasil – salvo raras exceções de antissemitismo na ultra direita nacional – essa aliança continua. Se faz presente também nos discursos, falas públicas, ostentando bandeiras do apartheid em atos bolsonaristas e demais circunstâncias de rito político.

Caso venha a ser derrotado nas urnas, o protofascismo não vai sumir das ruas e nem do cenário político brasileiro. Situação semelhante se dá na presença do sionismo como ideologia supremacista em escala societária brasileira. A luta é imediata mas também de longo prazo, expondo os empresários blasfemadores e denunciando as campanhas anti-árabe produzidas por esses elementos.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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