Refugiada ao Rio: nadadora síria mergulha no estrelato

Quando a multidão se levantou para aplaudir a nadadora Yusra Mardini nas Olímpiadas de 2016, no Brasil, era difícil acreditar que a adolescente quase se afogou no mar somente um ano antes ao fugir da guerra na Síria.

Agora a história extraordinária da jovem atleta síria que subitamente conquistou o Rio de Janeiro será contada em um filme de Hollywood e uma biografia que ela espera poder inspirar outras pessoas e desafiar preconceitos sobre os refugiados.

“Era o maior evento esportivo do mundo. Foi uma loucura, foi incrível,” afirmou Mardini, agora com 20 anos de idade, à Fundação Thomson Reuters, em Berlim, seu novo lar.

“Quando eu estava nos blocos de partida, só enxergava as luzes e ouvia a voz das pessoas. Todas elas torciam. Eu não conseguia mais sentir minhas pernas,” ela relatou, em seu clube de natação na capital alemã.

Diante da oferta inicial para participar da primeira equipe de refugiados a competir nas Olimpíadas, Mardini quase disse não, com receio de uma eventual resposta complacente.

A experiência de competir sob a bandeira olímpica ao lado de nove companheiros refugiados transformou essa percepção, dando a Mardini uma nova noção de orgulho sobre seu status.

“Refugiada – você se sente constrangido quando ouve essa palavra,” disse Mardini.

“Então quando fui (ao Rio), tive uma visão completamente diferente. Agora tenho orgulho de ser uma refugiada.”

Desde então, Mardini, a pessoa mais jovem a ser indicada como embaixadora da boa vontade para a agência de refugiados das Nações Unidas, participou e discursou em diversas reuniões de cúpula globais e visitou campos de refugiados na Itália.

Mardini, que aos 18 anos de idade nadou os cem metros livre e os cem metros borboleta, agora projeta seus sonhos aos Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2020.

Na Alemanha, onde vive com seus pais e sua irmã, Mardini treina 30 horas por semana na piscina e na academia.

É uma vida bastante distante de sua vida na Síria, onde mesmo durante os treinos não poderia escapar das aflições da guerra.

“Algumas vezes, estava nadando e uma bomba caía na piscina, então tínhamos de fugir e nos esconder. Não aconteceu somente uma vez, foi três ou quatro vezes. Foi horrível,” ela contou.

Mardini era uma nadadora ávida desde muito jovem, mas seu sonho de tornar-se uma atleta profissional encontrou um obstáculo implacável quando eclodiu a guerra na Síria, em 2011.

Ela deixou para trás sua casa, na cidade devastada pela guerra de Damasco, em 2015, e viajou para a Turquia junto de Sara, sua irmã mais velha.

Uma noite, elas embarcaram em um bote em direção ao litoral turco, junto de outras 20 pessoas – três vezes mais do que a lotação projetada. À caminho da Grécia, o bote lotado começou a naufragar.

Caricatura do presidente sírio lançando ataques aéreos no país – cartum.

Sem qualquer outra alternativa, Mardini e sua irmã, também uma forte nadadora, ao lado de dois outros refugiados, pularam no mar e empurraram a pequena embarcação por mais de três horas para as ilhas gregas de Lesbos.

“Eu tentava me manter positiva e orar junto a todo mundo. Era algo realmente difícil,” Mardini afirmou.

“Eu e minha irmã pensamos a mesma coisa: somos duas nadadoras e seria uma vergonha se morrêssemos ali.”

Após alcançar a Grécia, Mardini e sua irmã teceram sua jornada através da Europa central até chegar a Berlim, em 2015, quando se juntaram às estimativas de um milhão de refugiados conduzidos à Europa naquele ano, a fim de escapar dos conflitos e das tormentas políticas de seus países.

Memórias daquela jornada sempre estarão junto dela, afirma Mardini.

“É como carregar um enorme saco de pedras sobre suas costas. Mas também, você não pode se livrar delas, porque agora elas fazem quem você é.”

Mardini tem esperanças de que sua biografia, “Butterfly” (“Borboleta”), a ser lançada em maio e intitulada a partir de seu maior feito, poderá inspirar outras pessoas.

“Muita gente pensa que os refugiados são pobres, ou que desejam realizar essa viagem (à Europa). Mas essas pessoas foram expulsas de seus países porque havia muita violência,” ela diz.

“Eu quero mudar a percepção das pessoas sobre o que é um refugiado. Vou continuar a apoiar e lutar pelos refugiados.”

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