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O homem do rei: a nomeação de Blinken garante a Israel que pouca coisa mudará sob Biden

Secretário de Estado nomeado Antony Blinken (R ) com o presidente eleito dos EUA, Joe Biden, durante evento de anúncio do gabinete em Wilmington, Delaware, em 24 de novembro de 2020. [Chandan Khanna/ AFP via Getty Images]
Secretário de Estado nomeado Antony Blinken (R ) com o presidente eleito dos EUA, Joe Biden, durante evento de anúncio do gabinete em Wilmington, Delaware, em 24 de novembro de 2020. [Chandan Khanna/ AFP via Getty Images]

O direitista primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, não tem nada com que se preocupar, já que o homem que lidará diretamente com a política externa dos Estados Unidos no Oriente Médio é um amigo leal de Israel. Crise evitada.

A nomeação de Antony J. Blinken pelo presidente eleito, Joe Biden, como seu Secretário de Estado, foi um golpe de mestre, de acordo com o novo gabinete. Blinken é um veterano do Departamento de Estado, um forte crente em uma aliança ocidental liderada pelos Estados Unidos e um verdadeiro amigo de Israel.

A mensagem imediata que Biden desejou comunicar por meio dessa nomeação em particular – e também da nomeação de Jake Sullivan como o novo Conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos – é que os Estados Unidos voltarão à sua posição padrão de líder global, e longe da agenda de política externa “América em Primeiro Lugar” de Donald Trump.

Enquanto os europeus estão animados por ter seus benfeitores americanos de volta, a nomeação de Blinken foi voltada principalmente para apaziguar Israel.

A derrota de Trump nas eleições de novembro gerou muita ansiedade em Washington e Tel Aviv. Os israelenses estavam temerosos de que o ‘Acordo do Século’ de Trump, que era essencialmente a aquiescência americana a todas as exigências de Israel, fosse interrompido. O governo Biden, por outro lado, permanece cauteloso quanto à relação contenciosa que Netanyahu teve com o último governo democrata de Barack Obama.

A escolha de Blinken para preencher o papel de principal diplomata da América deve ter sido considerada em vários contextos políticos: um, que Israel precisava de uma garantia americana imediata de que Biden continuará com o legado de Trump; dois, que o novo secretário de Estado precisava corresponder ao amor de Israel expresso pelo secretário de Estado que está saindo, Mike Pompeo; e três, que o assunto do programa nuclear do Irã deve ser tratado com a maior sensibilidade.

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Biden não apenas conseguiu fazer a escolha mais oportuna, mas os israelenses também estão absolutamente encantados. Comentários feitos por líderes israelenses de todos os principais partidos políticos saudaram o gesto de Biden, declarando unanimemente que Blinken é ‘bom para Israel’.

Os políticos pró-Netanyahu estão particularmente felizes e ansiosos por se engajar na política externa americana liderada por Blinken. Dore Gold, um associado próximo de Netanyahu que também serviu como diretor-geral do Ministério das Relações Exteriores de Israel, disse ao jornal israelense Haaretz, que estava “impressionado” com Blinken e “o considerava muito profissional e um bom ouvinte”.

Ao contrário das atitudes “simplesmente difíceis” de outros funcionários da administração Obama, Gold considerou Blinken “muito aberto”, sem qualquer “tipo de tom anti-Israel”.

Gold se referia à uma reunião ocorrida no Departamento de Estado dos EUA em 2016, na qual concluiu que Blinken “era um cara muito bom”, razão de sua opinião atual de que Blinken “pode ​​ser uma influência muito positiva”.

Blinken deixou a reunião com impressão semelhante (sobre Gold). “Diante de ameaças regionais sem precedentes, o diretor-geral do Ministério das Relações Exteriores de Israel, Dore Gold, mostrou o firme apoio à segurança (de Israel)”, Blinken tuitou na época.

