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Jargão generalizado aumenta a impunidade do genocídio de Israel em Gaza

19 de dezembro de 2025, às 10h08

Palestinos, deslocados por ataques israelenses, lutam para sobreviver em tendas improvisadas na Cidade de Gaza, Gaza, em 15 de dezembro de 2025. [Khames Alrefi – Agência Anadolu]

Em um comunicado divulgado na quarta-feira desta semana, a Anistia Internacional abordou as consequências do genocídio israelense em Gaza e da Tempestade Byron, que expôs ainda mais a destruição do enclave, com o desabamento de moradias já bombardeadas, inundações em tendas e a morte de mais palestinos.

Guevara Rosas observou que tanto o genocídio em curso de Israel quanto a recusa em permitir a entrada de ajuda humanitária em Gaza agravaram as consequências das inundações.

“A devastação e as mortes causadas pela tempestade em Gaza representam mais um alerta para a comunidade internacional, pago com as vidas de pessoas que conseguiram sobreviver a dois anos do genocídio israelense”, afirmou Erika Guevara Rosas, diretora sênior de pesquisa, defesa, políticas e campanhas da Anistia Internacional.

Mas será que é mesmo um alerta? Há um certo egoísmo em permitir que os palestinos em Gaza sofram apenas para que o mundo acorde e nunca desperte de seu sono perpétuo autoimposto. A Anistia Internacional está certa em apontar o contexto, mas a organização também demorou a denunciar formalmente o genocídio israelense em Gaza em dezembro de 2024. Embora investigações e pesquisas devam de fato acontecer, as organizações de direitos humanos estão espelhando demais o engajamento diplomático ao não denunciarem o óbvio antes, para só emitirem uma declaração mais de um ano depois. Isso levanta a questão: onde está centrada a narrativa de Gaza? Nos palestinos ou nas organizações e instituições que se manifestam tarde demais para os palestinos? O atual desastre humanitário em Gaza poderia ter sido evitado. Mas, por outro lado, até mesmo o genocídio de Israel em Gaza poderia ter sido evitado. A comunidade internacional trabalhou para permitir o genocídio em vez de impedi-lo. Agora, enquanto palestinos morrem em decorrência do genocídio e das inundações, o foco na reconstrução de Gaza de acordo com o plano de Trump – colonização e apropriação de terras – tem precedência sobre o mínimo de assistência humanitária. Este também não é um incidente isolado. Padrões semelhantes ocorrem todos os invernos em Gaza, e todos eram evitáveis. Então, quando mais um alerta se tornará o alerta que motivará ações políticas e humanitárias? Desastres humanitários anteriores não poderiam ter servido de alerta para a comunidade internacional agir e prevenir o genocídio?

Podemos voltar à ONU e perguntar por que ela nunca levou a sério a previsão de que “Gaza se tornaria inabitável até 2020”, supostamente porque os palestinos em Gaza ainda viviam em condições insuportáveis? Não seria a maior hipocrisia omitir repentinamente o termo “inabitável” da retórica sobre Gaza num momento em que Israel destruiu completamente sua infraestrutura? Ou será que Gaza passou a ser associada à “reconstrução” e, portanto, inabitável significa ressurgir das ruínas para a organização internacional que favorece o colonialismo e se disfarça de protetora dos direitos humanos?

Um alerta pressupõe uma novidade que suscitaria alguma forma de introspecção e ação. O nível de destruição em Gaza como resultado do genocídio israelense em curso pode ser inédito, mas não é sem precedentes, portanto não existe o conceito de “outro alerta” da forma como normalmente é percebido e compreendido. Não podemos esquecer que a ONU permitiu que Israel cometesse genocídio em Gaza. Uma decisão consciente de permitir o genocídio não é desfeita por um alerta. E, enquanto palestinos são mortos em Gaza, falar em alertas apenas atesta o crescente sentimento de alienação, cultivado em diferentes graus de conforto. Se as organizações de direitos humanos pretendem fazer a diferença, o jargão generalizado deve ser evitado.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.