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Autoridade Palestina pisa nas liberdades civis e de imprensa: em benefício de quem?

Menina palestina durante protesto contra a morte do ativista Nizar Banat, após ser preso por forças policiais da Autoridade Palestina, na cidade de Ramallah, Cisjordânia ocupada, 27 de junho de 2021 [Abbas Momani/AFP via Getty Images]

O assassinato do ativista político e proeminente opositor Nizar Banat, em custódia da Autoridade Palestina, na Cisjordânia ocupada, ainda reverbera sonoramente na política nacional. A morte de Banat revelou indícios de um aumento na política de repressão da Autoridade Palestina, sem qualquer respaldo ou freio judicial. Também demonstrou que a liderança palestina busca hoje apertar o cerco à liberdade de opinião e expressão.

A forma brutal com que foi morto implica ao ato um caráter de dissuasão a todo e qualquer um que ouse opôr-se à Autoridade Palestina e suas políticas. O assassinato foi precedido por um contundente declínio nas liberdades de imprensa na Cisjordânia ocupada, incluindo fechamento de instituições de mídia, imposição de uma abusiva lei de crimes cibernéticos e mesmo empecilhos deliberados à distribuição de jornais e revistas. Houve também uma campanha regular de prisões e convocações policiais contra jornalistas, escritores e usuários das redes sociais.

Por que a Autoridade Palestina matou Nizar Banat? [Sabaaneh/Monitor do Oriente Médio]

Por que a Autoridade Palestina matou Nizar Banat? [Sabaaneh/Monitor do Oriente Médio]

Os ataques da Autoridade Palestina contra dissidentes abrangem violência física, detenção e convocação arbitrária, perseguição judicial, entre outros. Tais meios são impostos a jornalistas, blogueiros e formadores de opinião e demonstram o caráter deliberado e contundente da repressão às liberdades civis e de imprensa.

Um aspecto latente que impõe efeitos negativos às liberdades de expressão e opinião nos territórios palestinos é a crise financeira que atinge a mídia independente. Recursos são efetivamente desperdiçados nos canais oficiais da Autoridade Palestina, ao manipular indicações profissionais e ignorar o princípio de oportunidades igualitárias. Além disso, a imprensa oficial dissemina um discurso francamente faccionário, ao invés de falar em nome do povo palestino.

A Autoridade Palestina continua a utilizar sua emissora de televisão como plataforma para disparar acusações infundadas contra grupos de oposição, sem conceder de fato uma oportunidade de resposta. O canal tornou-se ainda uma rede unipartidária sob controle absoluto da presidência, incluindo a linha editorial de seu noticiário.

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Como se não bastasse, a Autoridade Palestina mantém a pressão a jornalistas contratados para que escrevam sobre qualquer coisa senão política, ao constranger uma espécie de autocensura à redação, como adendo à flagrante vigilância de suas forças de segurança. Profissionais de imprensa desenvolveram certa paranóia sobre a possibilidade do regime monitorar seus computadores e considerar seus escritos profissionais legítimos como peças de subversão política. Trata-se de um temor majoritário aos jornalistas palestinos e deveria também nos consternar no exterior.

Em meio à forte repressão conduzida pelo Serviço de Segurança Preventiva e Inteligência Geral da Autoridade Palestina, mesmo o equipamento de trabalho é frequentemente confiscado. Ademais, não há qualquer sistema legal ao qual podem recorrer os jornalistas em busca de proteção, mesmo após detenção e tortura sem sequer acusação. O propósito de tais prisões é dissuadir e silenciar a cobertura de mídia.

Conversei com muitos jornalistas palestinos afetados pela política de repressão da Autoridade Palestina. Muitos corroboram casos de espancamento, agressão física e verbal, detenção em cubículos insalubres, entre outras violações. Jornalistas palestinos costumam ser impedidos de viajar e sentem-se prisioneiros em sua própria terra. Incapazes de exercer sua profissão, muitos foram forçados a abandonar sua carreira.

Além dos abusos supracitados, em 2017, o Presidente da Autoridade Palestina Mahmoud Abbas emitiu a Lei n°16 sobre crimes cibernéticos, marcada por uma linguagem propositalmente ambígua sob conceitos como segurança de estado, conflito racial, paz civil, ordem pública, segurança comunitária e prejuízo à união nacional. A legislação carece flagrantemente de objetividade, de modo a ser utilizada para fins políticos e perseguição. Caso sua redação fosse clara e precisa, talvez poderíamos impedir a injustiça politicamente motivada que vivenciamos. Sabemos afinal porque a Lei n°16 foi mantida tão vaga.

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Junto das políticas arbitrárias empregadas pela Autoridade Palestina contra jornalistas, o brutal assassinato do ativista de oposição Nizar Banat sugere que a liderança na Cisjordânia ocupada abandonou enfim qualquer disfarce de servir aos interesses do povo palestino. De fato, a Autoridade Palestina parece ter sucumbido à barbárie e ao caos, identificada no momento presente como “terrorismo de estado”. Os serviços de segurança da Autoridade Palestina poderiam exterminar Banat com um tiro disparado por um assassino anônimo, mas escolheram não fazê-lo. Preferiram tornar seu assassinato público e evidentemente cruel, como alerta a qualquer eventual opositor.

Conter as liberdades civis e de imprensa jamais repousa no melhor dos interesses da população, tampouco assassinar ativistas por suas opiniões políticas e sua busca por justiça. Portanto, a qual interesse serve a Autoridade Palestina? Em benefício de quem?

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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