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A árvore de dinheiro dos Estados Unidos e sua ajuda a Israel

Apoiadores de Israel carregam bandeiras nacionais durante uma marcha em Nova Iorque, Estados Unidos, 4 de junho de 2017 [Mohammed Elshamy/Agência Anadolu]
Apoiadores de Israel carregam bandeiras nacionais durante uma marcha em Nova Iorque, Estados Unidos, 4 de junho de 2017 [Mohammed Elshamy/Agência Anadolu]

Em 21 de dezembro, o Congresso dos Estados Unidos aprovou um pacote de resposta ao coronavírus como parte de um projeto de lei majoritário, estimado em US$2.3 trilhões, para cobrir o orçamento do restante do ano fiscal. Como de costume, os parlamentares americanos destinaram uma soma massiva em recursos a Israel.

Enquanto o desemprego – portanto, a pobreza – decola em solo americano, como resultado da pandemia, os Estados Unidos decidiram que essencial mesmo é conceder à ocupação israelense uma “assistência de segurança” no valor de US$3.3 bilhões, além de US$500 milhões para cooperação no desenvolvimento de mísseis entre ambos os países.

Embora um mísero pagamento de US$600 para ajudar famílias carentes nos Estados Unidos tenha se arrastado por meses e meses, sob intenso debate, quase não houve discussão entre os políticos americanos sobre a vasta soma concedida a Israel, para a qual não há qualquer contrapartida.

O apoio ao estado sionista é considerado prioridade bipartidária e, por décadas, representa o item mais estável na agenda de política externa dos Estados Unidos. O mero questionamento de como Israel utiliza tais recursos – não importa se a ajuda militar é destinada ativamente à ocupação ilegal da Palestina, assentamentos exclusivamente judaicos, planos de anexação e expropriação de terras palestina ou violação de direitos humanos – é um enorme tabu.

Um dos poucos legisladores a exigir que a ajuda a Israel fosse condicionada ao respeito a direitos humanos fundamentais foi o Senador Bernie Sanders, do estado de Vermont, figura de destaque entre os pré-candidatos do Partido Democrata à presidência dos Estados Unidos. “Não podemos dar carta branca ao governo israelense … Temos o direito de exigir respeito aos direitos humanos e à democracia”, declarou Sanders, em outubro de 2019.

Seu adversário democrata nas prévias eleitorais, o presidente eleito Joe Biden, logo reagiu: “A ideia de removermos ajuda militar a Israel, como alguns sugerem, é bizarra”.

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Não é segredo que Israel é o principal receptor internacional de recursos americanos desde a Segunda Guerra Mundial. Segundo dados divulgados pelo Serviço de Pesquisa Congressional dos Estados Unidos, o estado sionista recebeu US$146 bilhões em dinheiro oriundo dos contribuintes americanos, até novembro de 2020.

Entre 1971 e 2007, o grosso destes recursos provou-se fundamental para auxiliar Israel a estabelecer uma base econômica forte. Desde então, a maioria dos investimentos é atribuída a objetivos militares, incluindo segurança do intensivo empreendimento israelense para impor assentamentos ilegais, exclusivamente judaicos, nos territórios palestinos ocupados.

Apesar da crise financeira de 2008, recursos dos Estados Unidos continuaram a fluir a Israel, cuja economia sobreviveu praticamente intacta à recessão global.

Em 2016, os Estados Unidos prometeram ainda mais dinheiro. O governo democrata de Barack Obama, descrito frequente e equivocadamente como hostil a Israel aumentou o envio de recursos americanos em uma margem significativa. Um memorando de entendimento com prazo de dez anos instituiu um acordo entre Washington e Tel Aviv, no qual os Estados Unidos concordaram em fornecer US$38 bilhões a Israel em ajuda militar, entre os anos fiscais de 2019 e 2028. Trata-se de um aumento gritante de US$8 bilhões, comparados aos dez anos anteriores, cujo prazo foi concluído em 2018.

Os novos recursos americanos são divididos em duas categorias: US$33 bilhões em concessões militares internacionais e US$5 bilhões adicionais ao desenvolvimento de mísseis.

