A colheita de azeitonas na Palestina é um dos rituais nacionais e sociais mais antigos e significativos, que liga profundamente os palestinos à sua terra. No entanto, em 2025, transformou-se em uma época de medo e conflito, em vez de alegria e celebração. Os ataques israelenses escalaram para níveis sem precedentes, refletindo uma política deliberada nos campos, com o objetivo de desarraigar os agricultores de suas terras e destruir símbolos de sua conexão histórica com a terra.
Escalada sem precedentes de ataques
Do início de outubro ao início de novembro de 2025, a Organização Al-Baider para a Defesa dos Direitos dos Beduínos e das Aldeias Alvo documentou aproximadamente 390 ataques contra palestinos na Cisjordânia, incluindo 224 ataques direcionados diretamente a agricultores durante a colheita de azeitonas. Os ataques concentraram-se nas províncias de Jerusalém, Salfit, Hebron, Nablus, Ramallah, Belém e Qalqilya.
Essas violações incluíram a proibição do acesso dos agricultores às suas terras, com a organização documentando 26 casos de negação de acesso por meio do fechamento de estradas agrícolas e da construção de barreiras de terra. Além disso, foram relatados 82 casos de disparos com munição real e agressões físicas, resultando em ferimentos entre agricultores e ativistas de solidariedade. Esses ataques foram acompanhados por ameaças verbais sistemáticas por parte dos colonos, com o objetivo de intimidar os moradores e forçá-los a abandonar suas terras.
Nas áreas ao redor dos assentamentos perto de Nablus e Ramallah, colonos armados se reuniram para proferir ameaças diretas, seguidas por 17 despejos e 32 casos de roubo de plantações. Jornalistas e observadores internacionais de direitos humanos foram atacados repetidamente, principalmente a agressão à jornalista Ranin Sawafṭa na cidade de Beita, ao sul de Nablus. Incursões também ocorreram em vilarejos como Burin, Raba, Ein al-Duq, Sa’ir e Turmus’ayya, todos sob a vigilância do exército israelense, que apenas observou sem intervir.
A organização também documentou 36 casos de arrancamento de oliveiras, afetando mais de 1.710 árvores, particularmente na área de Marj Si’, entre os vilarejos de al-Mughayyir e Abu Falah, a leste de Ramallah, como parte de uma política clara de expansão dos assentamentos. Aldeias a leste de Ramallah, incluindo al-Mughayyir, Turmus’ayya e Kafr Malik, enfrentam ataques diários que variam de incêndios criminosos a roubos e agressões físicas, representando um exemplo gritante de “deslocamento gradual” sob proteção militar.
Impacto humanitário e econômico
Dados da Organização Al-Baider e do Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA) indicam que outubro de 2025 registrou a maior taxa de ataques de colonos desde o início da documentação em 2006, com uma média de oito ataques por dia. Essa escalada reflete uma estratégia deliberada para despovoar áreas agrícolas palestinas, particularmente ao redor de assentamentos, disseminando medo e violência contínuos.
O cultivo de oliveiras constitui a espinha dorsal da economia rural palestina, sustentando mais de 80.000 famílias como sua principal fonte de sustento. Portanto, a destruição de oliveiras e o roubo de colheitas não representam apenas uma perda agrícola, mas um ataque direto à economia nacional e à identidade cultural palestina.
A Organização Al-Baider estima perdas diretas superiores a US$ 4 milhões nesta temporada, incluindo produtos roubados, árvores arrancadas e custos de replantio. O impacto psicológico é igualmente grave, já que o acesso aos campos se tornou um desafio diário que coloca a vida em risco, com os agricultores enfrentando constantes ameaças de morte ou detenção. Consequentemente, esses ataques representam não apenas violações materiais, mas também agressões ao povo palestino e à sua conexão emocional e histórica com a sua terra.
Violações flagrantes do direito internacional
Essas violações constituem claros descumprimentos da Quarta Convenção de Genebra (1949), que proíbe a destruição de propriedade civil protegida, exceto quando absolutamente necessário para operações militares. Arrancar oliveiras e arrasar terras agrícolas sem uma justificativa legítima de segurança viola o Artigo 53. Além disso, o roubo de colheitas ou a negação de acesso constituem punição coletiva e saque, proibidos pelo Artigo 33 da mesma convenção.
De uma perspectiva internacional dos direitos humanos, essas práticas violam o Artigo 11 do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, que garante o direito à alimentação e a um padrão de vida adequado. As agressões físicas e os disparos também violam o Artigo 9 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, que assegura a segurança pessoal e a integridade física.
Legalmente, a destruição sistemática de propriedade em tal escala configura crime de guerra, nos termos do Artigo 8 do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. Israel tem dupla responsabilidade por esses atos, tanto diretamente, por meio de suas forças armadas, quanto indiretamente, por meio da cumplicidade com milícias de colonos.
Os ataques contra jornalistas e observadores de direitos humanos violam o Artigo 79 do Primeiro Protocolo Adicional às Convenções de Genebra (1977), que garante a proteção de jornalistas em zonas de conflito. Também contrariam o Artigo 19 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, que protege a liberdade de expressão. Atacar profissionais da mídia e observadores reflete um esforço sistemático para ocultar a verdade e impedir a documentação de violações.
Recomendações e ações necessárias
O estudo apresenta recomendações essenciais para lidar com essas violações crescentes:
- Proteção internacional imediata para agricultores e jornalistas por meio do destacamento de equipes permanentes de monitoramento em campo em pontos críticos como Nablus, Ramallah e Hebron, garantindo dissuasão e documentação em tempo real.
- Utilização legal das violações documentadas para levar os casos ao Tribunal Penal Internacional no âmbito do dossiê palestino, transformando as evidências em uma ferramenta eficaz para a responsabilização internacional.
- Pressão política internacional sobre Israel para que ponha fim à política de “zonas militares fechadas”, que impedem os palestinos de acessar suas terras e servem de pretexto para a expansão dos assentamentos.
- Indenização para agricultores e reabilitação das terras afetadas por meio de projetos agrícolas sustentáveis, reconhecendo o replantio de árvores como um ato de resistência econômica.
- Apoio às organizações da sociedade civil palestina, em particular a Al-Baider, para aprimorar as ferramentas de monitoramento e verificação e fortalecer os bancos de dados digitais.
- Cobertura ativa da mídia internacional sobre os ataques à medida que ocorrem, impedindo o apagamento dos fatos e expondo a narrativa israelense ao público global.
Conclusão
A colheita de azeitonas de 2025 revela a verdadeira natureza do projeto de assentamentos israelenses: não apenas a aquisição de terras, mas uma guerra contra a própria existência palestina. Os ataques às oliveiras atingem a memória, a identidade, a economia e a cultura. A continuidade dessas práticas sem responsabilização incentiva mais crimes de ocupação e abre caminho para uma lenta limpeza étnica que desloca as populações originárias das aldeias.
A Organização Al-Baider apela à comunidade internacional e aos órgãos de direitos humanos para que ajam imediata e decisivamente a fim de responsabilizar as autoridades israelenses, fornecer proteção internacional a civis e jornalistas e apoiar a resiliência dos agricultores palestinos, que representam a essência da resistência não violenta. A oliveira, símbolo de paz e vida, tornou-se na Palestina um símbolo de sobrevivência e dignidade, e sua resistência representa a continuidade da identidade palestina diante das tentativas de desenraizamento e apagamento.
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