O Irã é, sem dúvida, um ator-chave na política do Oriente Médio, mas continua sendo pouco compreendido por observadores externos e a imagem do país é espelhada em estereótipos. O pensador político, intelectual e ex-diplomata americano Vali Nasr pretende expor claramente como os líderes iranianos veem seu lugar no mundo e a história que molda a cultura estratégica de Teerã. Seu novo livro, “A Grande Estratégia do Irã: Uma História Política”, chega em um momento em que o Irã se encontra em uma encruzilhada. O acordo nuclear com os EUA, a perda da Síria, a degradação de aliados e a redução do apoio público levaram muitos a concluir que Teerã está do lado perdedor da história e seu compromisso fanático com a ideologia apenas agrava esse problema. No entanto, os líderes iranianos veem as coisas de forma muito diferente, explorando como a República Islâmica se enxerga e o contexto que a molda, é o que Nasr explora em seu livro mais recente.
O exemplo do abismo de interpretação entre os líderes iranianos e observadores externos foi o movimento de protesto antirregime de 2022, desencadeado pela morte de Mahsa Amini pelas forças de segurança iranianas. Embora os protestos tenham sido vistos como sinais do fracasso do regime, bem como de sua crescente impopularidade, o Líder Supremo do Irã, Ali Khamenei, via as coisas de forma diferente, como Nasr aponta. Khamenei via os protestos como resultado do sucesso da política externa do Irã, e não dos fracassos da República Islâmica. “Os protestos foram uma conspiração tramada pelos inimigos do Irã exatamente porque o Irã estava vencendo, aproximando-se de seus objetivos.”
De fato, ver os protestos como uma conspiração estrangeira e prejudicial à segurança nacional está ligado a um fundamento fundamental para a República Islâmica sob Khamenei. Quando a revolução de 1978-1979 se instalou no Irã, uma controvérsia fundamental era a noção da universalidade da revolução islâmica, que – assim como o comunismo revolucionário – deveria ser exportada para todo o mundo. Como Nasr demonstra ao longo do livro, uma ideia diferente está na base da República Islâmica: a independência do Irã. A justificativa para qualquer ação importante, interna ou externa, baseia-se ou pode ser desfeita por qualquer coisa percebida como prejudicial à soberania do Irã. Como Khamenei afirmou na época dos protestos e repetiu inúmeras vezes desde então, reprimir os protestos e usar medidas duras contra eles visa proteger a pátria, e não a integridade da lei ou teologia islâmica.
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A história do Irã contribui para o desenvolvimento dessa linha de pensamento. Por um lado, intelectuais iranianos têm discutido a solidão do Irã, principalmente o historiador Mohammad Ali Eslami Nodoushan, que argumentou que a religião, a cultura e a civilização distintas de Teerã significam que o Irã está sozinho no mundo.
O outro lado dessa solidão é que, embora isso signifique que os iranianos pareçam únicos, ambiciosos e grandiosos, ela frequentemente está associada à ansiedade. “Essa solidão lançou uma sombra contínua sobre o Irã, explicando tanto sua percepção de vulnerabilidade em sua região quanto sua determinação em tornar sua grandeza conhecida pelo mundo”, explica Nasr. Embora muitos eventos tenham contribuído para essa visão, desde o golpe apoiado pelos EUA contra o primeiro-ministro democraticamente eleito do Irã, Mohammad Mosaddegh, em 1953, as reformas do Xá e a revolução de 1979, a maior influência na forma como os estrategistas iranianos veem o mundo foi a guerra de oito anos com o vizinho Iraque, na década de 1980.
“Em suma, o conflito entre Irã e Iraque foi uma guerra que formaria o Estado.” Em outras palavras, Nasr argumenta que a guerra teve um impacto maior na criação da República Islâmica e na forma como a República Islâmica vê o mundo, mais do que a revolução de 1979.
A Grande Estratégia do Irã conta uma história convincente sobre o que impulsiona e motiva a formulação de políticas do Irã e – em um momento em que o poder muda de mãos rapidamente no Oriente Médio – tentar entender o pensamento de um ator regional fundamental é certamente importante. Como argumenta Nasr: “O Irã hoje é o Estado que a segurança nacional construiu.” Mas o grande desafio para o país é se esse compromisso dogmático com esses princípios — enxergar tudo sob a ótica da segurança nacional — continuará a sufocar ou a afastar importantes objetivos econômicos e sua capacidade de se adaptar ao novo ambiente. O livro não oferece respostas para esse problema, mas, ao rastrear a história do funcionamento da segurança nacional no Irã, podemos, individualmente, ter uma melhor compreensão de como as coisas podem se desenrolar no Irã.
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