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A generosidade americana é historicamente atribuída à influência sem igual de grupos de lobby sionista, com destaque para o Comitê de Assuntos Públicos Israelo-Americano (AIPAC). Os últimos quatro anos, porém, demandaram pouco esforço de tais grupos, dado que agentes poderosos dentro do próprio governo tornaram-se defensores majoritários dos interesses israelenses.

Além das “gratuidades políticas”, aparentemente intermináveis, outorgadas a Israel pelo atual presidente Donald Trump, nos anos recentes, há agora uma série de considerações políticas sobre maneiras de acelerar o prazo de entrega dos recursos remanescentes previstos pelo último memorando de entendimento, quantia equivalente hoje a US$26.4 bilhões. Segundo documentos oficiais do congresso, os Estados Unidos “podem também aprovar vendas adicionais de jatos F-35 e acelerar a entrega de aeronaves de transporte e reabastecimento KC-46A a Israel”.

Não obstante, tais remessas massivas não são os únicos recursos e regalias destinados a Israel. Muito mais corre por trás dos bastidores, seja por meios indiretos ou meramente promovidos sob o rótulo flexível de “cooperação”.

Por exemplo, entre 1973 e 1991, uma soma de US$460 milhões em recursos americanos foi atribuída a reassentar judeus estrangeiros em Israel. Muitos destes novos imigrantes são agora militantes israelenses, muitas vezes extremistas, que habitam os assentamentos ilegais na Cisjordânia ocupada. Neste caso em particular, o dinheiro foi pago a uma fundação privada conhecida como Apelo Israel Unido que, em troca, concedeu fundos à Agência Judaica – órgão que exerceu um papel central na criação do Estado de Israel, sobre as ruínas das cidades e aldeias palestinas, em 1948.

Sob o disfarce de doações filantrópicas, dezenas de milhões de dólares foram enviados regularmente a Israel na forma de “concessões dedutíveis de impostos a assentamentos judaicos na Cisjordânia e Jerusalém Oriental”, reportou o jornal The New York Times. Muito do capital investido, falsamente propagandeado como doações com fins religiosos ou educacionais, costuma encontrar seu caminho à compra de propriedades para colonos ilegais, “além de cães de guarda, coletes à prova de balas, escopetas e veículos para assegurar os postos avançados nas áreas ocupadas”.

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É bastante comum que o dinheiro americano acabe nos cofres públicos do estado sionista, sob pretextos falaciosos. Por exemplo, o último pacote de estímulo fiscal incluiu US$50 milhões para financiar a Sociedade Nita M. Lowey para Recursos de Paz no Oriente Médio, que supostamente investe em “trocas interpessoais e cooperação econômica … entre israelenses e palestinos, com o objetivo de apoiar uma solução negociada e sustentável de dois estados”.

Na verdade, tais valores não possuem qualquer propósito declarado em particular, dado que Washington e Tel Aviv mantêm esforços para garantir a obstrução das negociações de paz, ao trabalhar lado a lado para preservar a imagem da agora defunta solução de dois estados.

A lista é infindável, de modo que a maior parte dos recursos não são incluídos nos pacotes assistenciais oficiais dos Estados Unidos, portanto, com pouca ou nenhuma fiscalização, muito menos cobertura midiática.

Em fevereiro de 2019, os Estados Unidos detiveram todos os recursos destinados à Autoridade Palestina, com sede na Cisjordânia ocupada, além de cortar todas as doações à Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA), recurso fundamental para manter serviços urgentes de educação básica e saúde a milhões de refugiados palestinos.

A julgar por seu legado de apoio contínuo à máquina militar israelense e à expansão colonial em curso na Cisjordânia, Washington insistirá em servir como principal benfeitor a Israel – ou ainda parceiro direto –, enquanto abandona absolutamente o povo palestino. Esperar um papel construtivo por parte dos Estados Unidos, em direção à justiça na Palestina, não apenas reflete uma ingenuidade indefensável, como também uma ignorância conveniente.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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