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Tensões entre Israel e Jordânia permanecem sob controle

Jordanianos protestam contra acordo de gás natural entre Jordânia e Israel, na capital Amã, 3 de janeiro de 2020 [Laith Al-Jnaidi/Agência Anadolu]
Jordanianos protestam contra acordo de gás natural entre Jordânia e Israel, na capital Amã, 3 de janeiro de 2020 [Laith Al-Jnaidi/Agência Anadolu]

Os palestinos acompanham a escalada de tensões entre Israel e Jordânia com grande proximidade, diante da conjuntura de intenções israelenses de anexar territórios ocupados da Cisjordânia e Vale do Jordão. Há ameaças também de Tel Aviv de subir as apostas contra o reino. Um novo capítulo de uma relação bastante frágil pode ter começado.

Diante de crescentes temores em Israel sobre as consequência das anexações planejadas, preocupações emergem sobre a posição jordaniana. O Rei Abdullah II relatou à revista alemã Der Spiegel que o plano poderá levar a um confronto majoritário entre Amã e Tel Aviv, embora não tenha mencionado a revogação do tratado de paz de Wadi Araba. A resposta israelense variou entre seriedade e indiferença; as ameaças de Amã foram descritas como “vazias”, embora as declarações do monarca tenham tomado as manchetes.

Os israelenses enfatizam que a Jordânia não possui capacidades para ameaçar Israel, pois o reino enfrenta uma grave crise econômica e anteriormente pediu auxílio da comunidade internacional para conter a propagação do covid-19. Portanto, enquanto ouviam com cuidado às ameaças, concluíram que a Jordânia enfrenta crise sem precedentes, logo sem potencial de agir sobre o que diz o rei. Israel pode então impor sua soberania aos territórios ocupados sem preocupar-se com a Jordânia, ao menos porque o reino, afinal, depende dos Estados Unidos e de seu aliado sionista para sobreviver.

Sobretudo, israelenses alertam contra permitir que ameaças jordanianas frustrem anexações; o reino, insistem, não deve ser capaz de vetar o plano. Isso ocorre pois os líderes do bloco Azul e Branco (Kahol Lavan), então parceiros do Likud no governo, alertam para o risco de que tais medidas possam ter impacto nas relações com a Jordânia, portanto, caracterizadas por alguns grupos políticos como irresponsável.

De fato, o Rei Abdullah não ameaçou revogar o tratado de paz com Israel porque trata-se de garantia essencial à sobrevivência jordaniana, à medida que Israel guarda as chaves para o apoio econômico ao reino, através de canais para fornecer água e gás natural. Os Estados Unidos ainda lideram o apoio militar e financeiro, aos índices de US$1.8 bilhão por ano.

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As declarações do rei foram precedidas por mensagens de Amã a oficiais de segurança israelenses, o que sugere pressão doméstica ao cancelamento de Wadi Araba. Representaria um golpe à segurança de Israel, pois o reino concede tranquilidade relativa à fronteira oriental e a liderança do exército israelense sabe muito bem disso.

Todavia, isso não quer dizer que tratam-se de relações estáveis; muitos jordanianos detestam a ocupação de Israel e não há apoio popular para estabelecimento de “planos de paz” com o estado sionista. Caso o mapa político da Jordânia se altere, poderá resultar em um novo regime que prefira revogar o tratado.

Os israelenses que subestimam os perigos inerentes a anexar o Vale do Jordão alegam que possuir uma barreira israelense no local, ao invés de palestinos, também está de acordo com interesses jordanianos. Entretanto, ignoram a opinião pública sobre a anexação e seu impacto à paz. Destacam que Israel já compartilha fronteira com a Jordânia e rejeitam o argumento de “segurança” pela anexação. Mesmo a Jordânia é cautelosa sobre danificar tais relações com os israelenses, em parte, devido à segurança, que representa importância vital para a monarquia.

Jordânia proíbe israelenses de entrar na área de Al-Baqura [Sabaaneh/Monitor do Oriente Médio]

Jordânia proíbe israelenses de entrar na área de Al-Baqura [Sabaaneh/Monitor do Oriente Médio]

Entretanto, declarações sobre a Jordânia feitas pela extrema-direita israelenses são danosas, como são as incursões coloniais em curso e os planos contra a Mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém ocupada, que ainda está sob responsabilidade nominal do reino. A política israelense em Jerusalém é vista como ameaça pela tutoria hashemita sobre os recursos islâmicos e cristãos na cidade.

Diversos incidentes de segurança contribuíram para o declínio das relações Israel-Jordânia, como os tiroteios provenientes da Embaixada de Israel em Amã, que resultaram na morte de dois jordanianos, em 2017. O assassino recebeu tratamento digno de tapete vermelho por Netanyahu, o que enfureceu o Rei Abdullah. Este incidente seguiu-se da prisão dos cidadãos jordanianos Heba Al-Labadi e Abdul Rahman Miri, que levou o rei a convocar o retorno de seu embaixador em Israel.

O Rei Abdullah busca melhorar sua popularidade doméstica, ao fazer com que Israel pague o preço por tais incidentes. Um israelense que entrou na Jordânia ilegalmente foi preso e posto sob julgamento, por exemplo. Isso aumentou as tensões e hostilidades entre os países.

Alguns dias antes, o Exército da Jordânia executou manobras com força aérea, tanques, infantaria e engenheiros sob supervisão do rei e do príncipe herdeiro, para simular confrontos com invasão de forças hostis. Todos os jordanianos compreenderam que “hostil” significava “israelense”.

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Em 2019, o rei inspecionou o território jordaniano arrendado por Israel em 1994, após o acordo expirar, sem renovação. Tratou-se de uma mensagem clara aos jordanianos de que reconquistaram soberania sobre a terra em questão. Em entrevista ao The New York Times, o rei afirmou que as relações com Israel estão em seu pior nível histórico.

Círculos militares e de segurança israelenses preferem não debater cooperação com a Jordânia, mas o registro conjunto nos diz muito. Tais cooperações envolvem rodadas intensivas e ininterruptas de coordenação de inteligência e segurança. Israel, por exemplo, alerta imediatamente a Jordânia de qualquer ameaça externa a sua estabilidade doméstica.

Nada disso contradiz a crença prevalecente de que a anexação prevista por Israel ao Vale do Jordão terá impacto negativo em uma relação já desgastada com a Jordânia. É certo que a contagem regressiva à anexação provocará protestos populares no reino hashemita, que deverá levar o Rei Abdullah a assumir medidas drásticas frente a Israel. Tudo isso é absolutamente possível, mesmo em consideração da importância de não romper o fino laço que une ambos os países. No momento, portanto, a tensão permanece sob controle.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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