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Soldados israelenses em Gaza ostentam má conduta

O último ‘problema de segurança’ de Israel: quem é culpado pela crise ambiental em Gaza?

Palestinos enchem galões de água em estação de tratamento devido à falta de água potável no território de Gaza, em 5 de novembro de 2013 [Ashraf Amra/Apaimages]

Ao escrever para a publicação semanal americana The Jewish Journal sob o título “A Spillover Crisis: How Gaza’s Water Shortage Affects Israel” (em tradução livre, “Uma crise entornada: Como a falta de água em Gaza afeta Israel”), Dominik Doehler examina a relação direta entre os problemas de acesso à água em Gaza e Israel.

Doehler oferece uma explicação científica por trás da crise de água da Faixa de Gaza sitiada; contudo, algo dá errado no momento em que é necessário atribuir responsabilidades sobre o problema. Ao invés de reconhecer como a guerra israelense e o bloqueio duradouro destruíram a infraestrutura de Gaza, o autor decidiu culpabilizar o “conflito vigente entre o Hamas e a Autoridade Palestina” pelos suplícios de Gaza.

“Hoje, aqueles que pagam o preço pelo conflito entre as facções palestinas são os dois milhões de habitantes de Gaza,” escreve Doehler, sem sequer mencionar o papel fundamental de Israel em qualquer aspecto da questão.

A desonestidade do escritor não deveria ser uma surpresa absoluta, considerando a natureza enviesada da publicação. Isto é particularmente sintomático em veículos de imprensa israelenses ou pró-Israel, que costumam fazer vista grossa ao reconhecimento dos fatos, à medida em que ignoram a responsabilidade israelense e culpabilizam somente os palestinos.

Dito isso, é interessante que a crescente crise humanitária em Gaza seja finalmente registrada em Israel como um problema que demanda solução efetiva. No entanto, não é o impacto da crise sobre a população de Gaza o que acendeu a luz de alerta em Tel Aviv, mas sim o possível dano ambiental que a miséria em Gaza pode causar a Israel.

Em 3 de junho, pesquisadores israelenses da Universidade de Tel Aviv e da Universidade Ben-Gurion apresentaram um relatório comissionado pela organização ambiental EcoPeace Middle East, no qual alertaram que “o colapso da infraestrutura de água, esgoto e eletricidade na Faixa de Gaza apresenta um risco material aos lençóis freáticos, à água do mar, às praias e plantas de dessalinização de Israel”.

Seria esperado, no entanto, que qualquer relatório sobre a situação ambiental em Gaza se concentrasse no fato de quase dois milhões de palestinos residentes no território litorâneo viverem sob condições desumanas devido ao impiedoso bloqueio israelense, que já dura doze anos, e às repetidas ofensivas militares que devastaram à área e a tornaram “inabitável até 2020”.

Ao contrário, o relatório sugere que os habitantes de Gaza são os únicos responsáveis pela iminente catástrofe ambiental do território palestino, a qual ameaça a segurança e o bem-estar dos cidadãos israelenses. O jornal israelense Haaretz, que também publicou um estudo detalhado sobre a questão, igualmente trata o assunto como uma questão de segurança nacional.

Mas aquilo que Israel agora considera “problema de segurança nacional” é, na realidade, um desastre criado pelas suas próprias mãos. A ocupação, colonização, espoliação e contínua agressão contra a Palestina e os palestinos resultou até agora em danos ambientais sem precedentes na medida que até mesmo o ocupante israelense sofre as consequências.

A situação ambiental em Gaza é de fato desesperadora, mas não foram os palestinos que a fizeram dessa forma. Tampouco o “rápido crescimento populacional”, sequer a “negligência” ou “ignorância” dos residentes locais são responsáveis pelo problema. Inúmeros relatórios das Nações Unidas e outras organizações documentaram em detalhes, ao longo dos anos, como e por qual razão o principal culpado é Israel, seus ataques violentos sobre Gaza e seu bloqueio impiedoso.

Colonos israelenses despejam grandes quantidades de esgoto na aldeia beduína de Khan al Ahmar, na Cisjordânia [Twitter]

Tome por exemplo o problema do esgoto não-tratado despejado no oceano, que causa problemas ao turismo litorâneo e às plantas de dessalinização israelenses. A razão pela qual o esgoto de Gaza é despejado de forma tão “irresponsável” é a inoperabilidade das estações de tratamento de água, todas elas destruídas pela ofensiva israelense sobre Gaza em 2014 e jamais reconstruídas porque o cerco israelense não permite que materiais de construção ou peças sobressalentes entrem no território.

A falta de tratamento sanitário é apenas uma parte da crise de acesso à água na Faixa de Gaza. Como destaca o relatório, dessa vez corretamente, os residentes de Gaza utilizam excessivamente os aquíferos sob o território, o qual tornou-se cada vez mais contaminado por água do mar e elementos químicos, embora constitua a única fonte de água potável para os palestinos na região, devido à separação involuntária em relação à Cisjordânia.

Entretanto, o motivo dos palestinos de Gaza serem incapazes de estabelecer um sistema de gerenciamento de água apropriado é – novamente – obra de Israel. O estado sionista bombardeou e voltou a bombardear inúmeras vezes a infraestrutura de acesso à água na Faixa de Gaza, incluindo aquedutos, poços e outras instalações; o debilitante cerco israelense impede que as autoridades locais os consertem, além de impossibilitar qualquer projeto de construção de uma possível planta de dessalinização.

O problema da água em Gaza não é somente um incômodo para os israelenses mas uma provável fonte de epidemias para os palestinos. Até então, a ocorrência de doenças de difteria já dobrou entre a população, alcançando níveis epidêmicos, segundo o Ministério da Saúde da Palestina; além disso, casos de salmonela e febre tifóide também crescem em número.

Ademais, há o problema da queima de escombros por parte dos palestinos, portanto “poluindo o ar israelense”. Como destaca o pesquisador Ramy Salemdeeb, da Universidade de Cambridge, Gaza foi impossibilitada de desenvolver qualquer sistema apropriado de gestão de resíduos sólidos devido às restrições econômicas causadas pelo cerco israelense e à “limitada disponibilidade de terras”, problema cuja origem é seu isolamento do resto dos territórios palestinos ocupados.

Dado que Israel é um projeto de assentamento colonial, a superexploração da terra colonizada em detrimento do meio ambiente e da população local é naturalmente parte do seu modus operandi.

De fato, toda a terra tomada e ocupada por Israel sofreu graves degradações ambientais de uma forma ou de outra, com efeitos devastadores convenientemente desviados em direção às cidades, aldeias e territórios palestinos.

Caso Israel continue a tratar a questão como um “problema de segurança”, jamais será capaz de solucioná-la devido à sua lógica destrutiva inerente de empreendimento colonial, o qual busca somente explorar a terra e o povo sem qualquer consideração à preservação da natureza e da vida humana.

Em outras palavras, Israel jamais será seguro – seja no sentido ambiental ou em qualquer outro sentido – enquanto mantiver sua opressão aos palestinos, a ocupação de suas terras e a depredação do meio ambiente. A água, o ar e sobretudo o meio ambiente de Israel jamais serão imunes aos danos causados pela ocupação israelense sobre a Palestina.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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