Trump se meteu no beco sem saída de Israel sobre uma guerra com o Irã?

A América está preparando uma guerra com o Irã? Essa é uma questão que domina as conversas nas mesas de jantar e nas salas de reunião. Não só confinado ao Oriente Médio, onde os debates se concentram na preocupação sobre eventuais rupturas em um futuro instável na região, este também é um assunto de interesse majoritário para todo o mundo. Europa, Ásia Central, Extremo Oriente e África não estão imunes às repercussões de tal guerra, caso a administração de Trump – repleta de predadores neoconservadores – passe a bombardear e invadir o Irã.

A África do Sul, por exemplo, sofre as consequências dos saques históricos e da corrupção, que devastaram o tesouro nacional, criaram enormes desigualdades e um aumento monumental de desempregados, deteriorou nosso sistema de saúde pública, além de criar, deste modo, uma miríade de outros problemas sócio-econômicos. Mal poderemos pagar o aumento no preço dos combustíveis caso os Estados Unidos decidam apertar o gatilho contra o país do Golfo.

Ainda restam dúvidas: o presidente americano Donald Trump irá recuar da beira do abismo ou seus ideólogos raivosos, como o Conselheiro de Segurança Nacional John Bolton e o Secretário de Estado Mike Pompeo, irão empurrá-lo ao limite? Apesar das incertezas, a tensão vigente incitou uma combinação de medo e indignação. Ambos os sentimentos são esperados. Todos possuímos o direito pleno a temer as consequências devastadoras de quaisquer e todas as guerras; infelizmente, a evidência deste direito pode ser vista com clareza em inúmeros países devastados por conflitos. Além disso, todos deveríamos nos sentir indignados pelo fato dos Estados Unidos não possuírem qualquer base legal ou moral para destruir ainda outro país de maioria muçulmana.

Diferente do Afeganistão, Iraque, Líbia e Síria – países aparentemente bastante alinhados, de uma forma ou de outra, com os interesses regionais americanos –, o Irã é uma potência vigorosamente independente em seu próprio e legítimo direito de existir. Sobretudo, em contraste com Assad, Saddam e outros líderes na região, que permitiram a si mesmos dançar conforme à música de sucessivos presidentes americanos, a liderança revolucionária do Irã está firmemente comprometida com a resistência aos projetos hegemônicos de Washington.

Caso, portanto, os Estados Unidos sob o comando de Trump tenha decidido imitar as ambições coloniais de seu amigo Benjamin Netanyahu ao acompanhar o roteiro israelense coescrito por Bolton, o que então impede o avanço americano? Não pode ser a ONU, infelizmente um capacho irrelevante para o unilateralismo norte-americano. Tampouco o bloco árabe, exasperado pela demora e agitado pela possibilidade da guerra. Nem mesmo a imprensa, dado que a maioria das redes de comunicação tradicionais americanas investem na ideologia supremacista e apoiam um conflito de forma aparentemente incondicional.

O único obstáculo, de fato, é a opinião pública global, que se recusa a comprar as fake news e a falsa propaganda. Em tempos de redes sociais altamente politizadas que transcendem as fronteiras e restrições construídas pelo homem e demandam de maneira legítima que Washington apresente provas concretas para justificar um confronto, este fenômeno é poderoso e imponente.

Mesmo a opinião pública nos Estados Unidos reflete o alto grau de ceticismo em relação à “inteligência” vazada pelo círculo de conselheiros de Trump sobre as “ameaças” iranianas. Muitas dúvidas são levantadas sobre sua credibilidade e mesmo veracidade a fim de questionar a razão sobre a qual o presidente daria luz verde à investida contra o Irã. Embora estes vazamentos tenham fornecido cobertura às tentativas vãs de justificar as sucessivas tensões – incluindo o envio de um grupo de ataque naval americano à região –, a atual dificuldade enfrentada por Bolton e outros oficiais de alto escalão é justamente como neutralizar o crescente discurso público que alerta para a fraude governamental com base em informações falaciosas, comparáveis ao falso pretexto para invadir o Iraque, em 2003.

Para piorar, ainda há evidências verossímeis de que Israel é um agente central neste subterfúgio. Segundo James North, editor-colaborador do site de notícias Mondoweiss, o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu tenta há muito tempo provocar um ataque dos Estados Unidos contra o Irã. Além do mais, a inteligência israelense tem sido a fonte de algumas das alegações mais extremas sobre a suposta ameaça iraniana à paz no Oriente Médio. Em conformidade com o que é publicamente conhecido sobre Trump, James North argumenta em seus textos que o presidente americano admitiu que seu principal investidor, o magnata sionista dos cassinos Sheldon Adelson, o aconselhou a contratar Bolton.

North observa que nenhuma cobertura da grande imprensa americana sequer menciona o papel iminente de Israel ao instigar a gradativa hostilidade dos Estados Unidos em relação ao Irã. Infelizmente, as plataformas de mídia sul-africanas também são ineficientes ao relacionar Israel com as reiteradas provocações a um eventual ataque americano contra o Irã. Tampouco adotaram uma postura editorial apropriada contra estes movimentos de incitação.

Convenientemente, no dia 13 de junho, observamos um ataque contra dois navios-petroleiros no estreito de Harmuz, imediatamente atribuído ao Irã. Caso pretendessem utilizá-lo como o pretexto “onze de setembro” para a guerra, até então fracassou.

James North argumenta também que a revogação do acordo nuclear iraniano por parte de Trump, a ameaça de interromper todas as vendas de petróleo e as repetidas advertências e intimidações a países para que adotem suas sanções unilaterais, são todos atos de guerra. O jornalista recorda seus leitores de que as sanções contra o Iraque causaram 500 mil mortes de crianças, as quais, segundo a então Secretária de Estado americana Madelaine Albright, “valeram o preço pago.”

Indicativos do crescente desdém por outra guerra no Oriente Médio são as inúmeras reportagens que insistem que as alegações feitas pela Casa Branca sobre o Irã não constituem “inteligência” sob qualquer definição técnica do termo. “Ninguém mencionou sequer um único fragmento de evidência concreta que justifique essas supostas ameaças,” afirmou uma delas. “Todos os argumentos parecem distorções deliberadas e grosseiras da realidade factual.”

Embora o Irã esteja em aparente desvantagem, o tribunal da opinião pública permanece cético sobre qualquer justificativa de guerra. A questão agora é se Trump se meteu ou não em um beco sem saída de Israel quanto a uma possível guerra com o Irã; sobretudo, conseguirá se sair dessa?

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

Sair da versão mobile