O ex-assessor de segurança nacional adjunto do presidente Barack Obama, Anthony Blinken, fala na abertura da Cúpula da Concordia de 2016,  no Grand Hyatt New York, em 19 de setembro de 2016, na cidade de Nova York. [Paul Morigi / Getty Images para Concordia Summit]

O ex-assessor de segurança nacional adjunto do presidente Barack Obama, Anthony Blinken, fala na abertura da Cúpula da Concordia de 2016, no Grand Hyatt New York, em 19 de setembro de 2016, na cidade de Nova York. [Paul Morigi / Getty Images para Concordia Summit]

Outros israelenses compartilham o mesmo sentimento de Gold, refletindo um entendimento coletivo de que Biden não reverterá nenhuma das medidas tomadas por seu antecessor. A ex-ministra das Relações Exteriores, Tzipi Livni, também expressou seu otimismo em relação aos rumos das relações EUA-Israel. Como a maioria dos israelenses, ela não teve escrúpulos com a generosidade Trump-Pompeo e agora tem certeza de que a dupla Biden-Blinken será igualmente benevolente com Israel.

De acordo com o Haaretz, Livni acredita que “Biden e Blinken irão abraçar e desenvolver as medidas tomadas por Trump que estavam ‘de acordo com os interesses de Israel’.”

Uma vez que todas as medidas pró-Israel tomadas pela administração Trump foram classificadas sob o ‘Acordo do Século’, e lembrando que Biden provavelmente não reverterá qualquer uma dessas medidas, segue-se que a agenda política de Trump também será defendida pela próxima administração. Embora os israelenses fiquem tranquilos com essa percepção, a liderança palestina parece alheia a isso.

Depois de falar com autoridades palestinas, a revista Time resumiu as expectativas da Autoridade Palestina como gestos meramente técnicos e diplomáticos, como a reabertura da missão palestina em Washington, a criação do Consulado dos EUA para Palestinos em Jerusalém Oriental e a restauração do financiamento.

A incapacidade palestina de avaliar a natureza do desafio também se refletiu no discurso dos políticos árabes israelenses. Ayman Odeh, o líder da grande coalizão política árabe de Israel, chegou à conclusão de que “Biden tirará da mesa o Acordo do Século”, mas aponta corretamente que Biden não colocará nenhuma pressão sobre Israel.

Embora seja verdade que Biden dificilmente pegará emprestado qualquer terminologia divisiva de Trump, ele, com certeza, manterá vivo o espírito do ‘Acordo do Século’. O ‘Acordo’ consistia em medidas específicas dos EUA com o objetivo de validar as reivindicações ilegais de Israel sobre a Ocupada, Jerusalém Oriental, a Cisjordânia e as Colinas de Golan, e a desvinculação da normalização árabe com Israel do assunto da ocupação israelense. É provável que nada disso mude, mesmo se o termo “Acordo do Século’ for totalmente descartado.

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Esta conclusão não deve eliminar completamente a possibilidade de um futuro confronto entre Tel Aviv e Washington. Se houver desacordo, não será sobre as ações ilegais de Israel na Palestina, mas sobre a probabilidade de os Estados Unidos reiniciarem as negociações com o Irã a respeito de seu programa nuclear.

Com relação ao Irã, a mensagem de Netanyahu para Biden é decisiva e pouco diplomática. “Não pode haver volta ao acordo nuclear anterior”, advertiu o primeiro-ministro israelense em 22 de novembro. Com esse aviso em mente, Blinken achará extremamente difícil reprimir os temores israelenses de que, ao engajar diplomaticamente o Irã, os EUA não o estarão abandonando Israel. As garantias americanas a Israel provavelmente virão às custas dos palestinos: uma mão israelense livre na expansão de assentamentos ilegais, ainda mais armas americanas de ponta e apoio incondicional dos EUA nas Nações Unidas.

A política externa de Biden provavelmente será uma continuação do ‘Acordo do Século’ de Trump, embora sob uma designação diferente. É desconcertante que a liderança palestina não consiga ver isso, concentrando-se, em vez disso, em conduzir os EUA de volta a um status quo fracassado, onde Washington cegamente apoiava Israel enquanto recompensava os palestinos por seu silêncio.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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