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A declaração do BRICS pode ser um avanço para a Palestina — mas é preciso agir

10 de julho de 2025, às 07h00

Chefes de Estado dos países do BRICS participam de reunião no Museu de Arte Moderna (MAM) durante a Cúpula do BRICS no Rio de Janeiro, Brasil, em 6 de julho de 2025. [Fabio Teixeira/ Agência Anadolu]

A Declaração do BRICS no Rio de Janeiro, emitida em 7 de julho de 2025, oferece uma das posições mais claras e diretas até o momento por um grande bloco internacional sobre o ataque de Israel a Gaza e a crise palestina em geral. Enquanto as potências ocidentais permanecem evasivas e a ASEAN se mantém cautelosamente neutra, o BRICS rompeu barreiras ao nomear a realidade pelo que ela é: uma guerra de agressão, não uma guerra de defesa.

A declaração está repleta de palavras certas — palavras raras em fóruns internacionais. Ela menciona o uso da fome como método de guerra, condena a obstrução da ajuda humanitária e expressa “grave preocupação” com os ataques contínuos de Israel a Gaza. Não se trata de movimentos retóricos menores. Na linguagem fortemente higienizada da diplomacia internacional, tal formulação sinaliza uma crescente disposição para confrontar o que as potências ocidentais ainda se recusam a nomear: que as ações de Israel em Gaza e em todo o Território Palestino Ocupado constituem crimes de guerra — e, como a CIJ indicou, podem constituir genocídio.

Crucialmente, os países do BRICS também fazem referência às medidas provisórias da CIJ no caso de genocídio da África do Sul contra Israel. Isso é importante. Ao invocar a decisão da Corte, o BRICS afirma que a conduta de Israel não é meramente uma disputa política, mas uma crise jurídica e moral sob o direito internacional. Ressalta que o Estado israelense não pode continuar suas ações sem consequências legais — pelo menos fora do escudo protetor do Ocidente.

Outro detalhe importante é a reafirmação do apoio do BRICS à UNRWA. Em um momento em que os EUA cortaram o financiamento da agência sob frágeis pretextos políticos, a postura do BRICS ajuda a fortalecer a instituição mais responsável pela sobrevivência de milhões de refugiados palestinos. É um gesto simbólico, mas também prático, que reforça o direito de retorno — um direito consagrado no direito internacional, mas apagado na lógica do processo de paz de dois Estados.

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E, no entanto, apesar dessas importantes medidas, o BRICS não atinge o que é necessário. Como tantas declarações internacionais anteriores, a declaração ainda se apega à estrutura ultrapassada da solução de dois Estados, clamando por um Estado palestino soberano “dentro das fronteiras de 1967”, com Jerusalém Oriental como sua capital.

Isso não é apenas irrealista — está desconectado do presente. Israel controla todo o território, do Rio Jordão ao Mar Mediterrâneo. O projeto de assentamento na Cisjordânia é irreversível. O cerco a Gaza não é temporário — é estrutural. Até mesmo cidadãos palestinos de Israel vivem sob dezenas de leis que codificam o status de segunda classe. A ideia de que um Estado palestino viável poderia emergir dessa realidade foi superada por fatos concretos. Já existe um Estado — só que, por acaso, é um Estado de apartheid.

Qualquer esforço sério para apoiar a libertação palestina deve começar com este reconhecimento: a partilha fracassou e o futuro deve ser construído com base no princípio da igualdade de direitos para todos. Um Estado único — onde palestinos e judeus vivam como iguais politicamente sob uma única lei — não é uma fantasia utópica. É o único resultado compatível com a justiça.

O BRICS, um bloco que fala frequentemente de solidariedade anticolonial e governança inclusiva, deve ser o primeiro a endossar essa visão. Em vez disso, ao reafirmar o paradigma de dois Estados, corre o risco de consolidar uma ilusão diplomática que há muito tempo é usada para adiar mudanças significativas.

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É claro que ir além das palavras também significa aplicar pressão real. O BRICS tem influência — mas ainda não a utilizou. Se o bloco leva a sério a paz e a justiça, deve combinar suas declarações com ações: medidas econômicas contra empresas e instituições cúmplices do apartheid israelense; restrições à venda de armas e à cooperação militar; reconhecimento diplomático coordenado das reivindicações legais palestinas em tribunais internacionais. A declaração denuncia o deslocamento forçado e a engenharia demográfica em Gaza — mas o que o BRICS fará se tais ações continuarem?

O bloco também enfatiza “a importância de unificar a Cisjordânia e Gaza sob a Autoridade Palestina”. Embora a unidade seja crucial, os BRICS devem ser cautelosos ao reforçar uma instituição não eleita, enfraquecida e amplamente vista pelos palestinos como cúmplice na manutenção do status quo. Reformar a AP não é suficiente. Qualquer solução política deve vir da legitimidade entre os próprios palestinos, não da preferência internacional por interlocutores discretos.

A Indonésia, como defensora de longa data e vocal dos direitos palestinos e membro-chave do BRICS, tem um papel vital a desempenhar na definição dos próximos passos do bloco. Dentro da ASEAN, a Indonésia tem sido uma das vozes mais consistentes e éticas na questão palestina. O BRICS agora oferece uma plataforma mais ampla e alinhada — enraizada nas prioridades do Sul Global — onde a Indonésia pode ajudar a conduzir o debate para além de declarações simbólicas e em direção a uma visão de justiça pós-colonial baseada em direitos, fundamentada na igualdade e no direito internacional.

Os palestinos não estão pedindo esmolas ou caridade. Eles estão exigindo liberdade, dignidade e igualdade. A declaração do BRICS aponta nessa direção, mas não chega a nomear a estrutura política que deve ser desmantelada: o regime de apartheid que os governa.

Portanto, sim, as palavras do BRICS são bem-vindas — mais bem-vindas do que a maioria. Mas este momento não exige mais declarações. Exige ação. A verdadeira solidariedade exige o enfrentamento não apenas dos sintomas da ocupação, mas também de sua raiz: o sistema que nega aos palestinos o direito de viver como iguais na terra que chamam de lar.

Os palestinos já ouviram discursos suficientes. Agora precisam do poder ao seu lado.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.